Apesar da crescente movimentação de representantes do empresariado e dos trabalhadores durante as negociações sobre a regulamentação da terceirização da mão de obra, a Câmara dos Deputados só deve concluir a votação da proposta que trata do tema em meados de 2012.
Os empresários demandam uma maior segurança jurídica para aumentar os investimentos e a competitividade de seus negócios, mas parte dos sindicalistas teme que a medida resulte numa precarização das condições de trabalho. Ambos os lados, porém, concordaram, ontem, durante o seminário “Terceirização, Evolução e Marco Legal”, promovido pelo Valor, que a terceirização é uma tendência irreversível.
“A terceirização, em que pese os seus inimigos ideológicos, é como o universo: está em permanente expansão. Continua essa expansão porque é vital para o processo econômico”, afirmou durante o evento advogado Almir Pazzianotto, ex-ministro do Trabalho e ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho.
Como todas as garantias dos trabalhadores estão previstas na legislação, argumentou o ex-ministro, a terceirização deveria ser vista como uma questão contratual entre duas empresas. Para ele, porém, o fato de o Código Civil não reconhecer a figura da “responsabilidade subsidiária” dá mais segurança aos trabalhadores. A responsabilidade das empresas contratantes é solidária, concluiu.
Solidariedade x subsidiariedade
Quando há responsabilidade subsidiária, o terceirizado só pode cobrar direitos trabalhistas da empresa contratante depois que forem esgotadas as possibilidades de cobrá-los da empresa contratada. Já a responsabilidade solidária determina que a tomadora e a prestadora do serviço se responsabilizem pelas obrigações trabalhistas e previdenciárias.
Esse é uma das polêmicas que envolvem o tema. O substitutivo de autoria do deputado Roberto Santiago (PSD-SP), vice-presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), estabelece que inicialmente a responsabilidade seja subsidiária. Mas, se a empresa contratante não se certificar que a sua contratada está assegurando os direitos dos trabalhadores terceirizados, passará a ter responsabilidade solidária.
O parlamentar reconheceu que o texto em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara não é o projeto dos “seus sonhos”. Ressaltou, entretanto, que trata-se da proposta viável. “Neste ano, na CCJ não anda mais. Faltam três semanas, então é improvável. Até o meio do ano que vem a gente consegue resolver isso dentro da Câmara”, afirmou Santiago.
Insegurança jurídica e precarização
O advogado Vantuil Abdala, ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), disse que o momento é de pressionar o Congresso Nacional: “A sociedade não aguenta mais a insegurança jurídica”. No entanto, o parecer de Santiago não é uma unanimidade nem mesmo entre os trabalhadores.
O deputado federal Vicentinho (PT-SP), ex-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), afirmou que o texto “legaliza a precarização” do trabalho. De acordo com o atual presidente da CUT, Artur Henrique da Silva, os trabalhadores terceirizados normalmente têm piores condições de trabalho, sofrem mais acidentes e têm uma remuneração menor. “O grande desafio é termos uma regulamentação que reverta a precarização.”
Já o deputado federal Sandro Mabel (PMDB-GO), autor do projeto, defendeu a terceirização como um meio de dar mais dinamismo à economia e às relações de trabalho. “Será vedada a intermediação [de contratação], que é onde se precariza a mão de obra”, disse o deputado.
Sem direitos iguais, defende empresário
Michel Sarkis, vice-presidente da Associação Brasileira de Telesserviços (ABT) e presidente da Contax, maior empresa de telesserviços do país, disse não concordar com a ideia de que as companhias prestadoras de serviços terceirizados devam oferecer a seus empregados as mesmas condições das contratantes.
O executivo citou o exemplo do setor em que atua, o qual atende empresas de diversos áreas. “São segmentos muito diferentes”, ponderou Sarkis. “Se fôssemos contemplar todos os benefícios, teríamos uma convenção coletiva absolutamente esdrúxula”, avalia.
O presidente do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira de Telesserviços (ABT), Topázio Silveira Neto, acrescentou: “Não podemos criar um marco regulatório que no dia seguinte se passe a dizer se a lei disse isso ou não e o Judiciário se encha novamente de questões”.
Os empresários dos segmentos de distribuição de energia elétrica e de telecomunicações disseram que as regulamentações de seus setores já preveem a terceirização. “A distribuidora é estimulada a buscar o tempo todo mais eficiência. O grau de especialização de mão de obra colabora para o grau de eficiência, e o regulador captura essa eficiência econômica em prol da modicidade tarifária”, afirmou o presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Nelson Fonseca Leite.
De acordo com o presidente-executivo da Federação Brasileira de Telecomunicações (Febratel), Eduardo Levy, a regulamentação da terceirização da mão de obra garantirá a segurança jurídica para a execução dos investimentos necessários à massificação da internet em banda larga no país. Ele estima que o país deva investir R$ 150 bilhões no segmento até 2020.
Na avaliação do economista José Pastore, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP), o ideal seria um modelo de regulação da terceirização que envolva dois pilares: proteções gerais fixadas por lei e proteções complementares, negociadas por setor e ramo de atividade.
Proibição
Por outro lado, a pesquisadora Marilane Oliveira Teixeira, do Centro de Estudos Sindicais e de Economia (Cesit) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), defendeu a proibição da terceirização em atividades permanentemente necessárias nas empresas, a responsabilidade solidária e a garantia de igualdade de condições aos empregados terceirizados.
Por outro lado, a pesquisadora Marilane Oliveira Teixeira, do Centro de Estudos Sindicais e de Economia (Cesit) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), defendeu a proibição da terceirização em atividades permanentemente necessárias nas empresas, a responsabilidade solidária e a garantia de igualdade de condições aos empregados terceirizados.
Segundo ela, o que garante o aumento da oferta de emprego não é necessariamente a forma de contratação, mas o dinamismo da economia. Já Claudia Viegas, diretora da LCA Consultores, apresentou estudo, segundo o qual a criação de empregos formais pela via da terceirização cresceu a um ritmo mais acelerado. Entre 2006 e 2009, disse, os empregos formais no Brasil cresceram 17,2%, ao passo que os empregos formais terceirizados registraram alta de 18,8%.
A diretora da LCA disse também que, além de maior eficiência, a terceirização pode ajudar a impulsionar a inovação tecnológica. Isso porque o prestador de serviços especializados tende a procurar se atualizar mais depressa e ainda pode dividir os resultados com seus clientes.