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Trabalhando de pé o dia inteiro: Isso está correto?

Trabalhando de pé o dia inteiro: Isso está correto?

Ricardo Nakahashi

Muitos trabalhadores enfrentam jornadas longas em que precisam ficar em pé durante todo o expediente. Isso é comum em várias profissões, como atendentes de balcão etc.

Muitos trabalhadores enfrentam jornadas longas em que precisam ficar em pé durante todo o expediente. Isso é comum em várias profissões, como atendentes de balcão, vendedores em lojas, operadores de caixa, médicos, enfermeiros, entre outros. No entanto, a pergunta que fica é: trabalhar de pé o dia inteiro é correto? E mais importante: quais são os direitos do trabalhador nessas condições?

Neste artigo, vamos explorar os impactos de trabalhar de pé o dia inteiro, os direitos dos trabalhadores nessas condições e o que a legislação diz sobre o assunto. Fique atento para entender como garantir seu bem-estar no ambiente de trabalho!

Quais os efeitos de trabalhar o dia todo em pé?

Ficar em pé por longos períodos não é apenas cansativo, mas pode causar sérios problemas de saúde a longo prazo. Para entender melhor, vamos falar sobre os efeitos mais comuns dessa prática no corpo humano:

Problemas nas pernas e pés: Ficar em pé por muitas horas pode sobrecarregar as pernas e os pés. Isso pode levar ao inchaço, dor nas articulações, má circulação sanguínea e até mesmo o desenvolvimento de varizes. A pressão constante nas pernas pode afetar a circulação, impedindo o fluxo sanguíneo adequado e causando o acúmulo de líquidos

Problemas na coluna: O ato de permanecer em pé por muitas horas seguidas também pode causar problemas na coluna vertebral. Isso ocorre porque a postura inadequada, combinada com o esforço constante, pode resultar em dores nas costas, desvios posturais e até mesmo em lesões crônicas. A falta de descanso e a ausência de apoio adequado para a coluna pode agravar esses problemas.

Fadiga e dores musculares: Manter-se em pé exige esforço muscular contínuo, o que leva à fadiga e ao cansaço excessivo. Sem pausas adequadas, o trabalhador pode sentir dores musculares nas costas, coxas e tornozelos, além de dificuldade para se concentrar devido ao cansaço mental

Outros problemas de saúde: Além dos problemas óbvios nas pernas e na coluna, o trabalhador que fica em pé por muitas horas sem descanso adequado pode enfrentar também distúrbios como problemas circulatórios, dificuldades respiratórias e até problemas cardíacos.

O que a legislação diz sobre trabalhar em pé?

A legislação brasileira, por meio da CLT, tem algumas disposições que buscam proteger o trabalhador contra condições prejudiciais à saúde e ao bem-estar. Porém, o trabalho em pé o dia inteiro não é expressamente regulamentado, mas existem algumas normas relacionadas ao bem-estar do trabalhador que podem ser aplicadas.

Pausas durante o expediente: A CLT exige que os trabalhadores tenham intervalos durante a jornada de trabalho. Isso inclui o intervalo para refeição e o intervalo para descanso, que são obrigatórios em determinadas condições.

Intervalo para descanso: Se a jornada de trabalho ultrapassar 6 horas, a empresa deve conceder ao trabalhador um intervalo para descanso de no mínimo 1 hora. Esse intervalo é fundamental para garantir que o trabalhador possa descansar e aliviar a pressão sobre seu corpo.

Intervalos curtos: Para quem trabalha em pé por longas horas, intervalos curtos ao longo do expediente também são recomendados para evitar os danos à saúde

Equipamentos de proteção: Dependendo da profissão, o uso de EPIs – equipamentos de proteção individual pode ser necessário. Embora o EPI seja mais associado à proteção contra riscos específicos (químicos, mecânicos, etc.), a postura e o conforto também devem ser considerados. Por exemplo, para trabalhadores que ficam em pé por longos períodos, tapetes anti-fadiga ou calçados ortopédicos podem ser necessários para ajudar a aliviar a pressão nas pernas e pés.

Condições de trabalho adequadas: A empresa deve garantir condições de trabalho que não prejudiquem a saúde do trabalhador. Caso o trabalhador seja forçado a ficar em pé o dia todo, ele pode buscar orientação do sindicato ou um advogado especializado em direito trabalhista para verificar se há condições de trabalho inadequadas que precisem ser corrigidas.

O que a empresa deve oferecer ao trabalhador que trabalha em pé?

Para garantir que o trabalhador não sofra com as consequências de ficar em pé o dia inteiro, a empresa deve adotar algumas práticas que promovam o bem-estar físico e mental:

Pausas regulares: A empresa deve incentivar e garantir que o trabalhador tenha pausas regulares para descansar. Isso pode incluir intervalos curtos de 5 a 10 minutos a cada 2 horas de trabalho contínuo. Esses intervalos são essenciais para permitir que o corpo se recupere.

Alternância de postura: Sempre que possível, é importante que a empresa ofereça a possibilidade de alternar a postura. Isso pode incluir a possibilidade de trabalhar sentado em alguns momentos ou usar suportes ajustáveis para que o trabalhador possa descansar a coluna.

Calçados e equipamentos adequados: A empresa também pode fornecer calçados adequados e, em alguns casos, tapetes ou plataformas para reduzir a fadiga nos pés e nas pernas. Além disso, o ambiente de trabalho deve ser ajustado para garantir que a altura das superfícies de trabalho favoreça a postura do trabalhador.

Exames de saúde regulares: Para quem está exposto a longos períodos em pé, exames de saúde regulares, especialmente relacionados à circulação sanguínea e postura, são essenciais. O trabalhador deve ser monitorado para identificar possíveis problemas de saúde precocemente.

O que o trabalhador pode fazer?

Se você trabalha em uma função em que fica em pé o dia inteiro, há algumas atitudes que você pode adotar para minimizar os impactos negativos no seu corpo:

Use calçados confortáveis e adequados, preferencialmente com suporte ortopédico;

Pratique alongamentos ao longo do dia para aliviar a tensão muscular;

Evite ficar na mesma posição por muito tempo. Tente alternar entre ficar em pé e caminhar um pouco, sempre que possível;

Relaxe e faça pausas regulares, mesmo que o empregador não forneça intervalos extras.

Considerações finais

Trabalhar em pé por longos períodos pode trazer sérios riscos à saúde, como problemas nas pernas, pés e coluna, além de cansaço físico e mental. Embora a legislação brasileira não estabeleça uma regra específica sobre trabalhar o dia inteiro em pé, a empresa tem a obrigação de garantir condições adequadas de trabalho, incluindo pausas e cuidados com a saúde dos trabalhadores.

Muitos trabalhadores enfrentam jornadas longas em que precisam ficar em pé durante todo o expediente. Isso é comum em várias profissões, como atendentes de balcão, vendedores em lojas, operadores de caixa, médicos, enfermeiros, entre outros.

Se você está em uma função que exige ficar em pé o dia inteiro, procure garantir que sua saúde seja respeitada, e não hesite em buscar apoio para reivindicar melhores condições de trabalho, caso necessário. O seu bem-estar deve ser sempre uma prioridade!

Ricardo Nakahashi
Advogado e Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Especialista em Direito do Trabalho.

MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/depeso/433726/trabalhando-de-pe-o-dia-inteiro-isso-esta-correto

Trabalhando de pé o dia inteiro: Isso está correto?

Pejotização e vínculo de emprego: O risco da suspensão em massa

Rafael Izidoro Bello Gonçalves Silva

A suspensão das ações sobre pejotização ignora fraudes, paralisa direitos e ameaça a Justiça do Trabalho. Entenda os riscos de tratar relações desiguais como se fossem iguais.

A recente decisão do STF, que suspendeu nacionalmente todos os processos judiciais sobre a licitude da contratação de trabalhadores por meio de pessoa jurídica ou como autônomos (Tema 1.389 da repercussão geral), parece buscar paz institucional – mas corre o risco de gerar um apagão de Justiça. O argumento apresentado pelo ministro Gilmar Mendes é o de que a Justiça do Trabalho tem desrespeitado as diretrizes da Corte, fomentando insegurança jurídica. A consequência prática, porém, é que milhares de ações ficam travadas, indistintamente, mesmo aquelas que envolvem fraudes explícitas, vínculos mascarados e situações de absoluta vulnerabilidade.

Desde 2018, o STF já reconhecia a licitude da terceirização em qualquer etapa da produção – meio ou fim – conforme fixado na ADPF 324 e no RE 958.252 (Tema 725 da repercussão geral). A tese aprovada foi clara e objetiva:

“É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante.”

Mas ao relatar a ADPF 324, o ministro Luís Roberto Barroso também registrou uma advertência que precisa ser lembrada:

“Impossibilitar que a Justiça Trabalhista fiscalize e censure práticas decorrentes da intermediação perniciosa de mão-de-obra, tais como a ‘pejotização’, não se coaduna com a estruturação constitucional das relações de emprego.”

Ou seja, o próprio Supremo já reconheceu que o direito ao livre exercício empresarial não pode servir de escudo para fraudes trabalhistas.

A Justiça do Trabalho, historicamente, tem essa vocação: aplicar o princípio da primazia da realidade e reconhecer o vínculo de emprego sempre que estejam presentes os requisitos previstos na CLT – pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação. O que se vê no cotidiano forense é que a assinatura de um contrato como PJ, por si só, não significa independência econômica, liberdade negocial ou autonomia técnica.

É nesse ponto que a suspensão determinada pelo STF mostra seu efeito mais cruel. A medida, que deveria pacificar a jurisprudência, paralisa indiscriminadamente ações de motoboys, motoristas, vendedores e outros trabalhadores em evidente situação de dependência, que, embora formalmente registrados como PJ, prestam serviços com exclusividade, controle de jornada e ordens diretas dos contratantes. A decisão, como se nota, “trata como juridicamente idênticas relações absolutamente desiguais”.

Segundo o Ministério Público do Trabalho, até ações civis públicas que discutem situações análogas à escravidão foram impactadas pela suspensão. Isso significa que a medida atinge até mesmo casos com provas robustas de violação de direitos fundamentais. O argumento de Gilmar Mendes, de que a suspensão evitaria a “proliferação de decisões conflitantes”, ignora que a pluralidade de decisões reflete a pluralidade das realidades concretas.

Como alertado por membros do próprio MPT, há processos em fase avançada que foram travados por tempo indeterminado. Trabalhadores que dependem de uma sentença para sobreviver ficam aguardando a formação de uma tese geral – que pode vir tarde demais.

Não se trata de negar a necessidade de segurança jurídica. O que se defende é o reconhecimento de que não há justiça sem análise do caso concreto. A uniformização de entendimento só faz sentido quando respeita a diversidade das situações. O direito do trabalho não pode ser reduzido a uma fórmula: ele exige sensibilidade institucional, exame da realidade vivida e compreensão da desigualdade estrutural presente na maioria das relações.

A tese de que é possível contratar PJs é válida. Mas só o é quando há autonomia real, como a de um profissional liberal com carteira de clientes, liberdade de horário e independência técnica. A imposição do regime PJ a um trabalhador sem opção, sem voz e sem proteção social não é liberdade contratual – é subordinação disfarçada.

A esperança é que, no julgamento de mérito do Tema 1.389, o STF se lembre da sua própria advertência feita em 2018, que a legislação trabalhista congrega direitos básicos e que é papel da Justiça do Trabalho identificar a fraude e proteger o hipossuficiente, mesmo quando disfarçado de empresário. Nenhuma tese pode prevalecer sobre a dignidade do trabalhador. E nenhuma suspensão pode ser tão ampla a ponto de suspender, junto com os processos, o próprio sentido de Justiça.

Rafael Izidoro Bello Gonçalves Silva
Advogado, pós-graduado em Direito Tributário, CEO da Vismar, Oliveira e Izidoro Advogados, especialista em Direito do Trabalho com ampla atuação na defesa de trabalhadores em todo o Brasil.

MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/depeso/434325/pejotizacao-e-vinculo-de-emprego-o-risco-da-suspensao-em-massa

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TRT-2 multa por litigância abusiva reversa empresa que recusou conciliação

Empresa foi punida por ignorar tentativas de conciliação, violando princípios da boa-fé e cooperação processual. Segundo o Tribunal, é primeiro acórdão de litigância predatória “reversa” de que se tem notícia.

Da Redação

O TRT da 2ª região manteve sentença que condenou uma empresa por litigância de má-fé, ao constatar postura abusiva durante a condução do processo. Decisão, por maioria, é da 12ª turma.

Segundo o Tribunal, é o primeiro acórdão de “litigância predatória reversa” de que se tem conhecimento. A multa aplicada corresponde a 8% do valor atualizado da causa, em favor do trabalhador.

Empresa é condenada por litigância abusiva reversa após recusar conciliação.
Na litigância predatória comum, a parte autora move diversas ações para pressionar acordos ou sair vitoriosa por falta de defesa. Na litigância reversa, o réu age de forma abusiva, negando-se a cumprir jurisprudência pacificada, textos de lei, decisões judiciais, além de se recusar injustificadamente à mínima tentativa de solução conciliatória.

A desembargadora Tania Bizarro Quirino de Morais, relatora, manteve a sentença e pontuou que “o magistrado tem o direito e o dever de aplicar as sanções cabíveis no caso de comportamento desvirtuador da atuação das partes em juízo”.

Conduta antiprocessual e desrespeito à conciliação

No caso, a empresa se recusou de forma absoluta a qualquer tentativa de conciliação, tanto no início quanto no encerramento da audiência, mesmo diante de matérias amplamente controvertidas e com riscos jurídicos evidentes – especialmente sobre a nulidade de um acordo firmado por via arbitral.

Na sentença, o juízo concluiu que a conduta revelou “menosprezo legal da audiência trabalhista” e afronta direta aos arts. 846 e 850 da CLT, que impõem a tentativa de conciliação como etapa obrigatória da audiência.

A decisão também considerou que a empresa ignorou os deveres de cooperação e boa-fé processual (arts. 5º e 6º do CPC), bem como o espírito da resolução 125/2010 e da recomendação 159/24 do CNJ, que buscam incentivar a autocomposição como forma eficaz e responsável de solucionar conflitos.

Arbitragem invalidada

Além da penalidade por má-fé, o TRT-2 declarou a nulidade do acordo arbitral anteriormente firmado entre as partes. A Corte reconheceu que o trabalhador recebia salário inferior ao mínimo legal exigido para a validade da cláusula compromissória (art. 507-A da CLT). O negócio jurídico foi, portanto, considerado nulo, sem eficácia para quitação do contrato de trabalho.

Também foram reconhecidos o pagamento de comissões “por fora”, a não quitação de horas extras e adicional noturno, além da ausência de depósitos regulares do FGTS. A empresa foi condenada ao pagamento das verbas trabalhistas devidas, inclusive com retificação da CTPS.

Em voto divergente, o desembargador Bendito Valentini entendeu de forma diversa sobre a dedução dos valores pagos no âmbito da arbitragem, entendendo ser cabível a dedução, sob pena de enriquecimento sem causa – mas a tese foi rejeitada pelo colegiado.

Processo: 1000309-20.2024.5.02.0442
Leia o acórdão: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.migalhas.com.br/arquivos/2025/7/0BA59650F746BF_acordao2TRT2.pdf

MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/quentes/434434/trt-2-multa-por-litigancia-abusiva-reversa-empresa-que-negou-conciliar

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TRT-15 reconhece dano existencial por jornada exaustiva de caminhoneiro

Por maioria de votos, a 4ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (interior de São Paulo) manteve a condenação de uma empresa de transporte ao pagamento de horas extras a um motorista de caminhão. A decisão também acolheu o recurso do trabalhador para reconhecer a ocorrência de dano existencial.

Relatado pela desembargadora Eleonora Bordini Coca, o acórdão considerou que o empregado enfrentou jornada exaustiva, em desrespeito aos limites legais e ao direito ao descanso e à convivência familiar.

Conforme constou na petição inicial, o trabalhador cumpria, rotineiramente, jornadas iniciadas às 3h e encerradas às 20h, em três dias da semana, com apenas 30 minutos de intervalo. Nos outros dois dias, a jornada se estendia até as 17h, horário que também era cumprido em dois sábados por mês.

Apesar de a empresa juntar documentos que indicavam jornada inferior à alegada, a testemunha ouvida por indicação do trabalhador afirmou que “tinham que anotar os horários que a empresa determinava, para não dar excesso de carga horária”. Além disso, a perícia técnica feita por determinação do juízo de origem confirmou que os sistemas de rastreamento de veículos podiam ser alterados, sem que essa modificação fosse indicada nos relatórios.

Diante desse contexto, a decisão colegiada entendeu pela imprestabilidade dos registros juntados aos autos, considerando que “o reclamante se desvencilhou de seu ônus de provar que as anotações não retratam a realidade”. Por consequência, manteve a decisão de primeira instância, que adotou como verdadeira a jornada alegada na petição inicial.

Para a desembargadora Eleonora Coca, “não há como negar que os horários de trabalho, conforme jornada fixada, ora mantida, acabam por prejudicar a vida normal do trabalhador, reduzindo drasticamente a possibilidade de lazer (direito social, previsto no artigo 6º da Constituição Federal), o convívio social e familiar, além de culminar com a exposição a riscos diversos, inclusive à saúde”. Com isso, foi fixada indenização no valor de R$ 10 mil, além do pagamento de horas extras, adicionais noturnos e intervalos não concedidos corretamente. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-15.

Clique aqui para ler a decisão

Processo 0010979-33.2021.5.15.0134

CONJUR
https://www.conjur.com.br/2025-jul-10/trt-15-reconhece-dano-existencial-por-jornada-exaustiva-de-caminhoneiro/

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Empregadores são responsáveis por morte de trabalhador por agrotóxicos

A 11ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (interior de São Paulo) reconheceu o nexo causal entre a atividade laboral e a morte de um trabalhador rural de 23 anos, em decorrência de contaminação por agrotóxicos. O juízo da Vara do Trabalho de Capão Bonito (SP) havia julgado improcedentes os pedidos. A decisão colegiada, porém, reformou a sentença ao destacar as falhas graves na proteção à saúde do empregado, inclusive pelo não fornecimento de equipamentos de proteção individual adequados.

O laudo técnico pericial confirmou que a vítima exercia atividades na agricultura de tomate, com exposição habitual a substâncias químicas altamente tóxicas, como Malathion e Klorpan 480 EC. Também foi constatado que os empregadores não forneceram luvas nitrílicas e não providenciaram a substituição periódica dos EPIs. A decisão colegiada destacou ainda que não houve apresentação do Programa de Gerenciamento de Riscos no Trabalho Rural e não foi feito o monitoramento da saúde ocupacional com exames específicos. Além disso, não há evidências de que o empregado tenha recebido treinamento adequado para o desempenho da função.

A morte do trabalhador ocorreu um dia após ele ter procurado atendimento médico, com sintomas compatíveis com intoxicação aguda. Embora o atestado de óbito não mencione especificamente intoxicação química, os sintomas clínicos foram considerados compatíveis com os efeitos dos produtos utilizados no ambiente de trabalho.

“O desfecho fatal após atendimento médico no dia anterior, com sintomas que incluíam dores abdominais e tosses com secreção de sangue, reforça a conclusão de intoxicação aguda, com especial consideração à juventude e prévia boa saúde do trabalhador”, pontuou o relator do acórdão, desembargador João Batista Martins César.

A responsabilidade dos empregadores foi determinada pela violação do direito fundamental à vida, à saúde e ao meio ambiente de trabalho equilibrado.  O acórdão fixou o pagamento de indenização por danos extrapatrimoniais no valor de R$ 100 mil, a ser dividida em partes iguais entre a companheira do trabalhador e o filho menor do casal, que à época contava com apenas um ano de idade. Além disso, o colegiado deferiu o pedido de pagamento de pensão mensal ao menino, no valor de um salário mínimo, até que ele complete 18 anos.

A câmara julgadora ressaltou ainda que a morte do trabalhador também configura hipótese de dano existencial, diante da ruptura abrupta do convívio entre pai e filho em fase crucial de desenvolvimento. Os magistrados falaram sobre a importância de que a doutrina e a advocacia avancem nesse novo instituto, como forma efetiva de proteção à criança. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-15.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 0010107-46.2024.5.15.0123

CONJUR
https://www.conjur.com.br/2025-jul-10/empregadores-sao-responsaveis-por-morte-de-trabalhador-por-agrotoxicos/

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Trabalho escravo e a exclusão da competência da Justiça do Trabalho pelo MTE

Em O processo, Franz Kafka retratou a aflição de um homem diante de um sistema jurídico incompreensível. Na conversa entre K e o pintor Titorelli, este último revela a lógica perversa que, no seu entender, governa o tribunal kafkiano: “Não se pode tirar os olhos do processo; é necessário ir regularmente ter com o juiz que nos interessa e, acima de tudo, procurar mantê-lo, por todos os meios, bem-disposto conosco. Se não se conhecer pessoalmente o juiz, torna-se necessário procurar juízes conhecidos para exercerem sobre ele a sua influência”.[1]

Esta descrição de um sistema onde a justiça depende de manobras estratégicas encontra ecos perturbadores no Brasil contemporâneo, em que Termo de Ajustamento de Conduta celebrado pelo Ministério do Trabalho e Emprego revela como a criação de competências paralelas pode subverter o sistema constitucional de especialização jurisdicional, permitindo que violadores de direitos humanos escapem da apreciação de órgãos tecnicamente qualificados e constitucionalmente legitimados.

A situação tem origem em fatos gravíssimos ocorridos em 2021, quando a fiscalização trabalhista constatou a submissão de cinco trabalhadores a condições degradantes em Novo Repartimento (PA).

O Ministério Público do Trabalho celebrou, dentro dos contornos de suas prerrogativas legais, ainda em 2021, um Termo de Ajuste de Conduta com a empresa flagrada, que estabeleceu obrigações reparatórias para os trabalhadores e para a coletividade, a correção das irregularidades identificadas e compromissos para evitar a reincidência da conduta violadora.

O panorama jurídico se alterou substancialmente em maio de 2025, quando a mesma empresa, fundamentando-se na Portaria Interministerial MTE/MDHC/MIR 18/2024, que contém inúmeros vícios, celebrou novo Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério do Trabalho e Emprego. Este segundo instrumento versa sobre os mesmos fatos, as mesmas violações e os mesmos trabalhadores já contemplados no acordo anterior firmado com o MPT, criando uma rota de fuga da competência especializada.

A estratégia revela-se particularmente engenhosa em desviar a competência fixada constitucionalmente. Enquanto o TAC celebrado com o MPT respeita as atribuições definidas por lei e mantém naturalmente a competência da Justiça do Trabalho, especializada em matéria laboral e dotada de expertise consolidada em casos de trabalho escravo, o TAC firmado com o MTE, além de colocá-lo simultaneamente como órgão fiscalizador, julgador e arrecadador, estabelece expressamente que “fica eleito o Foro/Seção Judiciária de Brasília-DF, para todos e quaisquer procedimentos judiciais e extrajudiciais oriundos deste TAC“.

Esta cláusula representa muito mais que uma simples escolha de foro: constitui tentativa deliberada de afastar a competência da Justiça Especializada e do MPT como órgão legitimado para tutela de direitos transindividuais.

Outra questão crítica foi a transferência da competência do local dos fatos, em Novo Repartimento, para Brasília, o que representa obstáculo concreto ao acesso à justiça dos trabalhadores lesados. A Vara do Trabalho de Tucuruí, que possui jurisdição sobre a região onde ocorreram as violações, está naturalmente mais próxima dos trabalhadores e melhor posicionada para compreender o contexto social e econômico em que se deram os fatos.

A questão transcende aspectos meramente procedimentais e alcança o núcleo da especialização jurisdicional brasileira. A Constituição de 1988, ao criar a Justiça do Trabalho como ramo especializado do Poder Judiciário, reconheceu que matérias trabalhistas demandam conhecimento técnico específico e sensibilidade particular às peculiaridades das relações laborais. Esta especialização não constitui mero capricho organizacional, mas resposta institucional à complexidade e relevância social dos conflitos trabalhistas.

O caso do TAC do MTE materializa uma estratégia de forum shopping que permite às empresas não apenas escolherem o órgão de solução do conflito social, mas ainda afastar a intervenção do Ministério Público do Trabalho e apreciação do acordo pela Justiça do Trabalho.

Esta possibilidade de escolha rompe com o Estado de Direito, viola regras constitucionais e legais, bem como a isonomia no tratamento de violações aos direitos humanos. Além disso, cria incentivos perversos para que infratores busquem sempre a via menos especializada e potencialmente menos rigorosa, na medida em que órgãos do Executivo estão eventualmente sujeitos a diretrizes governamentais e pressões políticas.

A sistemática criada possibilita ainda que empresas flagradas em violações aos direitos humanos escapem da atuação imparcial do Ministério Público do Trabalho, instituição dotada de autonomia funcional e especialização técnica em matéria trabalhista. O MPT, por sua natureza institucional, possui independência para atuar contra interesses econômicos ou políticos, característica essencial quando se trata de proteger direitos fundamentais de trabalhadores em situação de vulnerabilidade.

Esta possibilidade oferece às empresas uma alternativa potencialmente mais flexível, já que este órgão, como parte da estrutura do Poder Executivo, pode estar sujeito a considerações de política econômica ou pressões setoriais que não influenciam a atuação ministerial.

É uma diferença de posicionamento institucional que não é acidental, mas reflete a própria concepção constitucional que reservou ao Ministério Público a defesa de interesses sociais e individuais indisponíveis. Logo, essa nova dinâmica criada pela Portaria, além de ilegal, inaugura uma insegurança jurídica nos conflitos sociais que tratam de uma das mais graves violações de direitos humanos.

O fenômeno observado representa, em essência, uma tentativa de exclusão da justiça trabalhista. Ao permitir que empresas escolham entre diferentes órgãos e diferentes competências jurisdicionais, o sistema criado pela Portaria 18/2024 subordina a aplicação da justiça às preferências dos próprios infratores, invertendo a lógica do Estado de Direito.

A preservação da competência da Justiça Especializada para casos de trabalho escravo não representa defesa de interesses institucionais, mas constitui garantia fundamental para os trabalhadores brasileiros. A especialização jurisdicional existe precisamente para assegurar que violações complexas aos direitos humanos sejam apreciadas por órgãos dotados do conhecimento técnico e da sensibilidade social necessários para compreender adequadamente suas implicações.

O caso do TAC firmado pelo Ministério do Trabalho e Emprego representa uma ruptura no Estado de Direito e serve como alerta sobre os riscos de permitir que a gravidade de violações aos direitos humanos seja diluída através de mecanismos que afastam a competência de órgãos especializados. A luta contra o trabalho escravo, construída ao longo de décadas, não pode ser comprometida por interpretações que privilegiem a conveniência dos infratores sobre a proteção efetiva dos direitos fundamentais dos trabalhadores.


[1] KAFKA, Franz. O Processo. Trad. André Piattino. Monte Cristo Editora. Edição Digital. p. 214.

Luciano Aragão Santos é procurador do Trabalho e coordenador nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas do Ministério Público do Trabalho

Tatiana Leal Bivar Simonetti é procuradora do Trabalho e vice-coordenadora nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas do Ministério Público do Trabalho

DM TEM DEBATE
https://www.dmtemdebate.com.br/trabalho-escravo-e-a-exclusao-da-competencia-da-justica-do-trabalho-pelo-mte/