São números deixados pelo relatório do Observatório da Dívida Social Argentina elaborado pela UCA. Segundo sua estimativa, nos primeiros 120 dias de governo houve um aumento de 11% na taxa de pobreza. A indigência passou de 9,6 para 17,5 no primeiro trimestre de 2024.
A reportagem é publicada por Página|12, 04-06-2024.
25 milhões de cidadãos argentinos vivem na pobreza. Esse é o número estimado pelo Observatório da Dívida Social Argentina da Universidade Católica Argentina, ao estipular que no final de 2023 a taxa de pobreza era de 44 e que, nos primeiros três meses – que coincidem com o governo de Javier Milei – a pobreza aumentaria para 55%. Enquanto isso, Milei também deve soar o alarme de quase duplicar a taxa de indigência: segundo a medição da UCA, nesse mesmo período estima-se um aumento de 9,6 para 17,5%.
Os números derivam do relatório denominado Raio X da pobreza na Argentina: realidade social e solidariedade que é esperança. Aí, através de gráficos e números, indicam que este aumento brutal é atribuído, em grande parte, ao impacto da inflação dos últimos meses e ao aumento principalmente do sector alimentar que afetou as camadas mais baixas da sociedade. Ao tomar posse, o governo La Libertad Avanza provocou uma desvalorização de 114% e capacitou trabalhadores sem-abrigo, com o lema de “desregulamentar a economia”.
Da mesma forma, o estudo garante que cerca de 7,8 milhões de pessoas se encontram em estado de extrema pobreza ou indigência, ou seja, estão abaixo da cesta básica (CBA).
“A insegurança alimentar total nas áreas urbanas pesquisadas pela pesquisa ODSA-UCA atinge 24,7% das pessoas, 20,8% dos domicílios e 32,2% das crianças e adolescentes. Por outro lado, 10,9% das pessoas, 8,8% dos domicílios e 13,9% das crianças e adolescentes (NNyA) estão em situação ainda mais grave, com grave insegurança alimentar. Ao considerar a AMBA, os valores totais de insegurança alimentar situam-se em 26,4% das pessoas, 21,8% dos domicílios e 35% das crianças e adolescentes. Quando se considera a insegurança alimentar grave, são 9,9%, 12,7% e 16,5%, respetivamente”, afirma o relatório.
Por sua vez, 20,6% dos agregados familiares que sofrem de insuficiência alimentar total são cerca de 3,7 milhões de lares que albergam cerca de 11 milhões de habitantes.
A pobreza reflete-se também na falta de acesso a serviços básicos e na elevada dependência de ajudas estatais. O relatório detalha que 42,6% das crianças e adolescentes moram em lares que recebem o Bolsa Criança Universal (AUH) e o Cartão Alimentação. Além disso, 50% dos menores frequentam os refeitórios escolares, 36,7% recebem caixas ou sacos de alimentos nos refeitórios e 11,1% nos refeitórios não escolares.
No que diz respeito à mortalidade infantil, o estudo observa que, embora tenha havido melhorias gerais nas últimas décadas, persistem disparidades significativas entre as províncias, com níveis mais elevados de mortalidade infantil correlacionados com taxas mais elevadas de miséria monetária.
O déficit educacional é outro aspecto crítico. A pesquisa refere que 23% das crianças dos 3 aos 5 anos não frequentam estabelecimentos de ensino formal, 9,1% das crianças e adolescentes dos 6 aos 12 anos frequentam o ensino primário com excesso de idade e 35,3% dos jovens entre os 18 e os 29 anos. anos não concluíram o ensino médio. Estes dados refletem o impacto negativo da pobreza na educação, apesar do apoio do sistema de gestão público e privado.
O mercado de trabalho não escapa a esta realidade. 32,5% dos trabalhadores empregados residem em agregados familiares em situação de pobreza. Além disso, 30,9% trabalham na economia social e, considerando a população economicamente ativa, 26,5% têm emprego precário e 24,3% têm subemprego instável.
A apresentação do relatório – que revela os novos dados da pobreza – surge num contexto crítico para o Governo, já atingido pelo escândalo dos alimentos armazenados e pelas contratações irregulares no Ministério do Capital Humano.
A principal ferramenta de buscas na internet quer oferecer apenas resumos, capturando o conteúdo gerado por zilhões de sites e omitindo as fontes. O que isso diz sobre monopólios, apagamento da memória e apropriação do trabalho coletivo.
O artigo é de James Görgen, especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, publicado por Outras Palavras em 03-06-2024.
Eis o artigo.
Duas notícias que circularam na semana passada chamaram a atenção por serem riscos em potencial para o futuro da Internet. Uma trata do possível começo do fim e a outra, do fim do começo da world wide web como a conhecemos. A primeira foi o anúncio por parte da Google do lançamento da ferramenta AI Overviews durante a conferência da empresa voltada a desenvolvedores[1]. Comemorada pelos entusiastas de inteligência artificial e condenada como o fim da web por alguns jornalistas e especialistas em tecnologia, trata-se da substituição de sua clássica interface e sistema de busca na Internet, que deixará de apresentar weblinks como primeiro resultado, passando a usar IA para exibir um pequeno resumo do que foi pesquisado pelo usuário direcionando-o para determinadas fontes. Na outra ponta, do apagamento da história digital, um estudo do Pew Research Center revelou que 38% das webpages existentes na Internet em 2013 já não podem mais ser encontradas ou acessadas.
Fim do começo
A metodologia do estudo[2] sobre acessibilidade de conteúdo on-line foi estruturada em três partes[3] e os resultados deste rastreamento, que os pesquisadores chamam de deterioração digital, se mostraram preocupantes. Entre as principais conclusões do estudo do centro de pesquisas vale destacar:
25% de todas as páginas da Web que existiam entre 2013 e 2023 não estavam mais acessíveis em outubro de 2023, sendo que o conteúdo mais antigo tem ainda mais probabilidade de desaparecer. 38% das páginas da Web de 2013 não estão mais disponíveis hoje, em comparação com 8% das páginas de 2023.
23% dos sites de notícias e 21% dos sites governamentais contêm pelo menos um link quebrado. As páginas de governos locais têm taxas especialmente altas de links quebrados. Sites de notícias com níveis de tráfego altos e baixos têm a mesma probabilidade de ter links quebrados.
54% das páginas da Wikipédia têm pelo menos um link quebrado em sua seção “Referências”.
Quase um em cada cinco tweets não é mais visível publicamente no Twitter apenas alguns meses após ter sido publicado. Em 60% desses casos, a conta foi tornada privada, suspensa ou totalmente excluída. Certos tipos de tweets têm maior probabilidade de desaparecer, como aqueles em turco ou árabe, ou de contas com configurações de perfil padrão.
A maioria dos tweets que são removidos tende a desaparecer logo após serem publicados. Metade dos tweets que acabam sendo removidos fica indisponível nos primeiros seis dias e 90% em 46 dias. No entanto, 6% dos tweets removidos ficam disponíveis novamente mais tarde.
Estes resultados levam a algumas perguntas as quais pode ser muito cedo para termos respostas. Por exemplo, o conteúdo que está desaparecendo seria útil para preservar a veracidade de alguma informação na Internet ou era algo irrelevante ou falso? Como a memória da humanidade armazenada em bilhões de webpages ao longo das últimas três décadas pode ser preservada? O elevado indicador de sites de notícias que apresentam links quebrados pode ter impactos na formação da opinião pública? Difícil termos alguma pista para onde esse fenômeno vai nos levar. Mais dramático ainda é perceber que pouco pode ser feito para impedi-lo ou revertê-lo.
Memória digital
Se a história sempre foi escrita pelos vencedores, e consequentemente a memória também, a democratização do acesso à Internet e a população da web deram esperanças que isso poderia estar mudando ao final dos anos 1990. Agora, ao invés de estarmos presos a arquivos e museus com artefatos e textos coletados e organizados por uma elite intelectual, em tese qualquer um poderia registrar para a posteridade seu próprio conteúdo, produzir trabalho em co-autoria e interagir com a própria construção oficial da memória a partir de comentários em sítios e outras atividades. Além do boom dos blogs, isso obrigou os compiladores da história oficial a alterarem a forma como construíam seu próprio acervo, incorporando alguns destes usuários, e suas criações, a seu trabalho.
Esta evolução, ou involução se você preferir, está bem documentada no texto Between Archive and Participation: Public Memory in a Digital Age, de Ekaterina Haskins”[4], que analisou ainda em 2007 as informações sobre os atos de terrorismo de 11 de setembro de 2001 e seus registros na Internet. Analisando este conteúdo, ela pôde perceber que essa nova forma de memória criou um paradoxo: a democratização do passado foi entrelaçada com a perda da consciência histórica. “A velocidade destrói o espaço e apaga a distância temporal. Em ambos os casos, o mecanismo de percepção fisiológica é alterado. Quanto mais memória armazenamos nos bancos de dados, mais o passado é sugado para a órbita do presente, pronto para ser chamado na tela”, escreve Andreas Huyssen.
Este risco se torna ainda mais presente quando alguém decide registrar e interpretar para nós o nosso passado. “Quando a tecnologia oferece a capacidade de recuperação instantânea, o impulso individual de se lembrar diminui. Se a preservação e a recuperação de arquivos não forem equilibradas por mecanismos que estimulem o envolvimento participativo, a memória eletrônica poderá levar à amnésia autocongratulatória”, concluiu Haskins ainda em 2007, quando a IA generativa ainda não tinha virado a coqueluche do momento.
Começo do fim
Talvez pior do que um conteúdo desaparecer da rede mundial de computadores, ou abrirmos mão de o recuperarmos por nós mesmos, iniciando o fenômeno do apagamento da memória digital da humanidade, é este mesmo pedaço de história ser silenciado ou se tornar invisível para a maior parte das pessoas. Este é o efeito mais natural que a maior aposta da Search Generative Experience (SEG) da Google, os AI Overviews, pode causar à web[5]. No momento em que a ferramenta de busca que domina mais de 90% das pesquisas mundiais online decide alterar seu modelo de negócios para oferecer sumários de temas elaborados por algoritmos de IA, os impactos na Internet como a conhecemos são imprevisíveis. Os primeiros resultados não promissores foram compilados nesta matéria da BBC[6]. Basicamente, sítios jornalísticos perderam visibilidade e posts de redes sociais como Reedit, Quora e Instagram experimentaram crescimentos vertiginosos nos resultados.
O primeiro e mais eloquente deles é o desaparecimento dos produtores de conteúdos originais dos resultados gerados pelo modelo Gemini, a base algorítmica dos AI Overviews. No momento em que a busca do Google passa a preparar seus resumos valendo-se de técnicas como web scraping, a fonte de determinada informação desaparece. Isso levou algumas pessoas a especularem que esta foi a saída encontrada pela empresa para contornar o crescente número de serviços jornalísticos e legislações nacionais que passaram a pleitear remuneração ou incidência de tributos sobre a compilação de seu conteúdo original. Mais do que isso. “Os editores e os varejistas estão apavorados com a possibilidade de que isso corte profundamente o tráfego de referência e acabe com seus negócios”, escreveu Scott Rosenberg na Axios[7].
Outro ponto relevante a se levar em conta, além daqueles já apontados por Haskins, é o que externalidades como alucinações, erros e vieses dos modelos de IA podem acarretar para a integridade da informação que resultará da busca. Se na pesquisa tradicional as pessoas já acessavam apenas os primeiros links que viam, o que gerou a alavancagem de conteúdos por meio de publicidade, o recebimento de um resumo aparentemente plausível sobre qualquer tema que estejamos buscando tende a consolidar ainda mais esta tendência. E a empresa já anunciou que, em breve, incorporará publicidade a esta solução[8]. Com isso, a informação que não se enquadre na prioridade do algoritmo provavelmente permanecerá invisível para a maior parte dos usuários. Por mais que a empresa sustente que é possível você optar por usar a interface original, poucas pessoas saberão ou terão interesse em fazer isso dada a comodidade que os resumos oferecem.
Outra preocupação que advém desta alteração é sobre o próprio modelo de negócios da empresa, que sempre teve seu motor principal na publicidade por trás dos links azuis que nos acostumamos a ver várias vezes ao dia. “A Google tem mais motivos do que a maioria para agir com cautela nesse caso: ela fornece publicidade para muitas das páginas da Web que estão prestes a perder todo esse tráfego e tem a perder com o desaparecimento das visitas a essas páginas. No entanto, como a empresa mantém uma posição dominante em grande parte do mercado de publicidade digital, ela parece estar apostando que poderá enfrentar a transição e suavizar quaisquer solavancos, acionando as alavancas de suas muitas outras fontes de receita. (…) A empresa tem muitas alavancas à sua disposição aqui: ela pode escolher quando mostrar visões gerais de IA e quando não mostrar; se o tráfego de saída cair vertiginosamente, chamando a atenção de reguladores ou outras partes prejudicadas, ela poderá reverter as alterações por um tempo.”, argumentou Casey Newton, na Platformer[9].
Este acontecimento fez Andrew Orlowski decretar, mais uma vez, o fim da WWW em um texto[10], no sítio de notícias UnHerd, onde analisou de forma crítica a mudança estrutural anunciada há alguns dias. O jornalista e escritor mostra também que os planos do conglomerado para se afastar da web já vinham sendo traçados:
Mas, na realidade, o interesse do Google na Web vem diminuindo há muito tempo. Artigos lamentando seu fim têm aparecido desde que Chris Anderson, o chefe dos formadores de opinião da Wired, proclamou que a Web estava ‘morta’ em 2010. [Tim] Berners-Lee publica regularmente manifestos para “salvar” a Web, e ninguém presta atenção. Hoje, mais de 80% dos dois bilhões de usuários diários do Facebook acessam a rede social apenas por meio de um telefone. As empresas não se sentem mais obrigadas a criar sites. A maior parte do que restou é suja e está morrendo.
Atualmente, o Google está erguendo uma barreira entre o pesquisador e as informações que ele procura, usando a IA generativa, que a empresa acredita criar resultados mais úteis, como resumos. Essa barreira, que consiste no que a ex-diretora de pesquisa do Google, Meredith Whittaker, chama de ‘pasta de conteúdo derivado’, causa problemas: o que é gerado pode ou não se parecer com o original, graças a erros adicionais e “alucinações”. A nova barreira também remove os criadores de material original da cadeia de valor. O mundo nunca foi tão empolgante quanto nos prometeram os utópicos da Web; agora, ele será mais vazio do que nunca.
Há anos quem acompanha de perto sabe que a web está definhando, não por meio de um colapso, mas através do que Newton nominou como um “declínio gerenciado”. Rosenberg lembra, porém, que se a Google não administrar esse declínio com cuidado, a IA poderá acabar não apenas “comendo” a Web, mas engolindo o próprio sustento do grupo Alphabet. “Em um mundo em que todos obtêm respostas e não precisam clicar em links, o maior perdedor é a Google”, disse à Axios o CEO da Perplexity, Aravind Srinivas.
O que parece ser uma jogada de mestre à primeira vista pode se tornar um tiro no pé em um futuro não tão distante. A web existe hoje em dia graças a milhões de pessoas que dedicaram tempo e recursos, muitas vezes sem obter retorno financeiro, para criar conteúdo e colocá-lo à disposição para qualquer pessoa acessar nas últimas décadas. É o caso da Wikipedia e outros projetos meritórios construídos a milhares de mãos. No fundo, a “raspagem” destas informações, de forma livre e sem obstáculo, para fins de treinamento de modelos permitiu que a própria IA generativa passasse a existir.
Agora, a nova abordagem dos sumários, e mesmo dos prompts trazidos por outras aplicações, pode causar um efeito reverso. “Ao tornar ainda menos convidativa a contribuição dos seres humanos para o acervo coletivo de conhecimento da Web, as respostas resumidas da Google também podem deixar suas próprias ferramentas de IA e as de todos os outros usuários com informações menos precisas, menos oportunas e menos interessantes”, ponderou Rosenberg. Se alguém aí está preocupado com integridade da informação deveria se debruçar um pouco mais sobre este movimento, que ainda não chegou ao Brasil de forma plena.
Comemorações e silêncios
Pensado nisso, o interessante é perceber que o anúncio da Google provocou mais euforia na comunidade global da Internet do que revolta ou manifestações sobre os riscos sistêmicos que esta alteração pode exercer no repositório universal de conhecimento que se tornou a web ao longo de 35 anos. A maior parte da mídia especializada celebrou a notícia como uma inovação e um avanço tecnológico, enquanto organismos internacionais, parte da sociedade civil organizada e da academia que gravitam nos fóruns de governança da Internet silenciaram.
Talvez por um motivo simples: os jovens que nasceram com celulares no bolso e habitando as redes sociais não usam mais esta ferramenta como principal motor de suas pesquisas. “Os adolescentes de hoje – e eu fiz uma pesquisa com uma amostra aleatória – não sabem nem se importam com o que é “a Web”. Eles nasceram com os celulares e as mídias sociais e não veem interesse em revivê-la como um meio de comunicação semi-irônico, como a fita cassete. O utopismo da Web é estritamente um fenômeno de mídia da Geração X”, escreveu Orlowski.
O mais irônico de tudo isso, na verdade, é ver quem diz defender uma Internet livre e aberta dar de ombros no momento em que mais uma de suas camadas está se fechando e silenciando conteúdo original por conta da atuação monopolista de uma empresa que controla quase integralmente este mercado. A alegação é que isso não compromete o “coração” da Internet, que para essas pessoas são as outras duas camadas da rede das redes e que isso é apenas um acomodar de abóboras no campo dos provedores de aplicações. Meia verdade, uma vez que estes mesmos conglomerados se expandiram para o mundo de padrões, protocolos e infraestrutura da web, como já sustentamos nesta Teletime. Onde tudo isso vai parar? Não pergunte ao Google.
[3] 1. Exame da acessibilidade de uma amostra representativa de páginas da Web existentes na última década. Os pesquisadores coletaram páginas do repositório da Web Common Crawl para cada ano de 2013 a 2023 e tentaram acessá-las para determinar quantas ainda estão disponíveis atualmente.
Análise dos links em páginas da Web existentes para ver quantas ainda estão funcionando. Os pesquisadores coletaram uma grande amostra de páginas de sites governamentais, sites de notícias e da Wikipedia. Eles identificaram domínios de notícias relevantes usando dados do comScore, domínios governamentais usando dados do get.gov e páginas da Wikipédia de um arquivo da Wikimedia Foundation. Para cada coleção, eles seguiram os links dessas páginas até seu destino para determinar a parcela de links que apontavam para sites inacessíveis.
Rastreamento da exclusão ou remoção de publicações individuais em sites de mídia social, especificamente tweets públicos na plataforma de mídia social X (ex-Twitter). Os pesquisadores coletaram uma grande amostra de tweets públicos em tempo real usando a API de streaming do Twitter e monitoraram seu status por três meses usando a API de pesquisa do Twitter para determinar quantos ainda estavam disponíveis publicamente.
Lula defende que com este imposto será possível erradicar a mais profunda insegurança alimentar de África.
A reportagem é de Naiara Galarraga Gortázar, publicada por El País, 24-05-2024.
O Brasil, um dos países mais desiguais do mundo, quer aproveitar a sua presidência rotativa do G-20 para propor aos seus parceiros que concordem em impor um imposto mínimo global sobre os mais ricos. Os defensores da iniciativa consideram-na um passo importante para colmatar o fosso crescente entre aqueles que acumulam mais riqueza e os restantes. O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, defendeu-o esta quinta-feira nos seguintes termos após reunião com o seu homólogo do Benin, Patrice Talon: “Se os 3 mil bilionários do planeta pagassem impostos de 2% sobre o retorno das suas fortunas, poderiam ser gerados recursos para alimentar os 340 milhões de pessoas que, segundo a FAO, sofrem de grave insegurança alimentar em África”.
Em fevereiro passado, o seu governo encarregou o economista francês Gabriel Zucman, diretor do Observatório Fiscal da UE, de traduzir a vontade política brasileira numa proposta detalhada a apresentar na reunião dos ministros das finanças do G-20, em julho próximo, em São Paulo. Zucman, que visitou o Brasil esta semana, apresentou na quinta-feira ao Executivo um projeto de imposto. Em todo o mundo, os muito ricos pagam menos impostos do que as classes médias e pobres. Também no Brasil, que possui um sistema tributário extremamente complexo que também pune os pobres e recompensa os acionistas.
Zucman estima que os bilionários paguem impostos de 0,3% sobre sua riqueza, conforme explicou esta terça-feira em reunião com correspondentes no Brasil.
O francês aposta num imposto global para quem possui mais de um bilhão de dólares, o que equivale a cerca de 3 mil pessoas, segundo uma estimativa que ele próprio considera conservadora. Juntos, eles valorizam “cerca de 13 bilhões de dólares, uma média de 5 bilhões cada”. A sua proposta visa um imposto global mínimo de 2% das suas fortunas. Ele considera esta via a mais eficaz dado que “o imposto sobre o rendimento não funciona no caso dos ricos e porque o imposto sobre heranças é cobrado apenas uma vez”.
O economista calcula que com esta taxa mínima conseguiriam arrecadar cerca de 250 mil milhões de dólares. Os países de residência desses bilionários receberiam o dinheiro que correspondesse a cada um e decidiriam como gastá-lo, disse. Os ultrarricos estão espalhados por quase todo o planeta. Estima-se que cerca de 800 estejam nos Estados Unidos, 800 no Sudeste Asiático, cerca de 500 na Europa, mais de 100 na América Latina…
Embora este seja um debate apenas iniciado, a recepção obtida até agora permite o economista, discípulo de Thomas Piketty, ser otimista: “Basicamente, estamos vendo um verdadeiro impulso, com vários países a expressarem o seu apoio. Brasil, claro, mas também França, África do Sul, Espanha, Colômbia e Bélgica. “É impressionante”, enfatiza. “O G-20 é um fórum poderoso para avançar”, acrescenta.
O francês considera o presidente americano, Joe Biden, um aliado valioso neste esforço para tributar aqueles que estão no topo da pirâmide da riqueza global, mas admite que uma vitória do magnata Donald Trump nas eleições de novembro seria um grande revés. Nesse caso, disse ele, “não espero que os Estados Unidos liderem este debate”.
Em todo o caso, afirma que, para prosperar, uma iniciativa como esta precisa de enraizar-se num grupo considerável de países, mas o seu sucesso, insiste, não está condicionado à adesão de todos. Ele considera que esta proposta pode começar de forma viável se for adotada por 30 ou 50 países.
Este novo imposto inspira-se no imposto mínimo global de 15% sobre as grandes multinacionais proposto pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e acordado por cerca de 140 países, 35 dos quais já começaram a aplicá-lo, destacou Zucman. Se o imposto sobre os bilionários se tornar realidade, segundo ele, esse seleto grupo “vai pagar mais do que é arrecadado de 15% das multinacionais”.
Até o momento, votou apenas o relator do caso, ministro Villas Bôas Cueva, pela legalidade da cobrança.
Da Redação
Nesta terça-feira, 4, ministra Nancy Andrighi, do STJ, pediu vista e suspendeu julgamento de processo que analisa a validade de tarifa bancária no recolhimento e repasse de contribuições sindicais.
O caso, pautado na 3ª turma da Corte, teve até o momento apenas o voto do relator, ministro Villas Bôas Cueva, que se posicionou pela legalidade da cobrança.
Entenda
O recurso busca definir a legalidade da cobrança de tarifa bancária pela Caixa Econômica Federal em transações de valores provenientes da arrecadação de contribuição sindical. Na instância inicial, o acórdão estadual julgou improcedente o pedido que visava impedir a Caixa de cobrar essas tarifas.
Ministro Villas Bôas Cueva, relator do caso, explicou que, conforme os arts. 586 e 589 da CLT, cabe à Caixa Econômica Federal a responsabilidade pela arrecadação, processamento e repasse das contribuições sindicais às confederações, federações e sindicatos. S. Exa. acrescentou que a cobrança da tarifa bancária não viola o art. 609 da CLT, pois não possui natureza tributária, limitando-se à remuneração pelo serviço contratual previsto e prestado.
O ministro também observou que as tarifas relativas a serviços prestados a pessoas jurídicas não são padronizadas, podendo ser livremente cobradas pelas instituições financeiras, desde que contratualmente previstas ou previamente autorizadas ou solicitadas pelo cliente ou usuário.
No caso em análise, S. Exa. entendeu que se trata de uma situação em que a instituição financeira exige o pagamento de uma tarifa contratualmente prevista decorrente do serviço prestado. Por esses motivos, o ministro negou provimento ao recurso.
Em seguida, a ministra Nancy Andrighi pediu vista dos autos, suspendendo assim o julgamento.
O Direito ao Trabalho é um direito social e fundamental. Tal direito, de segunda geração, se firma nas Cartas Sociais após o reconhecimento dos direitos civis e políticos, originários das grandes revoluções e objetivo primeiro delas. Todo direito fundamental volta-se contra o Estado e contra os particulares. Àquele primeiro deve assegurar o pleno exercício do Direito ao Trabalho, impondo-se assim, uma ordem positiva, qual seja, a obrigação de fornecer serviços e meios para viabilizar o exercício do direito; e outra, de ordem negativa, que se traduz nas obrigações de não violar o exercício daqueles direitos.
Tais normas, devem ser interpretadas em consonância, ainda, com os Tratados e Normas Internacionais que o Brasil subscreveu, sendo imprescindível que se tenha em mente que as normas Constitucionais constituem uma obrigação ao Estado, vinculando todos os seus Poderes. Nesse gizar, todos na sociedade terão que respeitar, nas suas ações e omissões, limites para o exercício do seu direito, viabilizando, assim, que cada qual, possa usufruir da liberdade que tem de trabalhar. A violação desse direito, acarretará consequências que irão variar de acordo com a lei interna de cada Estado, assim como das normas internas e internacionais que o tutelam
Elementar se fez o nascimento da intervenção estatal, para que se assegurasse direitos mínimos e a dignidade do trabalhador. Novos tempos surgem com as revoluções industriais — cada uma a seu turno, ratificando a necessidade de acautelamento daquele que, em tese, era a parte mais frágil das relações. O Direito do Trabalho, então, formou-se voltando para proteção do trabalhador, com objetivo de assegurar o desnível entre o devedor e o credor do trabalho e, consequentemente, a melhoria da situação do trabalhador, pretendendo atingir sempre, um número cada vez maior de trabalhadores a serem tutelados.
Esta realidade também foi a inspiradora da positivação nacional acerca da matéria, e é nela que está fundada a CLT. Isto é, volta-se para a proteção do empregado estritamente subordinado, garantindo-lhe um mínimo de direitos. A intervenção Estatal é percebida, não só nas normas jurídicas postas, mas também nos diversos julgados cuja solução de controvérsias se dá com fundamento na aplicação do princípio protetivo. Sendo assim, o Estado, em todas as suas instâncias, preocupa-se com a situação forjada em um cenário de desigualdade entre as partes, que forma a relação contratual trabalhista, tentando, através destas linhas cogentes, amenizar a tal dita desigualdade pelos instrumentos e meios que possui para manter o equilíbrio.
Todavia, as diversas transformações (sociais e econômicas), causaram uma fratura naquele sistema originalmente destinado a relações contratuais estritamente subordinadas. Hoje, é preciso reconhecer que nem todas as relações de trabalho são subordinadas e (não necessariamente) se encaixam naqueles vetustos moldes celetistas. Ao mesmo tempo que o Direito do Trabalho, em seu nascimento e primeiras linhas, alcançou o mérito de atenuar a debilidade do trabalhador, a universalização de metas e a progressividade da sociedade, acabou por se voltar contra a sua própria ciência. Em outras palavras, o texto destinado aos trabalhadores, por vezes, os engessa.
Fratura
É incontestável que o Direito do Trabalho sofreu uma fratura no decorrer de sua história. Seu nascimento se deu em torno do trabalho estritamente subordinado, numa época em que as relações eram absolutamente desiguais, e que de fato, o empregador era o detentor de todos os meios de produção, o senhor do posto de trabalho. Ocorre, que os tempos são outros. Nem todas as relações se encaixam naquele padrão restrito, apregoado pelos dispositivos que ensinam quem será empregado e quem será empregador. É preciso considerar que as relações podem ser exclusivamente de prestações de serviços, com ampla liberdade de tratativas, frente ao eventual — e possível — equilíbrio entre os contratantes. O mundo mudou.
Necessário e urgente recordar que antes do Direito do Trabalho, chancelado pelo artigo 7º da Carta Republicana, àquele que garante catatau de direitos aos empregados, existe o Direito ao Trabalho, assegurado no artigo 6º daquela mesma Carta bem como nos convênios internacionais de garantia a direitos fundamentais subscritos pelo Brasil. Este, que pela ordem numeral e lógica, vem primeiro, vez que direito fundamental que é, possuindo guarida no artigo 6º, dado que além de coroar a fundamentalidade que é a realização de todo e qualquer ofício, reafirma que o Estado garante que este seja feito de forma socialmente livre, substrato garantido pelos princípios brasileiros, notoriamente encontrados no artigo 1º da Carta Constitucional.
Diante de uma realidade em que o trabalho é realizado em todo e qualquer lugar, onde a tecnologia prepondera, não se pode considerar, de plano, que as relações se tratam, exclusivamente, daquela subordinação existente na CLT. É preciso reconhecer e observar a crise naquele modelo onde apenas uma das partes estabelecia “vontades”, em que apenas uma das faces poderia “direcionar” o negócio. Nem sempre é sobre subordinação, as vezes trata-se de acordo de vontades, previamente ajustada e, definitivamente, anuída — por qualquer razão que seja. Trocando em miúdos, o modo de se determinar a forma como o trabalho será desenvolvido, não segue mais os padrões originais.
Outrossim, não nos parece, que a Carta Constitucional tenha falhado naquilo que pretendeu tutelar. O que não se quer é permitir, é que com apoio no texto constitucional, se pense que tudo será decidido e regulado. Essa não é a missão da Constituição, tampouco facultar ao intérprete, ante a inércia legislativa, a possibilidade de regulamentar, questões que as normas não fazem. Ou pior: aceitar que quem interpreta o direito posto, aplique a Constituição para solucionar tudo como papel, “valendo-se” das tintas utilizados no texto constitucional para solucionar questões negociais ou fatuais ao seu modo, sob a cortina de fumaça que em tese, responde o caso concreto. O juiz tem por limite a lei.
A Constituição não o legitima a criá-la. O sistema legislativo atual é ineficiente e não cumpre os postulados Constitucionais, não garante a dignidade do trabalhador, muito menos permite que se cumpra com o objetivo dos valores sociais do trabalho. É chegada a hora de se conceder ao trabalhador mais do que a garantia do registro em sua CTPS e do pagamento de horas extras, férias e 13º salário. Faz-se urgente que se dê garantias efetivas de seus direitos sociais mínimos, quais sejam: educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (artigo 6º CRFB).
Portanto, enquanto não houver a quebra de barreiras e o reconhecimento da necessária expansão normativa do trabalho, entenda: para além da relação de emprego, haverá vazio legislativo, haja vista a flagrante realidade de que as normas trabalhistas infraconstitucionais são insuficientes a complementar o conteúdo da própria Constituição, quiçá como linhas cogentes para regulamentação de relações outras, fato que, infelizmente, acaba por tornar a tão almejada proteção, carente de tutela eficaz.
é pós-doutora e doutora pela Universidad Castilla La-Mancha (campus Albacete/Espanha). Doutora pela PUC-SP. Acadêmica titular da Cadeira 43 da ABDT. Juíza do Trabalho (TRT-SP). Membro da Academia Iberoamericana de Direito do Trabalho e Seguridade Social. Professora colaboradora da Universitat Oberta de Catalunya. Professora visitante na Faculdade de Direito de Milão no programa de doutorado. Professora visitante na PUC-RS e professora convidada na PUC-SP. Membro da Asociación Española de Derecho del Trabajo y de la Seguridad Social.
é doutoranda e mestre em Direito pela PUC-RS, bolsista Capes. Especialista em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Escola Superior Verbo Jurídico Educacional. Professora na pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho e da Pós-graduação em Direito Previdenciário da PUC-RS. Professora no Programa de Graduação em Direito nas Faculdades Integradas São Judas Tadeu. Advogada.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal formou maioria, nesta terça-feira (4/6), para confirmar a suspensão, por 60 dias, da decisão liminar que barrou a desoneração da folha de pagamento de 17 setores produtivos. A sessão virtual que analisa o caso termina oficialmente às 23h59.
Em maio, Zanin suspendeu decisão anterior e deu tempo para Executivo e Congresso negociarem
A suspensão em questão foi estabelecida pelo ministro Cristiano Zanin no último mês de maio. Caso não haja uma solução entre Executivo em Congresso em até 60 dias, a desoneração voltará a ser suspensa.
Zanin atendeu a uma solicitação da Advocacia-Geral da União para que os efeitos da sua decisão original fossem suspensos. Inicialmente, a própria AGU havia pedido a suspensão de trechos da lei que prorrogou a desoneração.
A União disse ter voltado atrás após tratativas com o Legislativo para encontrar uma solução definitiva sobre a desoneração. O Congresso se manifestou de forma favorável à solicitação da AGU.
“Os Poderes envolvidos relatam engajamento no diálogo interinstitucional para que sejam tomadas as providências necessárias”, diz o voto do relator, Zanin, que repetiu os termos da sua última decisão.
Até o momento, ele foi acompanhado por Flávio Dino, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso e Luiz Edson Fachin.
Histórico
No fim de 2023, com o objetivo de equilibrar as contas públicas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) editou a Medida Provisória 1.202/2023. O texto previa a retomada gradual da carga tributária sobre a folha de pagamento de 17 setores econômicos e a limitação das compensações tributárias decorrentes de decisões judiciais, além da volta da tributação sobre o setor de eventos.
Na sequência, o Congresso aprovou a Lei 14.784/2023, que, além de prorrogar a desoneração da folha desses setores, diminuiu para 8% a alíquota da contribuição previdenciária incidente sobre a folha de pagamento dos municípios. A ação questionava dispositivos dessa norma.
Em abril, Zanin decidiu que a lei não atendeu uma condição estabelecida na Constituição: para a criação de despesa obrigatória, é necessária a avaliação do seu impacto orçamentário e financeiro.
O relator afirmou ainda que a manutenção da norma poderia gerar desajuste significativo nas contas públicas e um esvaziamento do regime fiscal. A suspensão buscava preservar as contas públicas e a sustentabilidade orçamentária.
Já em maio, após o governo federal e o Congresso informarem o início das negociações sobre a desoneração, o ministro suspendeu os efeitos da sua primeira decisão.