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JUSTIÇA SOCIAL

Ajudante que carregava caminhão de verduras tem relação de trabalho reconhecida

Ajudante que carregava caminhão de verduras tem relação de trabalho reconhecida

SERVIÇOS PESSOAIS

A Justiça do Trabalho reconheceu a relação de emprego entre dois produtores da zona rural de Cordisburgo (MG) e um motorista que transportava a produção de verdura da propriedade.

A decisão é dos integrantes da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), que, em sessão ordinária feita no dia 2 de julho de 2024, mantiveram a sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara do Trabalho de Sete Lagoas.

O homem carregava o caminhão três vezes por semana e recebia semanalmente

Na sentença, foi declarada a existência do vínculo de emprego no período de 1º de dezembro de 2018 a 12 de setembro de 2022, na função de ajudante de motorista, condenando a empresa ao cumprimento das obrigações de fazer e de pagar as parcelas que estavam faltando.

A companhia recorreu da decisão, alegando que não foram preenchidos os pressupostos necessários para a caracterização da relação de emprego, e afirmou que o trabalhador tinha plena autonomia.

“Ele prestou serviços tão somente quando conseguia ir, em razão dos efeitos do álcool, sem qualquer regularidade e continuidade”, disse a empresa no processo.

Já o trabalhador disse que foi contratado para exercer a atividade de ajudante de motorista, que compreendia apanhar a produção de tomate, quiabo, abóbora moranga híbrida, milho, entre outras verduras e vegetais.

Segundo ele, os produtos eram retirados da zona rural de Cordisburgo, na região da Lagoa Bonita, Palmito, Barra Luiz Pereira, Barra das Canoas e Bagagem, e eram levados até a zona urbana daquela cidade, em direção à Ceasa.

“Eu colhia toda a produção de verduras da região, inclusive a plantação da própria família deles e deixava o caminhão carregado com as verduras na porta da casa de um dos proprietários, que saía de madrugada para descarregar o caminhão no Ceasa”, disse.

Testemunhas confirmaram a versão do trabalhador. Uma delas disse que é serralheiro e conhece o reclamante de Cordisburgo, sendo seu vizinho.

“Via ele apanhando o produto no caminhão amarelo. Ele ia buscar verduras para os reclamados às terças, quintas-feiras e domingos. O caminhão passava por volta das 7h da manhã e voltava por volta das 16h; quando saía mais tarde, voltava por volta das 22h”, disse.

Para o desembargador Fernando Rios Neto, relator do caso, ficou demonstrado que o autor da ação trabalhou exclusivamente em prol dos produtores rurais, como ajudante de motorista, por três dias da semana, habitualmente.

“A prova dos autos indica que o reclamante prestava serviços com pessoalidade aos reclamados às terças, às quintas-feiras e aos domingos, o que configura a habitualidade, estando a subordinação atrelada à execução do trabalho, inserido na dinâmica organizacional”, afirma.

Segundo o julgador, o recebimento dos valores de forma semanal também demonstra que o reclamante prestava os serviços habitualmente, sendo que, por vezes, recebia até os valores de forma adiantada.

“Certo ainda que a questão relacionada à dependência e ao uso do álcool pelo reclamante não retira a presença dos elementos caracterizadores da relação de emprego, demonstrados nos autos”, destacou o magistrado.

O desembargador enfatizou, por último, que não se verifica no caso a relação de chapa, formada por vários trabalhadores para a execução do serviço, de forma autônoma e eventual.

“Ao contrário, constata-se a relação de emprego, com habitualidade, subordinação, onerosidade e de forma pessoal”, concluiu o julgador. Com informações da assessoria de comunicação do TRT-3.

Clique para ler o acórdão:chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.conjur.com.br/wp-content/uploads/2024/10/Acordao-TRT-3-carregador.pdf
Processo 0010300-89.2023.5.03.0039

CONJUR

https://www.conjur.com.br/2024-out-23/ajudante-que-carregava-caminhao-de-verduras-tem-relacao-de-trabalho-reconhecida/

Ajudante que carregava caminhão de verduras tem relação de trabalho reconhecida

Empregar como CLT e PJ ao mesmo tempo é fraude à legislação trabalhista, decide TST

É SALÁRIO, SIM

A 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou examinar recurso de uma empresa de saúde de Curitiba contra decisão que julgou inválido o contrato de prestação de serviços como pessoa jurídica (PJ) firmado com uma médica pediatra que também era empregada do estabelecimento.

Médica não tinha autonomia sobre quando fazer plantões, característica do PJ

Com isso, os valores pagos por meio de notas fiscais serão integrados ao salário. Segundo o colegiado, ficou evidente a atuação da empregadora para fraudar a legislação trabalhista.

Plantões como PJ

A médica contou que foi admitida em 2003 com registro na carteira de trabalho, mas apenas uma parte do salário foi anotado. Mensalmente, a profissional recebia um valor fixo por fora.

A partir de 2013, os plantões passaram a ser pagos por nota fiscal emitida como PJ. Ao ser dispensada, em 2019, ela prestava serviços como celetista e pessoa jurídica ao mesmo tempo.

Em sua defesa, o hospital alegou que a prestação de serviços por PJ não se confunde com o contrato de trabalho celetista. Segundo seu argumento, a pediatra tinha autonomia em relação aos plantões, mas não no contrato de emprego, de 20 horas semanais.

Sem autonomia nos plantões

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) manteve a sentença que determinou a integração dos valores das notas fiscais ao salário da pediatra, por entender que havia subordinação e pessoalidade mesmo na “pejotização”.

Segundo uma testemunha, diretora do hospital na época, os plantonistas não definiam os horários: havia uma escala pré-definida, e a pediatra tinha dias fixos de trabalho. Ela também confirmou que sempre houve o pagamento de parte do salário “por fora” e, num determinado momento, a empresa determinou que fossem constituídas pessoas jurídicas para que esse valor fosse pago por nota fiscal.

A empregadora buscou, então, reverter a decisão no TST. O relator do agravo, ministro Sérgio Pinto Martins, assinalou que o Supremo Tribunal Federal decidiu que a pejotização, por si só, não implica fraude à legislação trabalhista, deixando assim margem para a análise caso a caso.

Diante dos fatos registrados pelo Tribunal Regional, o ministro ressaltou que a situação é diferente dos casos de pejotização analisados pelo Supremo. A seu ver, na prestação de serviços, tanto a relação regida pela CLT quanto a da pessoa jurídica, havia pessoalidade, onerosidade, habitualidade e subordinação jurídica — ou seja, as duas eram, na prática, regidas pelo modelo da CLT.

Ficou evidente, assim, a intenção de fraude à legislação trabalhista, visando mascarar o pagamento extrafolha e, com isso, evitar a integração da verba ao salário.

O processo tramita sob segredo de Justiça. A decisão foi unânime. Com informações da assessoria de comunicação do TST.

CONJUR

https://www.conjur.com.br/2024-out-23/empregar-como-clt-e-pj-ao-mesmo-tempo-e-fraude-a-legislacao-trabalhista-decide-tst/

Ajudante que carregava caminhão de verduras tem relação de trabalho reconhecida

Alojamento para trabalhadores: solução que exige atenção das empresas

Opinião

Em um país com dimensões continentais, não é incomum que o trabalho ocorra em locais afastados da residência habitual, especialmente na construção civil e agricultura.

Muitos empregadores, em razão de seu ramo de negócios e localização, não conseguem mão de obra necessária para suprir suas demandas, tendo que buscar trabalhadores em regiões distantes, ofertando moradia.

O alojamento para trabalhadores não trata apenas de um lugar para dormir, mas de uma estrutura que garante as condições mínimas de habitabilidade, respeitando a integridade física e mental do trabalhador. Além de proporcionar abrigo, essas moradias devem permitir que os profissionais descansem adequadamente, evitando deslocamentos longos e exaustivos.

No entanto, para que essa solução funcione de maneira eficaz e dentro da legalidade, é essencial que as empresas sigam a Norma Regulamentadora 24 (NR 24). Essa norma estabelece os requisitos mínimos que devem ser cumpridos, como a oferta de dormitórios, instalações sanitárias, refeitórios, áreas de convivência, e locais para lavar e secar roupas.

Os dormitórios devem estar sempre em boas condições de higiene e conservação. É fundamental que eles sejam divididos por gênero e que ofereçam banheiros suficientes para atender a todos, numa proporção de um banheiro para cada dez trabalhadores. Se os banheiros estiverem fora dos dormitórios, é importante que fiquem a uma distância máxima de 50 metros e que o caminho seja coberto, com piso que possa ser facilmente limpo.

Ainda, os dormitórios devem ser projetados visando a garantir espaço e segurança adequados para acomodar, no máximo, oito trabalhadores, de forma que cada um deles tenha uma cama, com colchões certificados, lençóis e outros itens limpos e apropriados para as condições climáticas. Os armários, além de serem espaçosos, devem ter chave para garantir a segurança dos pertences pessoais. Outro ponto importante é garantir que o alojamento seja bem ventilado e iluminado, já que isso afeta diretamente o conforto e a saúde dos trabalhadores.

Descanso, segurança e higiene

Para evitar ruídos e garantir o descanso, é recomendável que os trabalhadores que compartilham o mesmo dormitório tenham jornadas de trabalho semelhantes. Já o refeitório, seja ele dentro ou fora do alojamento, deve seguir rígidos padrões de higiene e segurança. Se o refeitório for externo, a empresa deve garantir transporte adequado para os trabalhadores. Vale ressaltar que cozinhar nos dormitórios é proibido. Quanto às roupas, o alojamento deve oferecer locais adequados para lavar e secar ou disponibilizar um serviço de lavanderia.

A manutenção do alojamento também é fundamental. O local deve contar com pisos impermeáveis e fáceis de limpar, e a coleta de lixo deve ser feita diariamente. A roupa de cama precisa ser lavada com frequência, e as instalações, como um todo, devem passar por manutenção regular para garantir as condições de higiene e funcionalidade.

Além das exigências estruturais, as empresas também possuem responsabilidade importantes e que devem ser rigorosamente cumpridas, tais como: assegurar a disponibilização de acomodações em conformidade com as exigências legais e normativas pertinentes; realizar manutenção periódica das instalações para garantir condições adequadas de higiene e funcionalidade; manter os trabalhadores informados acerca das condições do alojamento disponibilizado; evitar superlotação; incentivar práticas de promoção de saúde e convivência harmoniosa entre os trabalhadores; oferecer treinamentos de segurança e saúde ocupacional.

A fiscalização dos alojamentos é realizada por auditores fiscais do trabalho, que podem fazer inspeções a qualquer momento, com ou sem aviso prévio. O objetivo dessas visitas é verificar se as empresas estão cumprindo as exigências da NR 24. Mais do que apenas punir, o foco é conscientizar os empregadores sobre a importância de oferecer condições dignas de moradia para seus funcionários.

Caso a norma não seja cumprida, as empresas podem ser multadas, e o valor da multa varia de acordo com a reincidência e o tamanho da empresa.

Ações trabalhistas

Os próprios trabalhadores também podem mover ações trabalhistas, exigindo indenizações por danos materiais ou morais, especialmente quando há desrespeito aos direitos fundamentais, como a dignidade, a saúde e a segurança no trabalho.

Em situações mais graves, pode ocorrer a interdição de setores ou da própria empresa, se houver risco iminente à saúde dos trabalhadores. E, em casos extremos, o Ministério do Trabalho pode ordenar o embargo imediato do alojamento. Dependendo da gravidade, o empregador ainda pode enfrentar processos civis e criminais, com a obrigação de indenizar os trabalhadores ou seus familiares.

Oferecer alojamento, portanto, vai além de uma solução logística. É uma estratégia que pode ser decisiva em locais onde há escassez de mão de obra, possibilitando a atração de profissionais qualificados de outras regiões.

Contudo, é crucial que os empregadores compreendam a importância de cumprir rigorosamente a NR 24, tanto para preservar o bem-estar dos trabalhadores quanto para evitar problemas legais e financeiros.

Em resumo, o alojamento pode ser uma opção eficaz e vantajosa para as empresas, desde que seja oferecido com responsabilidade e dentro dos parâmetros estabelecidos pela legislação. Garantir moradia adequada não só favorece a atração de trabalhadores de qualidade, mas também assegura a continuidade das atividades da empresa sem interrupções.

Ajudante que carregava caminhão de verduras tem relação de trabalho reconhecida

Interpretação do STF no Tema 725 e ADPF 324 e inconstitucionalidade do art. 2 e 3 da CLT

Opinião

Há pelo menos dois anos vem sendo travada uma verdadeira guerra fria entre o Supremo Tribunal Federal e a Justiça do Trabalho em relação ao entendimento consolidado no Tema 725 e na ADPF 324, especialmente, no que se refere à contratação de pessoas jurídicas ou à existência de contrato de prestação de serviços entre pessoas jurídicas.

Uma breve leitura dos acórdãos que concluíram o julgamento do Tema 725 e da ADPF 324, inclusive na discussão travada entre os ministros, não se constata, de maneira alguma, análise do tema “contratação de pessoa jurídica e contratação entre pessoas jurídicas”, a conhecida “pejotização”. A questão central objeto da ação e recursos direcionados ao STF consistiu na possibilidade da terceirização da atividade-fim e da responsabilidade solidária/subsidiária do tomador de serviços (Súmula 331 do TST).

O equívoco da situação já se inicia quando se denomina contratação de pessoas jurídicas pelo termo “pejotização”, o qual, na verdade, em sua real acepção, consiste na contratação de profissionais por meio de pessoas jurídicas com o único subterfúgio: a fraude para mascarar relação de emprego.

São verdadeiros empregados que, na aparência, e no início da relação ostentam a figura de um PJ, de um empresário, mas que na realidade, ao contrário, são obrigados a exercer todas as funções de um empregado, nos moldes dos artigos 2º e 3º da CLT. E a diferença primordial que norteia um verdadeiro “profissional PJ” de um empregado é a forma como a subordinação jurídica se dá na relação e a autonomia.

Em segundo lugar, admitir o tratamento igualitário dessas situações jurídicas significa contrariar o que o legislador optou por definir: a criação da figura do empregado e empregador dos artigos 2º e 3º da CLT.

Oportuno salientar desde já que a Justiça do Trabalho, e a boa e abalizada doutrina jamais proibiu a contratação de profissionais por meio de pessoa jurídica. A questão da proibição e quanto a isso ousamos concordar consiste na existência de contratações que visam a burlar a legislação vigente. Não se pode negar que a contratação de profissionais por meio de pessoa jurídica possa parecer sob o ponto de vista do empregador mais viável, mais econômico. Essa modalidade de contratação, contudo, deve obedecer, em primeiro lugar, a autonomia que a permeia.

Mercado dita as regras de contratação

Na maioria dos casos, o mercado dita as regras de como se dará contratação, e o profissional não tem outra opção senão aderir à forma imposta, sob pena de ficar à mercê de trabalho. Essa situação é muitas vezes confundida com “opção” do trabalhador pelo regime de contratação via pessoa jurídica, o que não é o caso.

E ainda que fosse opção de ambas as partes a contratação por essa modalidade, grande parte dos profissionais assina documentos prontos por quem detém maior poder de barganha (contratos de adesão) e, acreditando que a relação de trabalho será permeada pela autonomia, no curso da relação verifica que a situação não é a que se apresentava no momento da contratação, pois o tratamento dado é como o de um empregado celetista, nos moldes dos artigos 2º e 3º da CLT, porém, sem receber o que lhe é de direito.

Essas são as situações de fraude, que não podem ser ignoradas pelo Judiciário, mormente em um país como o Brasil, onde os direitos trabalhistas foram obtidos com tanto sacrifício e, infelizmente, até hoje há notícias de trabalho escravo.

Contudo, na contramão dos direitos dos trabalhadores, o STF vem proferindo decisões contrárias ao que os artigos 2º e 3º da CLT dispõem, o que preocupa a todos os operadores do Direito do Trabalho, incluindo, o Ministério Público do Trabalho.

Embora louvável o entendimento assentado pela Suprema Corte acerca da licitude da “terceirização de atividade-fim e meio” e da denominada terceirização por “pejotização”, uma espécie de presunção lógica e absoluta sobre a legalidade de “qualquer divisão do trabalho entre pessoas jurídicas” tem sido disseminada no STF, o que, de certa forma, esvazia a competência da Justiça Laboral.

STF tem anulado decisões de vínculo trabalhista

O STF tem revisado e anulado decisões proferidas pela Justiça do Trabalho, em sede de reclamação constitucional, que reconhecem o vínculo de emprego entre trabalhadores e empresas, cuja relação inicial aparente seria de terceirização ou terceirização por “pejotização”.

Como se não bastasse, e essas decisões vêm sendo adotadas, mesmo havendo nos processos um vasto acervo probatório da subordinação jurídica e demais requisitos do vínculo de emprego, tais como (existência de controle de ponto, impossibilidade de substituição, existência de poder punitivo — advertência ou demissão etc.).

Acirra-se ainda mais esta crise institucional, pois vem se instrumentalizando a reclamação constitucional — não obstante se tratar de uma via estreita processual — para desconstituir estas decisões colegiadas da Justiça do Trabalho, sob a justificativa falha de violação à competência do STF.

Reitera-se. São decisões trabalhistas, proferidas pela primeira instância e confirmadas pelos tribunais regionais, que, ao contrário do aduzido nas decisões monocráticas proferidas pelo STF, não discutem a legalidade da “terceirização” ou “pejotização”, e sim, amparada em robusta matéria probatória, atestam a existência de fraude trabalhista.

A realização deste “distinguishing” em relação aos precedentes vinculantes fora, inclusive, aconselhada nos votos condutores dos julgamentos do Tema 725 e ADPF 324.

ADPF 324:
Nota-se, portanto, com base nas considerações acima, que o que precariza a relação de emprego não é a terceirização, mas seu exercício abusivo. (…) Afirmar a licitude da terceirização como estratégia negocial, tanto no que respeita à atividade-meio, quanto no que respeita à atividade-fim, não implica, contudo, afirmar que a terceirização pode ser praticada sem quaisquer limites. A prática tem demonstrado – e a situação está muito bem retratada nos arrazoados dos amici curiae que se opõem à procedência desta ação – que algumas empresas contratadas deixam efetivamente de cumprir obrigações trabalhistas e previdenciárias e que, quando acionadas, constata-se que tais empresas não dispõem de patrimônio para honrar as obrigações descumpridas. (…). Como já observado, a atuação desvirtuada de algumas terceirizadas não deve ensejar o banimento do instituto da terceirização. Entretanto, a tentativa de utilizá-lo abusivamente, como mecanismo de burla de direitos assegurados aos trabalhadores, tem de ser coibida. Essa é a condição e o limite para que se possa efetivar qualquer contratação terceirizada. Os ganhos de eficiência proporcionados pela terceirização não podem decorrer do descumprimento de direitos ou da violação à dignidade do trabalhador.”

Tema 725:
“Em segundo lugar, porque a denominada “intermediação de mão de obra” ilícita, como salientado pelo Ministério Público do Trabalho e no próprio parecer da Procuradoria-Geral da República, consiste em mecanismo fraudulento que visa burlar a efetividade dos direitos sociais e previdenciários dos trabalhadores; desvalorizar o primado do trabalho, por meio de abuso e exploração do trabalhador e ocultar os verdadeiros responsáveis pelas contratações, para impedir sua plena responsabilidade; o que, não raras vezes, acaba tipificando hipóteses de trabalho escravo.”

Competência da Justiça do Trabalho afastada

Tamanha a dimensão alcançada por esta problemática que a Universidade de São Paulo (USP), em parceria com a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), lançou um estudo no dia 2 de maio de 2024, o qual, por meio da análise de 1.039 decisões desta Suprema Corte, entre monocráticas e colegiadas, no período de 1º de julho de 2023 e 16 de fevereiro de 2024, destacou que, embora a jurisprudência do STF exija a existência de aderência estrita entre a decisão reclamada e o paradigma indicado, em muitas das reclamações analisadas o requisito foi flexibilizado para afastar a competência da Justiça do Trabalho.

Tratando-se de uma via processual estreita, destaca-se que não apenas a aderência estrita está sendo ignorada, como também a verificação da utilização deste instrumento como sucedâneo recursal e até mesmo o trânsito em julgado da lide na seara trabalhista, em clara afronta à Súmula nº 734/STF.

Contudo, o que mais chama a atenção é a naturalidade que os ministros, em notória afronta à Súmula nº 279/STF, vêm adentrando — e desprezando — a instrução probatória analisada pela Justiça do Trabalho e rechaçando, monocraticamente, a existência de relação empregatícia sem sequer requisitar informações à autoridade prolatora da decisão ou ouvir a parte beneficiária (empregado).

Ressalta-se que a requisição de informações e citação da parte beneficiária são obrigações processuais — e não faculdades — estabelecidas pelo artigo 989, II e III, CPC, as quais, no entanto, têm sido descumpridas pelo Supremo Tribunal Federal, sob a justificativa da celeridade processual.

Sobre este ponto, reproduz-se trecho de voto proferido pela ministra Carmen Lúcia, na RCL nº 71.162/SP, que defende o retorno dos autos para rejulgamento da reclamação trabalhista à luz dos precedentes vinculantes:

“Não se pode, a pretexto de obter-se celeridade processual, confundir o instituto jurídico reclamação constitucional com a reclamação trabalhista em tramitação na origem. A causa de pedir e o pedido deduzido nessas ações não se confundem. Na reclamação constitucional, busca-se resguardar a competência deste Supremo Tribunal ou restabelecer a autoridade de seus pronunciamentos dotados de efeito vinculante e eficácia erga omnes.

Ao se permitir o julgamento imediato da causa no Supremo Tribunal Federal, seriam indevidamente suprimidas as instâncias judiciais previstas no ordenamento jurídico vigente, transformando-se este Supremo Tribunal em instância única de jurisdição, o que não se pode admitir. Essa medida debilitaria o processo de construção do debate e o amadurecimento de teses jurídicas, além de frustrar o caráter corretivo e pedagógico que a cassação da decisão reclamada é capaz de promover nas instâncias ordinárias, a partir da determinação de que se julgue novamente a matéria, dessa vez tomando como parâmetro inafastável o paradigma cujo descumprimento se indicou.”

O próprio RISTF, em seus artigos 157, 159 e 160, também contempla esse diálogo contínuo, tanto com a autoridade prolatora, como com a própria Procuradoria-Geral da República, antes do proferimento da decisão.

Inclusive, esta última, em 22 de setembro de 2023, nos autos da RCL 60.620/SP, diante deste cenário que pouco contribui com o fortalecimento dos precedentes, requereu, nos termos do artigo 947, CPC/15, a instauração de Incidente de Assunção de Competência para que fosse afetada aquela reclamação ao Plenário do STF e fosse formado entendimento sobre o tema “limites das teses fixadas na ADPF 324/DF, no RE 958.252/MG (Tema 725 da Repercussão Geral), nas ADIs 5.625/DF e 3.961/DF e na ADC 48/DF para fins de cabimento da reclamação junto ao STF nas hipóteses da declaração de existência de fraude à caracterização do vínculo de emprego”.

Procuradoria à favor da Justiça do Trabalho

Para a Procuradoria-Geral, à época capitaneada por Augusto Aras, a análise sobre a existência do vínculo empregatício é tida como uma das mais importantes funções desempenhadas pela Justiça do Trabalho e um dos principais temas de litígio em matéria trabalhista, ressaltando uma infinidade de decisões contraditórias em casos idênticos, destacando o entendimento pela inviabilidade de reclamações como, por exemplo, na Rcl 55.806-AgR (relator ministro Nunes Marques), na Rcl 55.164-AgR (relator ministro Ricardo Lewandowski) e na Rcl 56.098-AgR (relator ministro Luiz Fux).

Ocorre que, como aquela reclamação teve seu seguimento negado pelo ministro Edson Fachin, o pedido perdeu seu objeto e nunca mais foi suscitada esta tentativa de uniformização do posicionamento.

É necessário se atentar que não se trata de uma decisão monocrática isolada; a pejotização, atualmente, é a realidade.

Logo, um instituto que poderia ser benéfico e adequado ao mercado de trabalho moderno, se utilizado da forma abusiva que está sendo feita, sem qualquer contrapeso, além de incompatível com o Estado democrático de direito, também será bastante prejudicial para as gerações futuras.

Neste sentido, importante citar o voto do ministro Flávio Dino na RCL nº 68.787/MG e RCL nº 66.155/ES:

“Realço que, no sistema constitucional pátrio, a relação de emprego é a regra, conforme deflui do artigo 7º da Constituição, e as demais formas de trabalho são válidas apenas quando efetivamente se diferenciam daquela.

(…)

A pejotização desenfreada é incompatível com a proteção e promoção do regime constitucional dos direitos sociais, inclusive quanto ao financiamento da seguridade social. Se não houver obediência das novas formas de trabalho a um regime de direito e deveres que preserve a seguridade social irá se constituir uma autêntica “bomba fiscal” para as atuais e futuras gerações. Como explicam os professores Nelson Marconi e Marco Capraro Bancher, da Fundação Getúlio Vargas:

“(…) ressaltamos que a perda de receita decorrente da pejotização causa impacto relevante nas contas públicas. É um importante aspecto a considerar quando são analisados os efeitos da flexibilização ampla pretendida para o mercado de trabalho na direção de possibilitar situações de violação à legislação trabalhista. Nesse cenário, a própria discussão sobre desoneração da folha de pagamento, cujo alcance a União vem tentando restringir, se torna inócua, pois tanto o conjunto de impostos, como a base de tributação que incidiria sobre o trabalho se reduziria consideravelmente. Destaque-se que a eliminação de direitos trabalhistas decorrentes da pejotização, como décimo terceiro, horas extras, adicionais de insalubridade ou periculosidade, também diminuirá a base de cálculo dos impostos. Adicionalmente, é importante ressaltar que o poder de fiscalização e controle por parte da Receita Federal também seria enfraquecido, pois é mais difícil fiscalizar muitas empresas com somente um funcionário que poucas empresas com muitos funcionários, cujo recolhimento se dá diretamente na fonte e de forma concentrada. Com este estudo, buscamos demonstrar que a eventual substituição do regime celetista, de forma fraudulenta, através da aqui intitulada ‘pejotização’, ao longo do tempo, provocará efeitos deletérios sobre a receita fiscal, prejudicando tanto o financiamento do regime previdenciário como a própria capacidade do Estado para realizar políticas públicas”.

Acrescento que ocorrerão também efeitos deletérios com a sobrecarga do SUS, por exemplo nos casos de acidente de trabalho, bem como do Sistema de Assistência Social – com a ampliação dos benefícios assistenciais da LOAS, nos casos de perda total de renda na idade avançada sem a cobertura previdenciária.”

Como já dito, não se trata de uma mera conformação do Supremo Tribunal Federal em relação à utilização desregrada da reclamação constitucional para esvaziar a competência da Justiça do Trabalho.

O buraco vem se mostrando muito mais embaixo, no entanto, tanto o Supremo Tribunal Federal, como a própria Justiça do Trabalho, como instituição, omitem-se em sua resolução e, com isso, por meio de uma interpretação distorcida do Tema 725 e ADPF 324, extirpa-se do ordenamento jurídico o artigo 2º e 3º da CLT e quem sofre é o trabalhador.

Ajudante que carregava caminhão de verduras tem relação de trabalho reconhecida

Argumento da hipersuficiência do trabalhador para admitir pejotização

Opinião

Temos assistido, reiteradamente, a manifestações de divergência e uma consequente resistência do Judiciário trabalhista à nova realidade imposta pelo Supremo Tribunal Federal no tocante às decisões que vêm ampliando a terceirização e sua licitude em toda atividade, meio ou fim.

Com critérios distantes da tradicional essência protecionista utilizada pela Justiça do Trabalho, o STF vem autorizando, progressivamente, a pejotização e as “outras formas de trabalho fora da CLT”, afastando o vínculo de emprego declarado pela Justiça do Trabalho.

Destaque-se que a hipersuficiência do trabalhador — pessoas com alto nível de formação e remuneração —, entendida pelo STF como liberdade de negociação, tem sido a base da validação das diversas modalidades alternativas de contrato de prestação de serviços.

A tese de que a hipersuficiência pode ser aplicada a todo tipo de trabalhador, contudo, ainda tem se mostrado controversa. Há que se reconhecer que falta clareza nos critérios utilizados pelo STF para conceituar o hipersuficiente. Ora o STF aponta os profissionais liberais como tais (advogados, médicos, engenheiros etc.), ora representantes comerciais e corretores, sem formação superior e com baixos salários.

Resta que, nesses casos, não estão sendo aplicados ou observados os artigos 2º, 3º e 9º da CLT pela Suprema Corte, os quais definem o empregador, o empregado e os atos nulos que visam fraudar ou impedir a aplicação dos preceitos da CLT. Aparentemente, o STF tem dado mais valia à forma e à autonomia da vontade do que à realidade dos fatos, mitigando e até afastando os princípios trabalhistas e as regras da CLT, as quais passaram a ser facultativas.

ADPF 324 e Tema 725

É bom lembrar que, em agosto de 2018, o STF julgou a ADPF nº 324 – que questionou a constitucionalidade e os limites da terceirização de atividades no Brasil – e o RE nº 958.252, no qual também se discutiu a constitucionalidade da proibição de terceirização de atividades-fim de uma empresa, fixando a seguinte tese:

“1) É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada. 2) Na terceirização, compete à contratante verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada e responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias” (ADPF nº 324). O entendimento se aplica às terceirizações ocorridas antes mesmo da Lei nº 13.429/2017.

Relator da ADPF nº 324, o ministro Barroso entendeu que “a terceirização não enseja, por si só, precarização do trabalho, violação da dignidade do trabalhador ou desrespeito a direitos previdenciários. É o exercício abusivo da sua contratação que pode produzir tais violações”, deixando claro que o STF admitiu que a realidade dos fatos pode demonstrar o exercício abusivo e a existência de fraude na contratação.

Igualmente importante é a tese vinculante no julgamento de Repercussão Geral, Tema nº 725, acerca da constitucionalidade da terceirização de mão de obra, proposta pelo relator ministro Luiz Fux, que, de maneira mais abrangente, firma a tese de que “é lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”.

Portanto, a Súmula nº 331 do TST, que proibia a terceirização de atividade-fim nas empresas – e até então adotada de forma pacificada pelos tribunais trabalhistas –, passou a ser considerada pelo STF como inconstitucional por violar os princípios da legalidade, da livre-iniciativa, da livre concorrência e dos valores sociais do trabalho.

Transporte rodoviário de cargas e parceria entre salões de beleza e profissionais do setor

Outro relevante precedente diz respeito ao julgamento conjunto da ADC nº 48 e da ADI nº 3.961, que versa sobre o transporte rodoviário de cargas, em que o STF reconheceu que a atividade de transportador autônomo de cargas configura relação comercial de natureza civil, sem vínculo de trabalho celetista. Na mesma direção, o julgamento da ADI nº 5.625 a respeito dos Contratos de Parceria com o Profissional de Salão de Beleza, reconheceu ser constitucional a celebração de contrato civil de parceria entre salões de beleza e profissionais do setor, negando haver relação de emprego dissimulada.

Trata-se de precedentes vinculantes inovadores a respeito da terceirização irrestrita ou ampla prestação de serviços a terceiros, entendendo também pela compatibilidade da pejotização com a Constituição Federal, e que serviram de base para uma série de reclamaçõesconstitucionais a respeito de profissionais de outras categorias.

Cite-se ainda o exemplo emblemático do caso da RCL nº 47.843, quando o STF anulou a decisão da Justiça do Trabalho para reconhecer a licitude na contratação de médicos pelo Instituto Fernando Filgueiras, na Bahia, por meio de pessoa jurídica, validando a adoção de formas alternativas de contratação de mão de obra, sem prevalência ou preferência do vínculo de emprego celetista, principalmente para os profissionais hipersuficientes. Em seu voto, o ministro Barroso ressaltou que “se estivéssemos diante de trabalhadores hipossuficientes, em que a contratação como pessoa jurídica fosse uma forma, por exemplo, de frustrar o recebimento de fundo de garantia por tempo de serviço ou alguma outra verba, (…) uma tutela protetiva do Estado poderia justificar-se. (…) Não só médicos, hoje em dia – que não são hipossuficientes –, fazem uma escolha esclarecida por esse modelo de contratação. Professores, artistas, locutores, são frequentemente contratados assim, e não são hipossuficientes. São opções permitidas pela legislação”.

Visão liberal

A atual posição do Supremo, em um movimento reformista, reflete o reconhecimento dessa nova dinâmica mundial e a necessidade de se viabilizar as demandas de maior eficiência da economia, por meio de uma interpretação mais ampla e flexível em relação ao polêmico tema da terceirização da mão de obra, pejotização, entre outras modalidades de contrato de prestação de serviços.

Reconhecendo mudanças no mecanismo das relações de trabalho e buscando alternativas de contratação, o STF caminha validando em uma série de decisões vinculantes o sentido de constitucionalidade à terceirização irrestrita e todas as outras formas de trabalho fora da CLT. Trazendo uma visão mais liberal e progressista ao instituto, o ministro Luís Roberto Barroso, em junho de 2023, considerou que:

“(…) o contrato de emprego não é a única forma de se estabelecerem relações de trabalho. Um mesmo mercado pode comportar alguns profissionais que sejam contratados pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho e outros profissionais cuja atuação tenha um caráter de eventualidade ou maior autonomia. Desse modo, são lícitos, ainda que para execução de atividade-fim da empresa, os contratos de terceirização de mão de obra, parceria, sociedade e de prestação de serviços por pessoa jurídica (pejotização), desde que o contrato seja real, isto é, de que não haja relação de emprego com a empresa tomadora do serviço, com subordinação, horário para cumprir e outras obrigações típicas do contrato trabalhista, hipótese em que se estaria fraudando a contratação.” (RCL nº 60.436)

Com base nessa visão, o STF se posicionou a respeito de uma série de matérias, flexibilizando e redefinindo conceitos, dando novos contornos a temas caros à área trabalhista, em decisões  orientadas, segundo o ministro Barroso, na garantia dos direitos fundamentais previstos na Constituição para as relações de trabalho, na  preservação do emprego e da empregabilidade, na formalização do trabalho (removendo os obstáculos que levam a informalidade), na melhoria da qualidade geral e na representatividade dos sindicatos, na valorização da negociação coletiva, na desoneração da folha de salários, para incentivar a empregabilidade e no fim da imprevisibilidade dos custos das relações de trabalho em uma cultura em que a regra seja propor reclamações trabalhistas ao final da relação de emprego.

Cabe observar, assim, das decisões do Supremo que, apesar de supostamente poderem estar presentes todos os requisitos materiais para reconhecimento do vínculo de emprego da CLT, o fato do trabalhador ser hipersuficiente e de se tratar de pessoa esclarecida, relativiza e até exclui as regras de direito do trabalho e prioriza a autonomia da vontade, pois parte da premissa de que o trabalhador pode escolher, de forma esclarecida, o tipo de contratação (animus contrahendi), como também aponta a igualdade entre as partes para negociar diretamente.

  • é sócia do escritório GM Advogados e Vólia Bomfim, membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, desembargadora do TRT da 1ª Região aposentada, professora e autora de obras jurídicas diversas, doutora em Direito e Economia pela Universidade Gama Filho (UGF), mestre em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá (UNESA), pós graduada em Direito do Trabalho pela UGF e pós graduada em Processo Civil e Processo do Trabalho pela UGF

     

    CONJUR

    https://www.conjur.com.br/2024-out-23/o-argumento-da-hipersuficiencia-para-admitir-a-pejotizacao/

Ajudante que carregava caminhão de verduras tem relação de trabalho reconhecida

Novo capítulo na questão sobre o terço constitucional de férias

Opinião

A questão acerca da incidência das contribuições previdenciárias sobre o terço de férias recebe novo capítulo diante do recurso interposto pela União em face da decisão que, acolhendo o pleito dos contribuintes, modulou os efeitos da decisão que havia revertido o então consolidado entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema.

Explica-se. Em 2014, analisando o tema sob o aspecto infraconstitucional, o STJ afastou a incidência das contribuições previdenciárias sobre o terço constitucional de férias.

Como a questão foi julgada sob o regime de recurso repetitivo, diversas empresas passaram a adotar o entendimento do STJ, deixando, assim, de calcular as contribuições previdenciárias sobre a referida rubrica, havendo casos, inclusive, de reversão de valores nos respectivos balanços.

Porém, em 2018, o Supremo Tribunal Federal reputou o tema como de natureza constitucional e, em agosto de 2020, concluiu pela legalidade da exigência das contribuições previdenciárias sobre o terço constitucional de férias, o que motivou a oposição de embargos de declaração por parte dos contribuintes visando a modulação dos efeitos da decisão diante da abrupta mudança jurisprudencial.

Em julho de 2024, após aproximadamente quatro anos da decisão que reverteu o então entendimento consolidado do STJ, o STF finalmente concluiu o julgamento dos embargos de declaração para a modular os efeitos da decisão, atribuindo efeitos “ex nunc” ao acórdão de mérito, ou seja, a impossibilidade de retroação dos efeitos, a contar da publicação de sua ata de julgamento.

Ordens de restituição e  recurso da Fazenda Nacional

Antes mesmo da publicação do acórdão, ocorrida em 20 de setembro, os tribunais regionais passaram a aplicar o entendimento do STF manifestado quando da modulação dos efeitos, para assim reconhecer a não incidência das contribuições previdenciárias e, consequentemente, o direito à restituição dos valores pagos até a data do julgamento ocorrido em agosto de 2000.

Ocorre que a Fazenda Nacional opôs novos embargos de declaração visando a rediscussão dos critérios da modulação. De acordo com o referido recurso, não seria a hipótese de modulação dos efeitos, na medida em que não havia jurisprudência consolidada — o que, evidentemente, é um manifesto equívoco, considerando que o tema havia sido julgado em recurso repetitivo pelo STJ.

Ademais, a Fazenda busca alterar o marco temporal da modulação alegando que seria aplicável à data em que o tema foi reconhecido como repercussão geral, no caso, 23/2/2018, o que, segundo dados da própria União, eliminaria 64% das ações ajuizadas, pois, segundo critérios apresentados nos próprios embargos de declaração, este percentual corresponde às ações ajuizadas sobre o tema após o reconhecimento da repercussão geral.

Mais uma vez, o critério adotado pela Fazenda padece de manifesta ilegalidade, na medida em que os contribuintes não ajuizarão as ações antes da referida data justamente pelo fato de existir a jurisprudência dominante no âmbito do STJ acerca da não incidência das contribuições previdenciárias sobre o 1/3 de férias.

Fica evidente, portanto, que a Fazenda Nacional busca, na verdade, postergar o trânsito em julgado da decisão do STF que aplicou a modulação, de forma a evitar a tendência já evidenciada nos Tribunais Regionais, que já estão adotado o critério da modulação na forma estabelecida pelo Supremo, e, ao final, evitar o aproveitamento dos créditos pelos contribuintes.