Enquanto a União Europeia se debate com a crise do euro e faz cortes profundos no próprio orçamento, em outros continentes há que sem se pergunte: como assim, crise? Na inversão das relações globais de poder, a ascensão da África é um fenômeno que chama especial atenção. A revista The Economist intitulou a África, num artigo de capa publicado no mês passado, “o continente da esperança”. Há dez anos, ainda era “o continente sem esperança”.
Esta boa notícia se espalhou rapidamente, fazendo com que muitos sugerissem inclusive que agora poderíamos “tirar nossas mãos” da África. Parar com a ajuda humanitária, portanto, a “indulgência pós-colonial” (como define o colunista holandês Paul Scheffer). Nos círculos do governo, em Haia, há rumores de políticos lambendo os beiços com a possibilidade.
Mas este é um atalho perigoso. Em primeiro lugar, ainda há muitos, muitos pobres: na África subsaariana são cerca de 400 milhões de pessoas. E o Banco Mundial enfatiza que o limite da ‘pobreza comum’, de 2 dólares por dia, não é motivo para festa. Nos países subsaarianos, 70% da população está nesta faixa.
Pode-se dizer que os governos das economias em ascensão é que deveriam fazer algo para combater a pobreza. Em parte isso acontece, mas em países como Angola e Guiné Equatorial o recente ‘boom’ é mal dividido. E há também países onde praticamente não existe um Estado que realmente funcione – pense na Somália, no Congo, no Sudão do Sul.
Curativo
Economistas se perguntam qual a base para a redução dos índices de pobreza. A ajuda do Ocidente até agora teve um papel importante, afirma o professor da Universidade de Harvard Lant Pritchett. Embora ele ache que esta ajuda tenha se limitado muito a “fazer curativos”: criar redes sociais para assegurar pelo menos que as pessoas fiquem acima do limite de um dólar por dia.
As belas cifras do crescimento na África devem-se principalmente ao aumento do preço das matérias primas e à vantagem demográfica de uma população jovem – que de maneira indireta também é resultado do sucesso da ajuda ao desenvolvimento. O Ocidente investiu muito em educação e saúde na África. Em Estados frágeis ou novos, como o Congo ou o Sudão do Sul, a única infraestrutura social é a das organizações de ajuda humanitária.
Melhores argumentos
Nas últimas quatro décadas, a importância do fluxo da ajuda a países em desenvolvimento caiu de 70% para 13% do total das fontes de verbas. As remessas e investimentos ultrapassaram a verba da ajuda. Mas ainda é muito cedo para dizer que a ajuda não é mais necessária.
Não só a ajuda de emergência aos famintos na Somália ou às mães afetadas pela guerra em Serra Leoa, mas também o ‘aid for trade’, por exemplo, a ajuda na construção de infraestrutura para o comércio. Se os políticos holandeses, como os belgas, quiserem cortar o orçamento destinado para a ajuda ao desenvolvimento, terão que buscar argumentos melhores.
Por Paulo F., da Radio Nederland Wereldomroep