NOVA CENTRAL SINDICAL
DE TRABALHADORES
DO ESTADO DO PARANÁ

UNICIDADE
DESENVOLVIMENTO
JUSTIÇA SOCIAL

Distinção entre trabalho doméstico e de cuidado: perspectivas jurídicas e sociais

Distinção entre trabalho doméstico e de cuidado: perspectivas jurídicas e sociais

Historicamente, o trabalho de cuidado tem sido subvalorizado e invisibilizado, contribuindo para a desigualdade de gênero e para a limitação das oportunidades econômicas e profissionais das mulheres, especialmente das mulheres negras ¹. Embora frequentemente não remunerado, esse trabalho possui enorme relevância econômica, pois sem o cuidado prestado nas famílias e nas comunidades, especialmente aquelas das periféricas, grande parte das pessoas não poderia participar da força de trabalho formal, considerada “produtiva”, isto é, aquela voltada à geração de bens e serviços de valor mercantil ².

Em contraposição, o trabalho “reprodutivo” — aquele que assegura a reprodução da vida e das pessoas — é desvalorizado justamente por se situar no âmbito privado ou doméstico, e ser socialmente atribuído às mulheres ³. Essa divisão sexual do trabalho, fruto de uma lógica patriarcal e capitalista, construiu uma hierarquia que privilegia o trabalho produtivo, relegando o cuidado à esfera doméstica e afetiva⁴, o que foi objeto de severas críticas pelo movimento feminino.

A discussão contemporânea sobre a economia do cuidado e a valorização do trabalho doméstico tem adquirido relevância nos debates sobre direitos sociais, igualdade de gênero e dignidade da pessoa humana. Apesar de ambos se desenvolverem muitas vezes no mesmo espaço — o lar —, o trabalho doméstico e o trabalho de cuidado não se confundem. Essa distinção, de natureza conceitual e jurídica, é essencial para a formulação de políticas públicas coerentes e para a adequada proteção das trabalhadoras do cuidado.

Como destaca Raquel Leite da Silva Santana, o cuidado é uma forma de trabalho racializado, exercido majoritariamente por mulheres negras, o que evidencia a necessidade de regulamentação jurídica própria para as cuidadoras remuneradas ⁵. O Projeto de Lei nº 1.385/2007, ainda em tramitação, buscou essa profissionalização, reconhecendo o cuidado como espécie jurídica autônoma dentro do gênero “trabalho reprodutivo”.

O presente artigo, portanto, pretende refletir sobre os fundamentos sociais e jurídicos que distinguem o trabalho doméstico do trabalho de cuidado, sem pretensão de exaurir o tema, mas de contribuir para o debate sobre sua necessária valorização.

Trabalho doméstico: conceito e enquadramento jurídico

O trabalho doméstico é definido pelo artigo 1º da Lei Complementar nº 150/2015 como aquele “prestado por pessoa física, de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal, e de finalidade não lucrativa, à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas“. Trata-se de atividade essencial à reprodução da vida cotidiana — limpeza, alimentação, manutenção do lar — mas historicamente desvalorizada por estar associada à esfera privada e à feminização do labor ⁶.

A Constituição de 1988, especialmente após a Emenda Constitucional nº 72/2013, ampliou o rol de direitos dos empregados domésticos, corrigindo uma discriminação histórica existente desde o texto originário ⁷. Contudo, a persistência da informalidade e da desigualdade salarial demonstra que a valorização formal não bastou para eliminar a hierarquia social que marginaliza esse trabalho e discriminação do trabalhador doméstico, e a figura, ainda existente em muitas famílias, do “quartinho da empregada”, de que fala Laurentino Gomes, em sua trilogia Escravidão, é uma prova simbólica dessa realidade.

Do ponto de vista jurídico, a subordinação típica do emprego doméstico ocorre dentro da residência, sem finalidade econômica direta, o que o diferencia das relações produtivas. No entanto, o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, CF/88), o valor social do trabalho (artigo 1º, IV) e o princípio da igualdade material (artigo 5º, caput) impõem interpretação que supere a lógica patriarcal que inferioriza o trabalho doméstico ⁸.

Trabalho de cuidado: natureza e especificidade

O trabalho de cuidado, embora muitas vezes prestado no mesmo espaço doméstico, possui natureza distinta: trata-se de uma atividade relacional, voltada diretamente ao bem-estar físico, emocional e social de outra pessoa. Envolve, portanto, atenção, empatia e responsabilidade moral, transcendendo o simples fazer doméstico ⁹.

Esse trabalho encontra respaldo constitucional nos artigos 226, 227 e 230 da Constituição de 1988, que impõem à família, à sociedade e ao Estado o dever de proteger crianças, adolescentes, pessoas idosas e com deficiência. O cuidado, portanto, deve ser compreendido como direito fundamental e, simultaneamente, como trabalho socialmente necessário à reprodução da vida¹⁰.

A ausência de regulamentação específica no ordenamento jurídico brasileiro para o trabalho de cuidado remunerado gera insegurança e desproteção. Doutrinadoras feministas como Helena Hirata e Nancy Fraser destacam que o cuidado, enquanto atividade indispensável à manutenção da vida, deve ser reconhecido como parte integrante da economia política contemporânea, e não como um apêndice doméstico ¹¹.

No plano internacional, a Convenção nº 189 da OIT (2011) e a Recomendação nº 204 (2015) reconhecem a importância do trabalho de cuidado e instam os Estados a criarem marcos legais que garantam proteção social, condições dignas e igualdade de oportunidades ¹².

Linha tênue e critérios distintivos

A fronteira entre o trabalho doméstico e o trabalho de cuidado nem sempre é nítida. Em muitos casos, a mesma pessoa realiza funções domésticas e presta assistência direta — como limpar a casa e cuidar de uma criança ou idoso.

-Se o objeto predominante é a manutenção do lar, trata-se de trabalho doméstico.

-Se o objeto é o cuidado direto e contínuo de pessoa, configura-se trabalho de cuidado ¹³.

A doutrina contemporânea tem enfatizado a dimensão humana e afetiva do cuidado, que exige preparo técnico e emocional. A pessoalidade, a confiança e a responsabilidade envolvidas fazem do cuidado uma categoria de labor que demanda formação específica, especialmente no atendimento a pessoas idosas, enfermas ou com deficiência ¹⁴.

Implicações jurídicas e desafios normativos

A ausência de regulação específica para o trabalho de cuidado compromete a segurança jurídica de trabalhadoras e empregadores, além de invisibilizar o valor econômico dessa atividade. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que o trabalho não remunerado de cuidado representa mais de 10% do PIB brasileiro ¹⁵.

De fato, a ausência de normas disciplinando essa modalidade de trabalho termina contribuindo para a manutenção da divisão desigual do trabalho, o que tem implicações negativas para a igualdade de gênero. Isso se manifesta no fato de que muitas ocupações de cuidado são erroneamente consideradas não qualificadas ou uma extensão do papel “natural” ou “tradicional” das mulheres como cuidadoras, um estereótipo que contribui para seu baixo status, baixa remuneração e falta de representação nos espaços de tomada de decisão.

A distinção entre “cuidar” e “servir” é crucial. O primeiro implica uma relação de assistência e afeto; o segundo, de prestação material. Por isso, defende-se, aqui, a criação de um marco legal próprio para os cuidadores, contemplando jornada especial, formação mínima, remuneração adequada e responsabilidades diferenciadas ¹⁶.

A construção de políticas públicas que valorizem o cuidado é, portanto, uma exigência de justiça social e de direitos humanos, em consonância com os compromissos assumidos pelo Brasil perante organismos internacionais como a ONU Mulheres e a OIT.

Conclusão

A distinção entre o trabalho doméstico e o trabalho de cuidado transcende a semântica: trata-se de reconhecer juridicamente atividades centrais à manutenção da vida e da dignidade humana.

Enquanto o primeiro está voltado à organização do lar, o segundo visa ao bem-estar de pessoas, com complexidade técnica e afetiva que impõe regulamentação própria. A valorização do cuidado como trabalho essencial demanda superar a herança patriarcal e racial que o invisibiliza e afirmar, sob a ótica constitucional, que cuidar é também produzir humanidade.

O desafio que se impõe ao legislador é construir um marco jurídico que reconheça o cuidado como trabalho socialmente necessário, dotado de valor econômico, ético e político, conforme os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade e do valor social do trabalho (artigos 1º, III e IV; 3º, IV; e 5º, caput, da CF/88).


1. FEDERICI, Silvia. O ponto zero da revolução: trabalho doméstico, reprodução e lutas feministas. São Paulo: Elefante, 2019.

2. FRASER, Nancy. Contradições do capital e cuidados. Revista Sociedade e Estado, Brasília, v. 33, n. 1, 2018.

3. HIRATA, Helena. Trabalho, cuidado e desigualdades. São Paulo: Boitempo, 2020.

4. SOUZA-LOBO, Elisabeth. A classe operária tem dois sexos: trabalho, dominação e resistência. São Paulo: Brasiliense, 2011.

5. SANTANA, Raquel Leite da Silva. O trabalho de cuidado e a racialização do labor feminino. Revista Direito e Sociedade, v. 10, n. 2, 2022.

6. Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015. Diário Oficial da União, Brasília, 2 jun. 2015.

7. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

8. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 20. ed. São Paulo: LTr, 2021.

9. PISCITELLI, Adriana. Cuidado e gênero: novas fronteiras do trabalho reprodutivo. Revista Cadernos Pagu, n. 55, 2019.

10. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, arts. 226, 227 e 230.

11. FRASER, Nancy; HIRATA, Helena. Crisis of care and gender equality. Paris: CNRS Éditions, 2020.

12. Organização Internacional do Trabalho (OIT). Convenção nº 189 e Recomendação nº 204 sobre o Trabalho Doméstico. Genebra, 2011.

13. Ibid.

14. Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira. Brasília, 2023.

15. Tempo de cuidar: o trabalho não remunerado e os seus impactos econômicos. Brasília, 2022.

16. BRITO, Fausto. Políticas públicas e economia do cuidado no Brasil. Revista Serviço Social e Sociedade, v. 145, 2023.

17. IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), 2024.

  • é desembargador do Trabalho, diretor da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (Ejud24), mestre e doutor em Direito Social pela Universidad de Castilla-La Mancha (Espanha).

CONJUR
https://www.conjur.com.br/2025-out-31/distincao-entre-trabalho-domestico-e-de-cuidado-perspectivas-juridicas-e-sociais/

Presidente da NCST/PR traça rota política e financeira para o Movimento Sindical em Seminário da FETROPAR

Presidente da NCST/PR traça rota política e financeira para o Movimento Sindical em Seminário da FETROPAR

Guaratuba/PR – O Seminário de Negociação Coletiva e Jurídico da FETROPAR – Federação dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário do Estado do Paraná, realizado no dia 29 de outubro de 2025 no auditório do FECEP em Guaratuba/PR, contou com a participação enfática de Denílson Pestana da Costa, presidente da Nova Central Sindical de Trabalhadores do Estado do Paraná (NCST/PR). Em sua fala, Costa abordou desde o reconhecimento da força negocial da FETROPAR até os desafios eleitorais e de sustentabilidade que o movimento sindical enfrentará em 2026.

*Reconhecimento da Força Rodoviária*

O presidente da NCST/PR iniciou seu discurso prestando homenagens à FETROPAR e ao seu presidente, Moacir, afirmando ter vindo retribuir o carinho recebido. Ele destacou a importância da FETROPAR, juntamente com a Fetraconspar e a Fethepar, como o “tripé” que sustenta politicamente a Nova Central no Paraná, sendo sempre consultadas em todas as ações estaduais.

Pestana fez um balanço das negociações de 2025 e ressaltou que, entre todas as federações, a FETROPAR é a que mais negocia. Ele revelou que a Federação fechou mais de 400 acordos e convenções coletivas no ano. Em comparação, ele mencionou que sua própria federação fechou cerca de 40 convenções e alguns acordos coletivos, o que representa apenas 10% do volume alcançado pela FETROPAR.

*O Cenário Político de 2026: Aumentar a Bancada*

Denílson Pestana classificou 2026 como um “ano desafiador” para o movimento sindical e os trabalhadores. O primeiro grande desafio é a preparação para o processo eleitoral, que envolverá a renovação da Câmara dos Deputados e de 2/3 do Senado Federal.

Ele apontou a necessidade urgente de aumentar a bancada de deputados federais do Congresso Nacional para que as pautas sindicais possam avançar. No Paraná, o quadro atual é desfavorável, com a votação frequentemente resultando em 23 a 7 contra os interesses dos trabalhadores. A situação se repete no Senado, onde as perdas são frequentes (muitas vezes 2 a 1 ou 3 a 0). Denilson atribuiu aos rodoviários e trabalhadores da construção civil e turismo a “responsabilidade enorme” de mudar esse quadro.

O presidente da NCST/PR enfatizou que o lado patronal já declarou que sua prioridade é garantir maioria no Senado. Ele alertou que esse movimento visa atacar o Supremo Tribunal Federal (STF), enfraquecer o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e, consequentemente, enfraquecer o movimento sindical no Brasil.

Portanto, o movimento precisa trabalhar não apenas pela reeleição do Presidente Lula, que é crucial para “continuar sonhando por mais 4 anos”, mas também garantir “maioria no Congresso Nacional” para implementar políticas sem dificuldades.

*Sustentabilidade e o Tema 935: Cobrança Constitucional*

A sustentabilidade financeira foi um ponto central na sua fala, sendo classificada como um desafio. Denilson Pestana afirmou que, assim como alguns trabalhadores podem ser considerados “ingratos” com os sindicatos, há sindicatos que são “ingratos com a federação” e a central sindical.

Um avanço fundamental para a sustentabilidade foi a votação do Tema 935 pelo Supremo Tribunal Federal. Antes, a cobrança de contribuições de não filiados era tratada como “criminoso”. Agora, a cobrança da contribuição negocial é constitucional e legal.

Denilson criticou a postura de olhar para o sindicato com um “copo vazio” e defendeu a necessidade de um “bom diagnóstico”. Ele defendeu que é preciso mapear quem são as pessoas e empresas que enviaram cartas de oposição para medir o real tamanho da categoria. Ele deu o exemplo de seu sindicato, que com 17.000 trabalhadores em sua base, recebeu 1.295 cartas de oposição em 2025, o que significa que mais de 15.000 pessoas estão habilitadas a pagar contribuição.

Ele concluiu que o sindicato representa a categoria inteira, não apenas os associados, e por isso, “trabalho não remunerado é trabalho escravo”. Todo trabalhador beneficiado pelo acordo ou convenção deve pagar a contribuição.

*Agenda Imediata e o Sistema S*

Para o final de 2025, o presidente da NCST/PR listou tarefas importantes, incluindo a participação na pré-conferência estadual do trabalho (25/11/2025), que é inédita e tripartite, e a conferência estadual (3/12/2025 em Curitiba). Nessa conferência, serão definidos os 13 representantes dos trabalhadores da Nova Central que irão à conferência nacional.

Por fim, Denilson fez um apelo por uma posição clara sobre o Sistema S, exigindo três pontos principais :

1. Reivindicar a paridade de representação no Sistema S .
2. Reivindicar a paridade de recurso: 50% do dinheiro deve ser destinado às federações de trabalhadores e 50% às federações patronais, visando acabar com a “disparidade de armas” .
3. Construir uma denúncia formal ao governo brasileiro, acusando-o de financiar as instituições patronais através dos recursos do Sistema S, espelhando a denúncia que foi feita contra a contribuição sindical no passado .

Denílson Pestana da Costa finalizou desejando sucesso ao seminário da FETROPAR, afirmando que os participantes sairão do evento “preparados para enfrentar” os desafios de 2026 .

Distinção entre trabalho doméstico e de cuidado: perspectivas jurídicas e sociais

Ausência de contrato intermitente atrai reconhecimento de vínculo, diz juiz

A ausência de contrato intermitente formalizado impõe o reconhecimento do vínculo empregatício.

O entendimento é do juiz Wildner Izzi Pancher, da 5ª Vara do Trabalho de Santos (SP), que declarou a existência de contrato ordinário de emprego no caso de uma trabalhadora que prestou serviços três dias por semana. Para o magistrado, a profissional não podia ser relegada à informalidade.

“A relação havida entre as partes devia ser formalizada com a celebração de um contrato de trabalho intermitente”, como previsto no artigo 443 da Consolidação das Leis do Trabalho, disse o juiz na decisão.

O magistrado também explicou que, nesse tipo de contrato, o serviço é prestado com subordinação, mas com alternância entre períodos de atividade e inatividade, definidos por horas, dias ou meses, independentemente da atividade exercida.

Ainda de acordo com a sentença, o contrato intermitente deve ser celebrado por escrito, conforme artigo 452-A, da CLT, e, não tendo a empresa atendido a tal imposição legal, deve arcar com “as más consequências da sua inadvertida opção”.

Considerando a ausência de formalização e a presença dos requisitos do contrato de emprego de que tratam os artigos 2º e 3º da CLT, a decisão concluiu que é necessário o reconhecimento de vínculo de emprego entre as partes. Com isso, a ré deve anotar a carteira de trabalho da autora e pagar as verbas devidas. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-2.

Processo 1000981-82.2025.5.02.0445

CONJUR

https://www.conjur.com.br/2025-out-29/ausencia-de-contrato-intermitente-atrai-reconhecimento-de-vinculo-diz-juiz/

Distinção entre trabalho doméstico e de cuidado: perspectivas jurídicas e sociais

“Não serve nem para ser escravo”: TST condena empresa por assédio moral

TRT da 3ª região havia considerado que os xingamentos eram fruto de “personalidade forte” do chefe; mas o TST concluiu que a conduta violou a dignidade do trabalhador, gerando o dever de indenizar.

Da Redação

A 6ª turma do TST condenou uma construtora a indenizar em R$ 5 mil um soldador vítima de assédio moral em razão de ofensas e xingamentos no ambiente de trabalho. O TRT da 3ª região havia negado o pedido por entender que as agressões verbais eram dirigidas a todos e representavam um “traço de personalidade forte” dos superiores hierárquicos.

Para o TST, porém, o fato de o tratamento desrespeitoso atingir diversos empregados não afasta a ilicitude da conduta, pelo contrário, agrava a responsabilidade da empregadora.

“O empregador tem o dever de zelar pela urbanidade no ambiente de trabalho, orientando e fiscalizando o tratamento dispensado pelo seu preposto aos empregados. A empresa tem responsabilidade por manter um ambiente de trabalho civilizado.”

Entenda o caso

O trabalhador foi contratado em agosto de 2017 e atuou em obras em Minas Gerais e Santa Catarina até julho de 2018. Segundo narrou na ação, dois encarregados italianos tratavam os funcionários com rispidez, preconceito e desrespeito, proferindo ofensas como “burro”, “porco” e “veado”, além de frases como “brasileiro não serve nem para ser escravo” e “na Itália morreria de fome”.

Na ação trabalhista, o juízo de 1º grau reconheceu o assédio moral e fixou indenização de R$ 5 mil. O TRT da 3ª região, contudo, reformou a sentença, entendendo que não havia direcionamento discriminatório ao autor da ação, pois as agressões verbais atingiam a todos os empregados.

Para o Tribunal, a conduta dos encarregados representava apenas um “traço de personalidade forte”.

Diante da decisão, o soldador recorreu ao TST.

Ofensas a todos são agravantes, não excludentes

Ao analisar o caso, a ministra Kátia Magalhães Arruda, restabeleceu a condenação por assédio moral. Para a relatora, ficou comprovado que o reclamante e os demais trabalhadores eram submetidos a tratamento grosseiro e humilhante, o que caracteriza violação à dignidade humana.

“Os fatos narrados demonstram a caracterização de dano moral, ante o sofrimento psíquico decorrente dos constrangimentos a que foi submetido o reclamante, com xingamentos. Não é possível que em pleno século XXI o trabalhador ainda seja submetido a esse tipo de conduta reprovável por parte de superior hierárquico. A conduta abusiva ultrapassou os limites do jus variandi e atentou contra a dignidade do empregado.”

Kátia Arruda destacou que o empregador tem o dever de zelar pela urbanidade e respeito no ambiente de trabalho, orientando e fiscalizando o comportamento de seus prepostos.

“O fato de o tratamento desrespeitoso ser dirigido a todos no ambiente de trabalho, e não apenas ao reclamante, não é excludente da ilicitude. Pelo contrário, é agravante. Em tese o caso seria até mesmo de danos morais coletivos, se a matéria estivesse sendo discutida em ação coletiva”, observou.

Por fim, ressaltou o papel pedagógico das decisões trabalhistas, afirmando que a Justiça do Trabalho deve não apenas pacificar conflitos individuais, mas afirmar os direitos sociais e coibir condutas abusivas nas relações laborais.

Segundo a ministra, a reparação tem caráter compensatório e educativo, reforçando a função social da empresa e o dever de proporcionar um ambiente de trabalho saudável.

O colegiado acompanhou o voto da relatora por unanimidade, e fixou a indenização em R$ 5 mil.

Processo: RR-10120-70.2020.5.03.0074
Acesse a íntegra do acórdão: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.migalhas.com.br/arquivos/2025/10/AF29027D245524_RR-10120-70_2020_5_03_0074.pdf

MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/quentes/443325/nao-serve-nem-para-ser-escravo-tst-condena-empresa-por-assedio-moral

Distinção entre trabalho doméstico e de cuidado: perspectivas jurídicas e sociais

Condenação por assédio moral e sexual é definida com base em depoimento da vítima

A Quinta Turma do TST rejeitou examinar recurso de duas empresas de grupo econômico contra decisão que as condenou a pagar reparação por danos morais a um operador de máquinas que foi assediado moral e sexualmente por um gerente. Segundo o trabalhador,  o assédio começou  com brincadeiras inadequadas, passou a apelidos de cunho xenofóbico e chegou a toques no empregado com teor sexual.

O operador de máquinas foi contratado para prestar serviços a uma indústria. Na reclamação trabalhista, ele fez diversos pedidos, entre eles adicional de insalubridade, indenização por danos morais por acidente de trabalho e por assédio moral e sexual.

Insultos, xenofobia e toques ofensivos

Na ação, o trabalhador relatou que sofreu assédio moral por parte de seu gerente, que o xingava de “desgraçado” e o insultava com apelidos de cunho xenofóbico, chamando-o de “comedor de farinha”, por ele ser nordestino. Quanto ao assédio sexual, relatou toques constrangedores do supervisor, que passava a mão em suas nádegas.

Em relação ao assédio, o juízo de primeiro grau citou jurisprudência do TST destacando a valoração do depoimento da vítima, devido às peculiaridades do assédio sexual, pois, no caso, o depoimento do trabalhador foi fundamental na sentença.

Ao se referir à prova oral, o magistrado apontou que o empregado relatou que, após três meses da admissão, passou a sofrer abusos por parte do gerente, com “brincadeiras, palavreado repulsivo, palavrões, toques”. Contou que o gerente questionava se ele gostava de homem, se era “viado”, se fazia programa, e, por fim, disse: “passava direto a mão na minha bunda”.

O representante das empregadoras, por sua vez, afirmou, em seu depoimento, que o operador não havia reclamado com ele sobre o assédio e que, com o ajuizamento da ação, “não foi feita apuração”.

“Depoimento consistente”

Na sentença, o juízo de primeiro grau salientou que o depoimento do operador de máquinas foi “consistente e coerente, demonstrando emoção sincera, choro com prisão da respiração ao relatar o ocorrido”. Observou também que, na sequência do depoimento, o trabalhador abaixou a cabeça, demonstrando constrangimento, “não deixando dúvidas a este juiz, no momento da oitiva, quanto à ocorrência dos fatos narrados no depoimento em plena consonância com a inicial”. Considerando a gravidade da culpa da empregadora, que nem mesmo com o ajuizamento da ação procurou apurar os fatos relatados pelo empregado, o juízo condenou as empresas, em maio de 2024, a pagar indenização de R$ 15 mil.

As empresas recorreram ao Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), que manteve a sentença, com base nas provas dos autos. O TRT destacou que o Poder Judiciário não pode concordar com a omissão da empresa em oferecer o suporte necessário ao empregado e em providenciar efetiva apuração e investigação dos fatos denunciados.

Na tentativa de levar o caso para discussão no TST e negando os fatos relatados pelo operador de máquinas na petição inicial, as empresas sustentaram que caberia ao empregado comprovar que os acontecimentos alegados, de fato, ocorreram, ônus do qual, segundo elas, o trabalhador não se desincumbiu.

Inexistência de medidas de prevenção e combate a assédio

O relator do agravo em agravo de instrumento, ministro Breno Medeiros, assinalou que o TRT manteve a condenação, porque o juízo de origem julgou o depoimento do trabalhador “sincero e convincente”, prestigiando  a  valoração  das  provas  já  realizada,  em  atenção  aos  princípios  da imediação  e  da  oralidade, e considerando ainda  a confissão da  empregadora  quanto  à  inexistência  de medidas  internas  de  prevenção  e  de  combate  a  práticas  de  assédio  moral  e  sexual  no  trabalho.

Breno Medeiros destacou que a  questão  não  foi  decidida  pelo  Tribunal Regional  com  base  na distribuição   do ônus da prova, “mas  sim  na  prova  efetivamente  produzida  e  valorada”, mostrando-se impertinentes as violações aos artigos  818, inciso I, da CLT, e 373, inciso I, do Código de Processo Civil (CPC), alegadas pelas empresas.

Para o relator, o agravo deveria ser rejeitado, pois não  foram apresentados  argumentos  suficientes  para  reformar a decisão que impediu o exame do recurso de revista.

Por unanimidade, a Quinta Turma acompanhou o voto do relator.

(Lourdes Tavares/GS)

O TST tem oito Turmas, que julgam principalmente recursos de revista, agravos de instrumento e agravos contra decisões individuais de relatores. Das decisões das Turmas, pode caber recurso à Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1).

TST JUS

https://www.tst.jus.br/en/-/condenacao-por-assedio-moral-e-sexual-e-definida-com-base-em-depoimento-da-vitima

Distinção entre trabalho doméstico e de cuidado: perspectivas jurídicas e sociais

Senado dos EUA aprova projeto simbólico para suspender tarifas do Brasil

Senado dos Estados Unidos aprovou, na noite de terça-feira (28), um projeto de lei que prevê a anulação das tarifas impostas pelo presidente Donald Trump sobre produtos brasileiros, incluindo petróleo, café e suco de laranja. A iniciativa, apresentada pelo senador democrata Tim Kaine, da Virgínia, foi aprovada por 52 votos a 48, com cinco senadores republicanos apoiando a medida — Susan Collins, Mitch McConnell, Lisa Murkowski, Rand Paul e Thom Tillis. Todos os democratas presentes votaram a favor.

Apesar do aval do Senado, o projeto enfrenta grandes obstáculos. Ele ainda precisa ser aprovado pela Câmara dos Deputados, controlada pelos republicanos, que recentemente adotou regras que permitem à liderança barrar projetos relacionados a tarifas. Além disso, Trump poderia vetar a proposta, reforçando o caráter principalmente simbólico da medida.

Para Kaine, a votação é uma forma de forçar o debate sobre os impactos econômicos das tarifas. “É uma maneira de expor a destruição econômica causada pelas tarifas”, afirmou.

A resolução também funciona como teste para medir a adesão dos senadores republicanos à política comercial do presidente, especialmente no contexto de instabilidade econômica.

O Escritório de Orçamento do Congresso já indicou que as tarifas podem elevar desemprego e inflação, além de reduzir o crescimento econômico nos EUA.

Caminho para negociações bilaterais sobre tarifas

A aprovação do projeto ocorre em paralelo a avanços nas negociações comerciais entre Brasil e Estados Unidos. No domingo (26), os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump se reuniram por cerca de 45 minutos, aumentando a expectativa de exportadores brasileiros quanto à redução das tarifas.

“O que importa em uma negociação é olhar para o futuro. A gente não quer confusão, quer resultado”, disse Lula. Trump, por sua vez, afirmou que o encontro foi “muito bom”, mas não garante um acordo imediato, destacando que o Brasil ainda paga cerca de 50% de tarifa sobre alguns produtos.

Na segunda-feira (27), representantes comerciais dos dois países realizaram a primeira reunião técnica, com participação do chanceler Mauro Vieira, do secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Márcio Rosa, e do embaixador Audo Faleiro. O grupo estabeleceu um calendário de reuniões focado nos setores mais afetados pelas tarifas, sem data definida para novos encontros.

Lula destacou que “não existem temas proibidos” nas negociações, incluindo minerais estratégicos, açúcar e etanol, e sugeriu a suspensão temporária das tarifas durante o processo, modelo aplicado em acordos com México e Canadá.

O presidente também contestou a justificativa do governo norte-americano para a imposição das tarifas, apresentando a Trump um documento que revela um superávit de US$ 410 bilhões acumulado pelos EUA na balança comercial com o Brasil nos últimos 15 anos.

Diálogo cordial

O diálogo foi descrito como cordial, com Trump afirmando que foi “uma grande honra” conversar com Lula, e ambos cogitaram visitas recíprocas ainda sem data definida. Entidades empresarias, como a CNI (Confederação Nacional da Indústria) e a Amcham (Câmara Americana de Comércio para o Brasil), consideraram o encontro um avanço concreto e esperam um acordo nas próximas semanas.

“Esperamos concluir em pouco tempo uma negociação bilateral que trate dos setores afetados”, afirmou Vieira, sinalizando otimismo em torno do desfecho das tratativas.

ICL NOTÍCIAS
https://iclnoticias.com.br/economia/senado-dos-eua-tarifas-do-brasil/