O projeto que isenta o pagamento de Imposto de Renda para quem recebe dois salários mínimos (R$ 2.824,00) vai beneficiar 15,8 milhões de brasileiros, segundo dados do Ministério da Fazenda. São empregados, aposentados e pensionistas que já terão o benefício na declaração do imposto de 2015.
Aprovada nesta quarta-feira (17) no Senado e encaminhada à sanção presidencial, a matéria tem o mesmo teor da medida provisória enviada pelo governo.
O texto do líder do governo na Câmara, deputado Jose Guimarães (PT-CE), foi relatado pelo líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP).
“O objetivo da proposição é parear a incidência tributária com a política de valorização do salário mínimo e, assim, evitar sua desidratação. O propósito, frise-se, não é instaurar um debate amplo sobre os ajustes que se fazem necessários para tornar o imposto de renda mais adequado à expectativa da população brasileira e de seus representantes”, disse o relator.
Randolfe destacou ainda que a última correção(5,6%) foi feita, em 2015, no governo da presidente Filma Rousseff.
“Eem 2016, 2017, 2018, 2019, 2020, 2021 e 2022, a correção da tabela do Imposto de Renda, para quem recebe salário mínimo, foi de zero. É isso, nada, não teve correção. Em 2023, primeiro ano do governo do presidente Lula, a correção foi de 10,93%; e, agora, de 5,97%, assim quase se igualando à maior correção de 2002”, explicou.
O líder diz que o governo está iniciando uma política de recuperação do poder aquisitivo do imposto. “Tem muito significado diagnóstico esta tabela aqui sobre o histórico da correção da tabela”, afirmou.
Uma emenda do senador Carlos Viana (Podemos-MG) propôs ampliar a faixa para quem recebe até três salários mínimos e ouviu do líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA), que o governo vai cumprir sua promessa de isentar quem recebe até R$ 5 mil.
“Temos ainda dois anos e nove meses até o final do governo e dois anos fiscais pela frente em que ele poderá fazer a chegada até lá. Nós já temos seis anos sem correção de nada na tabela do Imposto de Renda. Se ela viesse sendo corrigida ano a ano, seguramente a gente já estaria em outra situação”, lembra Wagner.
O senador Humberto Costa (PT-PE) disse que o compromisso do governo era isentar até R$ 5 mil durante o governo e não no primeiro ou segundo ano.
“Se nós formos olhar aonde nós vamos chegar com essa proposição, nós deveremos atingir uma isenção do Imposto de Renda para pessoas que recebem até R$ 2.824; está mais perto dos R$ 5 mil do que já se esteve antes, e nós vamos atingi-los. Com certeza, no ano que vem, teremos um aumento ainda maior, e essa proposição vai ser obtida”, argumentou.
O ministro do STF participou da sessão no Senado de apresentação do anteprojeto de reforma do Código Civil elaborado por uma comissão formada por 38 juristas
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes defendeu no Senado, durante a apresentação do anteprojeto de reforma do Código Civil, a regulamentação das redes sociais.
“Vossa Excelência lembrou que na virada do século não existiam redes sociais. Nós já éramos felizes e não sabíamos. A necessidade da regulamentação de novas modalidades contratuais que surgiram, a questão de costumes, novas relações familiares, novas modalidades de se tratar nas questões do direito de família e sucessões, a tecnologia, a inteligência artificial, novas formas de responsabilidade civil. Isso é importantíssimo”, alertou o ministro.
Sobre o anteprojeto, elaborado por 38 juristas, Moraes disse que quanto mais moderno e simplificado for o Código Civil menos litígios surgirão e menos problemas sociais.
Considerado uma espécie de “constituição do cidadão comum”, o código civil foi revisado pela comissão de juristas que realizaram um trabalho de oito meses. Eles se debruçaram sobre mais de mil artigos no atual código, que é de 2002.
O código regula a vida do cidadão desde antes do nascimento e tem efeitos até depois da morte do indivíduo, passando pelo casamento, regulação de empresas e contratos, além de regras de sucessão e herança.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), lembrou que na virada do século não existiam redes sociais.
“Diversos direitos não haviam sido institucionalizados. Os arranjos familiares oficialmente aceitos eram bastante restritos. Posso dizer sem exageros que ganhamos uma bússola. Parlamentares vão trazer muitas contribuições ao texto, aprimorando, alargando, eventualmente restringindo seu alcance. Mas o fato é que a peça produzida por esta comissão de juristas é o alicerce a partir do qual as paredes de um Código Civil atual e moderno serão edificadas”, avaliou Pacheco.
O presidente da comissão de juristas, Luis Felipe Salomão, que e ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), disse que as inovações propostas são um ponto de partida para o trabalho dos parlamentares.
“Essa comissão criou uma interação para que pudéssemos trazer ao Senado todos os avanços técnicos jurídicos que nós conseguimos obter, seja pelo consenso da doutrina, seja pelos avanços da jurisprudência, seja pelos enunciados em jornadas que foram realizadas ao longo desse tempo. Tudo isso foi consolidado nesse texto, mercê do talento dos juristas que aqui hoje participam dessa entrega simbólica, mas, ao mesmo tempo, muito carregada de conteúdo que nós apresentamos ao eminente presidente”, disse o ministro do STJ.
Antes da sessão nesta quarta-feira (17), Moraes esteve reunido com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira. A oposição naquela Casa quer instalar uma CPI para apurar supostos abusos do judiciário.
A Câmara dos Deputados anunciou que vai retomar a discussão sobre o PL 2630, de 2020, sobre a regulação das plataformas digitais. Nos últimos dias, um intenso debate tomou conta das redes sociais entre os que defendem e os que rejeitam a ideia de controlar os conteúdos que circulam na rede, na esteira do debate entre o STF e o Elon Musk.
São muitas opiniões, mas na verdade pouca gente sabe de fato o que está falando e entende exatamente o que está por trás dessa discussão.
A antropóloga Letícia Cesarino diz que um dos fenômenos da internet é que todo mundo virou especialista e que o termo autoridade se tornou extremamente relativizado no mundo online.
Porém, opiniões à parte, nada substituiu um estudo sério sobre o assunto, de quem realmente leu, pesquisou, coletou e comparou dados para entender por que as redes sociais são acusadas de estarem fora da lei.
Para discutir se isso é verdade, eu corri atrás da Pietra Vaz, uma jovem escritora e experiente pesquisadora, que escreveu um livro sobre o também jovem tema da regulação da internet.
E a minha primeira questão foi: por que escrever um livro que discute o que é discutido na internet?
“Meu livro se chama “Irregulável mundo novo, a regulação de big techs em infosfera”, e nele eu trato da necessidade de regulação das grandes plataformas digitais, com base nas perspectivas da filosofia da informação e da ciência da legislação, que pode ser chamado de legística ou de jurisprudência. O livro tem origem na minha pesquisa de mestrado da Universidade Federal de Minas Gerais, e a ideia surgiu da constatação que nos utilizamos ferramentas das empresas gigantes de tecnologia todos os dias, mesmo sem perceber. Então nossos dados estão circulando, mas nós só conhecemos a sua superfície, elas são opacas, elas não são transparentes. Então cabe a gente falar sobre várias questões, como conseguir uma regulação que garanta a autonomia do ser humano sobre a tecnologia digital, a ciência da legislação atual é suficiente para cumprir com um desafio tão grande. E qual o papel da filosofia da informação junto ao legislador que vai enfrentar esse desafio da regulação. Essas são algumas das questões que eu trabalho ao longo do livro.”
Olhando de fora, regular as plataformas digitais para ser um desafio como outro qualquer, como discutir se vamos ou não aceitar jogos de azar no Brasil ou se vamos aprovar uma nova data no calendário comemorativo. No entanto, essas plataformas estão em todas as áreas e, além disso, elas armazenam os nossos dados, da saúde do SUS até os e-mails das nossas universidades federais, num processo lento de ocupação dos mais diversos setores da economia. Ou seja, a isso chamamos plataformização. A pergunta é: por que é importante discutir o que conteúdo que circula nas redes e porque ele é uma forma de poder?
Já somos mais de 5 bilhões de pessoas ao redor do mundo que estão penduradas nessas plataformas ou redes sociais, alimentando diariamente sua história e suas vidas com postagens e interação de todos os tipos. Eu arrisco dizer que o tempo dedicado online é maior do que o tempo que levamos para viver, dormir, comer. Nosso avatar digital, ou gêmeo digital, como diz Lúcia Santaella, pode ter mais vida do que nossa existência física, e essas camadas trazem implicações ainda imprevisíveis sobre a vida no planeta e as relações entre as pessoas, nos ensina Pietra Vaz.
“As redes sociais formam uma nova camada da realidade, em que as pessoas podem se expressar de diversas formas. Acontece que, já há alguns anos, tem ganhado espaço nas mídias uma série de fenômenos nocivos para a experiência em rede, como a desinformação, o negacionismo, a polarização e a radicalização, a vivência em bolhas, o extrativismo de dados e a utilização desses dados às margens das leis por parte das grandes plataformas, enfim, entre inúmeros outros problemas. Ao mesmo tempo, a internet nunca foi tão relevante, sendo essencial para relações de trabalho, consumo, lazer, saúde, gestão pública e privada de diversos negócios. Então ela abarca todo um plano de existência que já é essencial para a vida contemporânea. Então, talvez, justamente por essa essencialidade, exista uma discussão tão potente e radical quando a gente fala em regulação e moderação de plataformas, porque elas constituem um novo terreno em que a vida se desenrola; ela é a concretização do misto entre o analógico e o digital, e por isso virou também uma arena de disputa de narrativas e de discursos.”
Pegando como gancho essa disputa de discurso, onde é que mora a verdade, quando a gente contrapõe esses conceitos abstratos de liberdade de expressão e de censura? Como sair desse impasse em que as versões predominam mais do que os fatos em si, a chamada pós-verdade?
Eu acredito que existe uma âncora para gente navegar neste mar de incertezas e de dúvidas. Como saber o que é verdade e que não é verdade? Talvez, se a gente ajustar para o que é permitido e o que não é permitido, a interpretação fica mais fácil, não acha? Por exemplo, muito do que a gente vê na rede não tem nada a ver com liberdade de expressão. Tem a ver com crime. É crime mesmo, dos mais banais, como ofensa, até os mais intoleráveis, como apologia à violência ou atentado à vida.
Então, será que liberdade de expressão tem sido usado como um escudo para se ferir as leis brasileiras, e por isso a gente precisa discutir como regular essas mídias, com base nas nossas leis e nossos costumes, como nos ensina Pietra Vaz?
“A regulação das plataformas, especialmente das mídias sociais, é um desafio muito grande porque elas possuem natureza global. Como é que a gente vai criar uma solução que seja também global, que coexista com as várias incongruências que a gente tem de um regulamento para outro, de um ordenamento para outro? Porque, né, existem diversos ordenamentos diferentes ao redor do mundo.
Por exemplo, aqui no Brasil, a nossa perspectiva de liberdade de expressão, prevista constitucionalmente, tem limitações que em outros países podem não existir — não existem nos Estados Unidos, por exemplo — gerando um conflito, então, entre o que é permitido e o que é proibido aqui e lá fora. Então aqui no Brasil a nossa tolerância para o discurso de ódio é muito menor, mas isso não significa que exista censura, por isso o estabelecimento de limites à expressão na internet aos moldes do que a gente tem na vida analógica também não é censura, não implica essa existência. Então é muito importante que a gente não importe definições e conceitos de outros ordenamentos jurídicos por mera imposição dessas plataformas. É essencial que a gente tenha as nossas próprias leis como base para a nossa regulação, que seja soberana e cidadã.”
Como essas plataformas digitais são estrangeiras, a maior parte dos Estados Unidos, esse conceito de soberania atualmente também está um pouco relativo. O que parece inevitável é que essa regulação aconteça, caso contrário, as leis do país terão que ser alteradas para se adaptar às regras mais liberais da internet. A coexistência de uma mídia com salvo conduto para descumprir as leis brasileiras, como a calúnia, ofensa e difamação, que acontece por meio de desinformação e notícias falsas, não me parece ser um cenário compatível com a democracia.
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AUTORIA
BETH VELOSO Doutoranda pela Universidade do Minho, em Portugal, e mestre em Políticas de Comunicações pela University of Westminster, na Inglaterra. É jornalista e atua como consultora legislativa da Câmara, nas áreas de Comunicação, Informática, Telecomunicações e Ciências da Comunicação. Tem especial interesse nos temas de regulação da internet, capitalismo digital e capitalismo de vigilância.
Em retaliação ao Supremo Tribunal Federal (STF), o Senado aprovou, na última terça-feira (17), a PEC apresentada pela oposição que inclui a criminalização expressa das drogas no artigo 5º da Constituição, trecho destinado à definição das liberdades individuais. A proposta, de acordo com especialistas, pode resultar na piora dos índices de criminalidade tanto por ação de facções criminosas quanto por truculência policial.
A proposta foi uma resposta direta ao Senado ao julgamento que ocorre no STF, onde se discute a descriminalização do porte da maconha, e que caminha na direção de permitir ao usuário carregar até 10g consigo. A oposição na Casa considerou a possibilidade como uma afronta ao Poder Legislativo, tese que foi abraçada pelo presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
De acordo com o advogado Gabriel Sampaio, diretor de Litigância e Incidência da ONG Conectas Direitos Humanos, a proposta, agora enviada à Câmara dos Deputados, representa um sério risco em especial para a população negra e periférica. “Ela é grave justamente porque essa criminalização, na forma do Art. 5º, está estigmatizando a população usuária, está trazendo à porta de entrada do sistema de justiça criminal pessoas que merecem a atenção da saúde pública”, apontou.
O especialista ressalta que a PEC pode agravar um dos problemas resultantes da Lei de Drogas de 2006, tema da ação que corre no Supremo. “A PEC preserva a adoção de aspectos muito subjetivos para diferenciar a pessoa usuária da pessoa traficante. A experiência demonstrou, pelo retrato do sistema penitenciário, que os mais afetados por essa subjetividade são as pessoas pobres e periféricas, que acabam sempre sendo consideradas como envolvidas em uma atuação criminal mais grave e classificadas como traficantes”.
A proposta também preocupa o líder do governo na Comissão de Segurança Pública na Câmara dos Deputados, Henrique Vieira (Psol-RJ). Ele chama atenção para o impacto da criminalização das drogas sobre o sistema prisional. “A proibição, hoje, é o principal dispositivo jurídico e policial para provocar o encarceramento em massa e a letalidade”. O encarceramento em larga escala acaba por beneficiar facções criminosas como PCC e Comando Vermelho, que utilizam a precariedade dos presídios como instrumento de obtenção de novos membros em troca de amparo.
O parlamentar acrescenta que não há contrapartida em termos de efeitos no atual modelo de proibição de drogas. “É uma política hipócrita: você não diminui o uso abusivo, não amplia a rede de atenção psicossocial para socorrer e ajudar essas pessoas e a execução se dá no varejo, com ações policiais acontecendo nas favelas enquanto o mercado internacional bilionário que envolve evasão de divisas, lavagem de dinheiro e tráfico de armas fica intocado”, alertou.
Gabriel Sampaio também destacou esse aspecto da criminalização das drogas. “A guerra às drogas retira um tempo precioso e recursos preciosos da atuação das forças policiais e do sistema de justiça criminal, que poderiam ser utilizados para enfrentar o grande tráfico, para lidar com as facções criminosas”.
De acordo com o Ministério da Justiça, até o final de 2023, cerca de 193 mil pessoas se encontravam presas por tráfico de drogas ou por associação ao tráfico, descartados os envolvidos em tráfico internacional de drogas. Esse número representa 29% de toda a população prisional brasileira.
Outra possível consequência da constitucionalização da criminalização de drogas que preocupa o jurista Gabriel Sampaio é o risco de piora nos índices de violência cometida por policiais. “Por meio da Constituição, se está reforçando até uma obrigação aos agentes públicos, às forças policiais, em ter que abordar a pessoa usuária e levar ao sistema de justiça criminal. Acaba sendo uma resposta nada inteligente, vai ocupar os agentes da polícia e do Judiciário para tratar de um problema que seria muito melhor resolvido pela saúde pública”.
Experiência internacional
De acordo com e consultor em segurança pública e pós-doutor em sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul Marcos Rolim, a constitucionalização da proibição das drogas segue na contramão da experiência internacional sobre o tema, em especial ao se tratar da maconha, que segue em processo de legalização em diversos países do mundo.
Ele ressalta que a política de guerra às drogas começou nos Estados Unidos, onde diversos estados já abriram mão dessa abordagem justamente para resolver o problema da superlotação de presídios. “Cada vez mais, o esforço de boa parte dos estados americanos é direcionado à redução do número de presos. A simples legalização da maconha em estados como Califórnia e Colorado significou um conjunto muito amplo de pessoas libertadas, até então condenadas pelo posse da maconha”, relatou.
Essa legalização, de acordo com o professor, não afetou os índices de criminalidade, que permaneceram os mesmos de antes. Houve melhora, porém, em outros aspectos socioeconômicos. “Se observou, por exemplo, o aumento na receita desses estados, que passaram a arrecadar com a tributação sobre a cannabis e seus derivados”.
Metade dos estados americanos, incluindo alguns dos mais desenvolvidos como Califórnia, Massachusetts e Nova York já legalizaram o uso recreativo da cannabis. O porte também é permitido no Canadá, Uruguai, Países Baixos e outros países da União Europeia. O caso mais recente foi na Alemanha, que aprovou a legalização do porte de até 25g de maconha no início de abril.
AUTORIA
LUCAS NEIVA Repórter. Jornalista formado pelo UniCeub, foi repórter da edição impressa do Jornal de Brasília, onde atuou na editoria de Cidades.
Arthur Lira deixa a presidência da Câmara em fevereiro. Faltam nove meses. Até lá, vai assistir o poder escapando das suas mãos. Enquanto estiver no cargo, porém, pode perturbar muito aqueles que, em sua avaliação, atrapalham seu caminho rumo à planície e, especialmente, a condução do processo de escolha do sucessor. Os últimos dias mostraram que a lista de eventuais adversários pode ser extensa: inclui o presidente da República e alguns de seus auxiliares, além de ministros do Supremo. O deputado mostrou que faz política com o fígado.
Depois de qualificar o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) como desafeto, Lira ameaçou levar à votação em plenário projetos com potencial desastroso para o governo e, também, tirar da gaveta oito pedidos de CPI, algumas passíveis de causar confusão com o Judiciário — mais exatamente, STF e TSE. Até os aliados se surpreenderam com o que julgam ser exageros. Especialmente, porque uma das razões da fúria calculada do deputado foi a demissão de um primo da superintendência do Incra em Alagoas. Para amigos de Lira, ele se está se esforçando na reta final para sair menor do que entrou na presidência da Câmara.
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, também cuida de seus interesses. A Comissão de Comissão e Justiça do Senado aprovou projeto dele que recria os quinquênios para juízes e promotores. O benefício pode ser estendido a outras categorias, como delegados, integrantes da AGU — inclusive nos estados —, além de aposentados e pensionistas. Se a PEC vingar (no plenário da Casa e na Câmara), pode representar uma despesa adicional de R$ 42 bilhões para o governo, diz a Fazenda. Na véspera, o senador, que mira o governo de Minas em 2026, conseguiu aprovar outro de seus projetos, a criminalização do porte de droga, em qualquer circunstância. Apesar da fama de conciliador, articulou e levou à votação o projeto que acaba com decisões monocráticas nos tribunais superiores, fonte de atrito com o Supremo.
Ministros do STF se movimentaram nesta semana para tentar uma trégua na atribulada e desarmônica relação entre os Poderes. Alguns jantaram com Lula. O presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, conversou com Lira e deve ter encontro com Pacheco. Alexandre de Moraes fez visita ao Senado. Lula, do exterior, mandou auxiliares dizerem a Lira e a Pacheco que precisam conversar.
A disputa entre os Poderes — e internamente em cada um deles — mostra que falta algo na República, que está disfuncional. A coordenação política do governo tem falhado, e Lula não parece mais ter o poder de reduzir tensões, como em seus governos anteriores. Até aqui, ele vinha se apoiando em boas notícias na economia e em índices de popularidade bastante razoáveis. Ainda tem trunfos para exibir, mas o clima é de desorganização. Falta muito para 2026. O tempo da política, porém, nem sempre é o do calendário.
AUTORIA
LYDIA MEDEIROS Jornalista formada pela Universidade de Brasília, foi titular da coluna Poder em Jogo, em O Globo (2017-2018). Atuou ainda em veículos como O Globo, Folha de S.Paulo, Época e Correio Braziliense. Foi diretora da FSB Comunicações, onde coordenou o atendimento a corporações e atuou na definição de políticas de comunicação e gestão de imagem.
Nesta segunda-feira, 15 de abril, o governo encaminhou a proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o ano de 2025. A LDO estabelece as metas e prioridades da administração pública federal, o que norteará a elaboração e execução da Lei Orçamentária Anual (LOA) referente ao próximo ano.
A proposta da LDO apresentada pelo Executivo ainda será enviada à Comissão Mista de Planos, Orçamento Público e Fiscalização (CMO) e, após análise e alterações, será encaminhado para votação no plenário do Congresso Nacional. A proposta deve ser aprovada até o dia 17 de julho, ou seja, antes do recesso parlamentar.
A proposta do Executivo estima “déficit zero”, seguindo a linha adotada pela ala econômica do governo de manter o equilíbrio entre receitas e despesas. Esse tem sido um desafio do governo, considerando que há uma tendência do Congresso de modificar a preferência original do governo, privilegiando a disponibilidade de recursos para emendas parlamentares, sobretudo as impositivas, aquelas que têm que ser pagas pelo Executivo, o que pode impactar em recursos para projetos prioritários para o governo.
Desde 2011, o Legislativo tem avançado sobre o orçamento por meio do incremento gradual dos recursos destinados para emendas parlamentares, bem como das alterações legais que levaram à aprovação da impositividade das emendas individuais e de bancada, bem como da aprovação das transferências especiais (conhecidas como Emendas Pix) e do uso indiscriminado das emendas do relator-geral de 2020 a 2022.
Diante disso, os senadores e deputados federais têm pressionado, desde o ano passado, pelo estabelecimento de um calendário de pagamento de emendas. No ano passado, o Congresso chegou a apresentar um calendário de pagamento de emendas, mas foi vetado pelo Executivo. O Executivo, no entanto, voltou atrás e oficializou um cronograma de pagamento de emendas individuais e de bancada para o ano de 2024.
Para o ano de 2025, serão R$ 39,6 bilhões para emendas parlamentares impositivas. Em 2024, foram destinados R$ 33,3 bilhões para essas emendas e, em 2023, foram R$ 26,2 bilhões. Ou seja, as emendas impositivas têm tido um avanço significativo sobre o orçamento, desde a definição das diretrizes orçamentárias, o que limita o espaço do governo de utilizar recursos orçamentários para financiar diretamente as políticas prioritárias do governo, definidas no Plano Plurianual (PPA).
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Uma estratégia para tornar mais eficiente o processo de execução das emendas é a tentativa do Executivo de priorizar as emendas parlamentares destinadas a projetos em andamento, conforme a exposição de motivos apresentada pelo presidente da República e previstas no art. 76 da PLDO de 2025. Outros regramentos relativos à destinação e execução das transferências voluntárias especiais foram, recentemente, estabelecidos pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
Em 2025, embora não seja um ano de eleição, é fundamental para os parlamentares assegurarem recursos para suas bases políticas. Nesse contexto, cabe ao Executivo, por meio da sua articulação junto ao Congresso, buscar destinar emendas e priorizar aquelas que fortaleçam a agenda do governo e, ao mesmo tempo, agradam aos interesses individuais e partidários no Legislativo. Não é uma tarefa fácil, sobretudo, quando se trata de recursos para atender os parlamentares dentro de um orçamento que busca déficit zero.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
AUTORIA
COLETIVO LEGIS-ATIVO Projeto do Movimento Voto Consciente que reúne voluntariamente 20 cientistas políticos, em paridade absoluta de gênero espalhados por todas as regiões do país. As ações do coletivo envolvem a produção de textos analíticos e a apresentação, em parceria com organizações diversas, de podcasts.