NOVA CENTRAL SINDICAL
DE TRABALHADORES
DO ESTADO DO PARANÁ

UNICIDADE
DESENVOLVIMENTO
JUSTIÇA SOCIAL

OPORTUNIDADE
No Paraná, 30% dos presos estudam e 25% trabalham. Meta é chegar a 100%. Na penitenciária feminina, metade das internas trabalham
 
Um dos maiores desafios da segurança pública no Brasil é garantir que egressos do sistema carcerário não voltem a cometer crimes. Para isso, é preciso acesso à educação e à profissionalização. Embora não exista pesquisa nacional a respeito, especialistas afirmam que quando o preso trabalha ou estuda a reincidência cai de 70% para 20%. Essa é a aposta do Paraná, que até o fim de 2014 quer todos os internos de seu sistema penitenciário estudando ou trabalhando.
 
Uma parceria entre a iniciativa privada e o governo estadual fez com que, nos últimos 15 anos, 250 mulheres pudessem trabalhar enquanto cumpriam a pena de privação de liberdade no estado. A ação da empresa Bematech na Penitenciária Feminina do Paraná, localizada em Piraquara, Região Metropolitana de Curiti­ba, começou há quase duas décadas por sugestão de um funcionário que desenvolvia uma ação de voluntariado.
 
Segunda chance
Esperança de uma nova vida fora da prisão
 
Para Maria (nome fictício), a oportunidade de emprego é a esperança para uma nova vida fora da prisão. Ela está encarcerada há quatro anos e três meses, e trabalha desde o inídio. A ocupação é uma forma de adiantar a pena, estipulada em 21 anos. O esforço da jovem de 22 anos já rendeu dois diplomas de costureira profissional, mais a experiência como soldadora na Bematech. “Trabalhar é importante para mostrar que, por mais que eu esteja presa, sou importante. Alguém precisa de mim”, diz. Os planos incluem voltar a estudar e torcer pela revisão da pena. “Mereço uma segunda chance e quero mostrar meu valor.”
 
Disparidade
Renda de ex-detentos é menor
 
Faltam pesquisas para avaliar o sistema carcerário brasileiro e a reincidência dos detentos. Alguns especialistas afirmam que, quando o preso trabalha ou estuda, a reincidência cai dos alarmantes 70% para 20%, mas os estudos não têm abrangência nacional. O governo de São Paulo, por exemplo, faz um acompanhamento mais intensivo dos egressos e o último censo penitenciário do estado, de 2002, mostra que 42% da população carcerária é composta de reincidentes.
 
Um estudo realizado em São Paulo pelo Ilanud, órgão das Nações Unidas para a prevenção de delitos, mostrou que metade dos 127 egressos entrevistados não trabalhou após deixar a prisão. Entre os que declararam trabalhar, apenas 6,3% eram registrados sob o regime da CLT. Enquanto a renda média dos demais trabalhadores da região Sudeste era de R$ 1.042, os ex-detentos recebiam apenas R$ 325.
 
Outro dado alarmante é que, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), 178,5 mil presos têm apenas o ensino fundamental incompleto e 27 mil são analfabetos.
 
Vantagens
Veja o que cada um ganha:
 
A empresa
– O trabalho do preso no regime fechado e semiaberto não está sujeito ao regime da CLT. O empre­­­­sário fica isento de encargos como férias, 13º e FGTS. Dependendo do piso salarial, a redução nos custos da mão de obra pode chegar a 50%;
– A remuneração mínima corresponde a ¾ do salário mínimo;
– Só são encaminhados às vagas de trabalho externo candidatos selecionados pela Comissão Técnica de Classificação (CTC) de cada unidade penal;
– Nas licitações para obras de construção, reforma, ampliação e manutenção de unidade prisional, o aproveitamento de mão de obra de presos poderá ser considerada fator de pontuação, a critério da legislação estadual ou municipal;
 
O preso
– Para cada três dias de trabalho, um dia é reduzido da pena;
– Remuneração é dividida em três partes iguais, conforme a Lei de Execução Penal (LEP). Uma para o preso, outra para a família e parte fica retida em uma poupança, retirada pelo preso após a liberdade.
Os gestores da empresa, que trabalha com automação comercial, acataram a sugestão de montar um canteiro de produção dentro da penitenciária e oferecer uma oportunidade às presidiárias.
A iniciativa foi bem sucedida e hoje trabalhar na empresa é o desejo de quase todas as mulheres, que passam por um longo e concorrido processo de seleção, envolvendo desde bom comportamento até competências individuais.
 
Boa produtividade
Duas vezes por semana um funcionário da Bematech vai até a penitenciária para entregar materiais e realizar uma formação com as mulheres. “Elas trabalham como qualquer fornecedor e têm uma boa produtividade”, conta o presidente da empresa, Cleber Morais. Para ele, esta é uma forma de contribuir com a sociedade e fazer uma ação de responsabilidade social.
Das 421 mulheres que hoje estão presas na penitenciária feminina, 206 trabalham. Há no local, além da Bematech, uma empresa de costura. Vice-diretora da unidade, Daniela Fidalgo de Barros explica que parte da remuneração recebida é destinada aos familiares, que muitas vezes usam a verba para comprar itens de higiene pessoal e alimentação para as próprias detentas. Cerca de 20% do salário fica em uma poupança, entregue no dia da soltura. Daniela conta que o trabalho também proporciona uma rotina mais tranquila dentro da penitenciária.
 
ONGs e direitos
O trabalho de organizações não governamentais também é fundamental para a garantia dos direitos das pessoas privadas de liberdade e para a ressocialização dos presos. Instituições como a Pastoral Carcerária e Justiça Global foram as responsáveis por levar a público as graves violações que ocorrem nas penitenciárias brasileiras.
 
No Paraná, a ONG Iddeha (Instituto de Defesa dos Direitos Humanos) criou um centro de referência no complexo penal de Piraquara após uma rebelião em 2010.
 
A organização foi procurada por familiares dos presos e ajudou na mobilização por melhores condições, além de receber denúncias e realizar encaminhamentos jurídicos. A assistente social do Iddeha, Renaria Silva, conta que algumas mulheres chegaram a criar uma rede para acompanhar as reivindicações. Hoje o projeto está paralisado por falta de verbas.
 
Entrave nos governos deixa vagas em aberto
 
Em 2009, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançou o programa Começar de Novo, com o objetivo de garantir aos ex-detentos uma oportunidade de trabalho, para que possam recomeçar a vida com alguma expectativa. Até agora, 2.211 presos já encontraram trabalho por meio da iniciativa, mas ainda há entraves nos governos estaduais e 2,8 mil vagas ainda não foram preenchidas.
 
Além de fazer campanhas para conscientizar a sociedade, o CNJ lançou o Portal de Oportu­­nidades, onde empresas podem se cadastrar e disponibilizar vagas tanto para presos quanto para egressos do sistema carcerário. Outra ação do órgão foi o lançamento de duas cartilhas, para homens e mulheres, explicando os direitos e os deveres dos detentos.
 
Em setembro do ano passado, o ministro Cezar Peluso, atual presidente do CNJ, declarou que o Brasil tem uma das maiores taxas de reincidência do mundo, com 70%. Isso significa que, de cada 10 presos, sete voltam a cometer crimes após serem libertados. Segundo o órgão, hoje só 14% dos detentos trabalham e apenas 8% estudam.
No Paraná, a meta é de 100% de acesso à profissionalização e educação até o fim de 2014. Ou seja, o governo pretende que todos os presos em penitenciárias do estado estejam trabalhando ou estudando. No fim do ano passado, 30% dos apenados estavam estudando (contra 24% em 2010) e 25% trabalhavam (eram 22,5% no ano anterior).
 
O Começar de Novo teve início a partir da realização dos Mutirões Carcerários, explica o juiz auxiliar da presidência do CNJ Márcio Fraga. “A soltura sem possibilidade de a pessoa se restabelecer não adiantava”, explica. Para os empresários que aceitam o desafio de empregar detentos e ex-detentos, Fraga diz que os benefícios são grandes. “Eles são geralmente bastante dedicados ao trabalho e existem vantagens previdenciárias. Além disso, há a responsabilidade social.”