Por maioria de votos, a 4ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (interior de São Paulo) manteve a condenação de uma empresa de transporte ao pagamento de horas extras a um motorista de caminhão. A decisão também acolheu o recurso do trabalhador para reconhecer a ocorrência de dano existencial.
Relatado pela desembargadora Eleonora Bordini Coca, o acórdão considerou que o empregado enfrentou jornada exaustiva, em desrespeito aos limites legais e ao direito ao descanso e à convivência familiar.
Conforme constou na petição inicial, o trabalhador cumpria, rotineiramente, jornadas iniciadas às 3h e encerradas às 20h, em três dias da semana, com apenas 30 minutos de intervalo. Nos outros dois dias, a jornada se estendia até as 17h, horário que também era cumprido em dois sábados por mês.
Apesar de a empresa juntar documentos que indicavam jornada inferior à alegada, a testemunha ouvida por indicação do trabalhador afirmou que “tinham que anotar os horários que a empresa determinava, para não dar excesso de carga horária”. Além disso, a perícia técnica feita por determinação do juízo de origem confirmou que os sistemas de rastreamento de veículos podiam ser alterados, sem que essa modificação fosse indicada nos relatórios.
Diante desse contexto, a decisão colegiada entendeu pela imprestabilidade dos registros juntados aos autos, considerando que “o reclamante se desvencilhou de seu ônus de provar que as anotações não retratam a realidade”. Por consequência, manteve a decisão de primeira instância, que adotou como verdadeira a jornada alegada na petição inicial.
Para a desembargadora Eleonora Coca, “não há como negar que os horários de trabalho, conforme jornada fixada, ora mantida, acabam por prejudicar a vida normal do trabalhador, reduzindo drasticamente a possibilidade de lazer (direito social, previsto no artigo 6º da Constituição Federal), o convívio social e familiar, além de culminar com a exposição a riscos diversos, inclusive à saúde”. Com isso, foi fixada indenização no valor de R$ 10 mil, além do pagamento de horas extras, adicionais noturnos e intervalos não concedidos corretamente. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-15.
A 11ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (interior de São Paulo) reconheceu o nexo causal entre a atividade laboral e a morte de um trabalhador rural de 23 anos, em decorrência de contaminação por agrotóxicos. O juízo da Vara do Trabalho de Capão Bonito (SP) havia julgado improcedentes os pedidos. A decisão colegiada, porém, reformou a sentença ao destacar as falhas graves na proteção à saúde do empregado, inclusive pelo não fornecimento de equipamentos de proteção individual adequados.
O laudo técnico pericial confirmou que a vítima exercia atividades na agricultura de tomate, com exposição habitual a substâncias químicas altamente tóxicas, como Malathion e Klorpan 480 EC. Também foi constatado que os empregadores não forneceram luvas nitrílicas e não providenciaram a substituição periódica dos EPIs. A decisão colegiada destacou ainda que não houve apresentação do Programa de Gerenciamento de Riscos no Trabalho Rural e não foi feito o monitoramento da saúde ocupacional com exames específicos. Além disso, não há evidências de que o empregado tenha recebido treinamento adequado para o desempenho da função.
A morte do trabalhador ocorreu um dia após ele ter procurado atendimento médico, com sintomas compatíveis com intoxicação aguda. Embora o atestado de óbito não mencione especificamente intoxicação química, os sintomas clínicos foram considerados compatíveis com os efeitos dos produtos utilizados no ambiente de trabalho.
“O desfecho fatal após atendimento médico no dia anterior, com sintomas que incluíam dores abdominais e tosses com secreção de sangue, reforça a conclusão de intoxicação aguda, com especial consideração à juventude e prévia boa saúde do trabalhador”, pontuou o relator do acórdão, desembargador João Batista Martins César.
A responsabilidade dos empregadores foi determinada pela violação do direito fundamental à vida, à saúde e ao meio ambiente de trabalho equilibrado. O acórdão fixou o pagamento de indenização por danos extrapatrimoniais no valor de R$ 100 mil, a ser dividida em partes iguais entre a companheira do trabalhador e o filho menor do casal, que à época contava com apenas um ano de idade. Além disso, o colegiado deferiu o pedido de pagamento de pensão mensal ao menino, no valor de um salário mínimo, até que ele complete 18 anos.
A câmara julgadora ressaltou ainda que a morte do trabalhador também configura hipótese de dano existencial, diante da ruptura abrupta do convívio entre pai e filho em fase crucial de desenvolvimento. Os magistrados falaram sobre a importância de que a doutrina e a advocacia avancem nesse novo instituto, como forma efetiva de proteção à criança. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-15.
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Processo 0010107-46.2024.5.15.0123
A Nova Central Sindical de Trabalhadores do Paraná (NCST/PR) participou, na manhã desta quinta-feira (10), de mais uma reunião do Conselho Municipal do Emprego e Relações do Trabalho de Curitiba (CMERT), realizada no Salão Nobre da Prefeitura Municipal. O encontro reuniu representantes dos trabalhadores, empregadores e do poder público municipal, reforçando o compromisso com o diálogo social e a construção de políticas públicas voltadas à promoção do emprego, da renda e da valorização do trabalho na capital paranaense.
Representando a NCST/PR no conselho, o dirigente sindical Ermínio Ferreira Sant´ana teve participação ativa nas discussões, destacando a importância da atuação tripartite na formulação de propostas que respondam aos desafios do mundo do trabalho. Em sua intervenção, Sant´ana defendeu a ampliação das ações de qualificação profissional, a efetiva aplicação dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e o fortalecimento das medidas de saúde e segurança ocupacional.
“É fundamental que as políticas públicas voltadas ao emprego e às relações de trabalho sejam implementadas de forma eficaz e cheguem aos trabalhadores que mais precisam. O CMERT é um espaço estratégico para garantir essa articulação, com a participação direta das entidades sindicais”, afirmou Sant´ana.
O CMERT, instituído pela Lei Municipal nº 8.784/1995, é um importante espaço de participação social e deliberação em Curitiba. Sua composição tripartite permite que trabalhadores, empregadores e governo construam, conjuntamente, alternativas para o desenvolvimento econômico com justiça social.
A reunião também contemplou a leitura e apreciação da ata da última sessão, com contribuições dos conselheiros. Ao final do encontro, ficou evidente o compromisso de todas as representações em fortalecer as ações do conselho ao longo do ano, com foco na inclusão produtiva, no trabalho decente e na geração de oportunidades para a população curitibana.
A NCST/PR reafirma seu compromisso com a defesa dos direitos da classe trabalhadora e com a construção de políticas públicas que promovam um ambiente de trabalho mais justo, seguro e equilibrado.
Em O processo, Franz Kafka retratou a aflição de um homem diante de um sistema jurídico incompreensível. Na conversa entre K e o pintor Titorelli, este último revela a lógica perversa que, no seu entender, governa o tribunal kafkiano: “Não se pode tirar os olhos do processo; é necessário ir regularmente ter com o juiz que nos interessa e, acima de tudo, procurar mantê-lo, por todos os meios, bem-disposto conosco. Se não se conhecer pessoalmente o juiz, torna-se necessário procurar juízes conhecidos para exercerem sobre ele a sua influência”.[1]
Esta descrição de um sistema onde a justiça depende de manobras estratégicas encontra ecos perturbadores no Brasil contemporâneo, em que Termo de Ajustamento de Conduta celebrado pelo Ministério do Trabalho e Emprego revela como a criação de competências paralelas pode subverter o sistema constitucional de especialização jurisdicional, permitindo que violadores de direitos humanos escapem da apreciação de órgãos tecnicamente qualificados e constitucionalmente legitimados.
A situação tem origem em fatos gravíssimos ocorridos em 2021, quando a fiscalização trabalhista constatou a submissão de cinco trabalhadores a condições degradantes em Novo Repartimento (PA).
O Ministério Público do Trabalho celebrou, dentro dos contornos de suas prerrogativas legais, ainda em 2021, um Termo de Ajuste de Conduta com a empresa flagrada, que estabeleceu obrigações reparatórias para os trabalhadores e para a coletividade, a correção das irregularidades identificadas e compromissos para evitar a reincidência da conduta violadora.
O panorama jurídico se alterou substancialmente em maio de 2025, quando a mesma empresa, fundamentando-se na Portaria Interministerial MTE/MDHC/MIR 18/2024, que contém inúmeros vícios, celebrou novo Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério do Trabalho e Emprego. Este segundo instrumento versa sobre os mesmos fatos, as mesmas violações e os mesmos trabalhadores já contemplados no acordo anterior firmado com o MPT, criando uma rota de fuga da competência especializada.
A estratégia revela-se particularmente engenhosa em desviar a competência fixada constitucionalmente. Enquanto o TAC celebrado com o MPT respeita as atribuições definidas por lei e mantém naturalmente a competência da Justiça do Trabalho, especializada em matéria laboral e dotada de expertise consolidada em casos de trabalho escravo, o TAC firmado com o MTE, além de colocá-lo simultaneamente como órgão fiscalizador, julgador e arrecadador, estabelece expressamente que “fica eleito o Foro/Seção Judiciária de Brasília-DF, para todos e quaisquer procedimentos judiciais e extrajudiciais oriundos deste TAC“.
Esta cláusula representa muito mais que uma simples escolha de foro: constitui tentativa deliberada de afastar a competência da Justiça Especializada e do MPT como órgão legitimado para tutela de direitos transindividuais.
Outra questão crítica foi a transferência da competência do local dos fatos, em Novo Repartimento, para Brasília, o que representa obstáculo concreto ao acesso à justiça dos trabalhadores lesados. A Vara do Trabalho de Tucuruí, que possui jurisdição sobre a região onde ocorreram as violações, está naturalmente mais próxima dos trabalhadores e melhor posicionada para compreender o contexto social e econômico em que se deram os fatos.
A questão transcende aspectos meramente procedimentais e alcança o núcleo da especialização jurisdicional brasileira. A Constituição de 1988, ao criar a Justiça do Trabalho como ramo especializado do Poder Judiciário, reconheceu que matérias trabalhistas demandam conhecimento técnico específico e sensibilidade particular às peculiaridades das relações laborais. Esta especialização não constitui mero capricho organizacional, mas resposta institucional à complexidade e relevância social dos conflitos trabalhistas.
O caso do TAC do MTE materializa uma estratégia de forum shopping que permite às empresas não apenas escolherem o órgão de solução do conflito social, mas ainda afastar a intervenção do Ministério Público do Trabalho e apreciação do acordo pela Justiça do Trabalho.
Esta possibilidade de escolha rompe com o Estado de Direito, viola regras constitucionais e legais, bem como a isonomia no tratamento de violações aos direitos humanos. Além disso, cria incentivos perversos para que infratores busquem sempre a via menos especializada e potencialmente menos rigorosa, na medida em que órgãos do Executivo estão eventualmente sujeitos a diretrizes governamentais e pressões políticas.
A sistemática criada possibilita ainda que empresas flagradas em violações aos direitos humanos escapem da atuação imparcial do Ministério Público do Trabalho, instituição dotada de autonomia funcional e especialização técnica em matéria trabalhista. O MPT, por sua natureza institucional, possui independência para atuar contra interesses econômicos ou políticos, característica essencial quando se trata de proteger direitos fundamentais de trabalhadores em situação de vulnerabilidade.
Esta possibilidade oferece às empresas uma alternativa potencialmente mais flexível, já que este órgão, como parte da estrutura do Poder Executivo, pode estar sujeito a considerações de política econômica ou pressões setoriais que não influenciam a atuação ministerial.
É uma diferença de posicionamento institucional que não é acidental, mas reflete a própria concepção constitucional que reservou ao Ministério Público a defesa de interesses sociais e individuais indisponíveis. Logo, essa nova dinâmica criada pela Portaria, além de ilegal, inaugura uma insegurança jurídica nos conflitos sociais que tratam de uma das mais graves violações de direitos humanos.
O fenômeno observado representa, em essência, uma tentativa de exclusão da justiça trabalhista. Ao permitir que empresas escolham entre diferentes órgãos e diferentes competências jurisdicionais, o sistema criado pela Portaria 18/2024 subordina a aplicação da justiça às preferências dos próprios infratores, invertendo a lógica do Estado de Direito.
A preservação da competência da Justiça Especializada para casos de trabalho escravo não representa defesa de interesses institucionais, mas constitui garantia fundamental para os trabalhadores brasileiros. A especialização jurisdicional existe precisamente para assegurar que violações complexas aos direitos humanos sejam apreciadas por órgãos dotados do conhecimento técnico e da sensibilidade social necessários para compreender adequadamente suas implicações.
O caso do TAC firmado pelo Ministério do Trabalho e Emprego representa uma ruptura no Estado de Direito e serve como alerta sobre os riscos de permitir que a gravidade de violações aos direitos humanos seja diluída através de mecanismos que afastam a competência de órgãos especializados. A luta contra o trabalho escravo, construída ao longo de décadas, não pode ser comprometida por interpretações que privilegiem a conveniência dos infratores sobre a proteção efetiva dos direitos fundamentais dos trabalhadores.
[1] KAFKA, Franz. O Processo. Trad. André Piattino. Monte Cristo Editora. Edição Digital. p. 214.
Luciano Aragão Santos é procurador do Trabalho e coordenador nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas do Ministério Público do Trabalho
Tatiana Leal Bivar Simonetti é procuradora do Trabalho e vice-coordenadora nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas do Ministério Público do Trabalho
Em entrevista recente ao portal Metrópoles, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, fez declarações contundentes sobre a desigualdade social e fiscal no Brasil. Segundo ele, o país precisa encarar de frente os privilégios concentrados nas mãos do 1% mais rico da população para que o crescimento econômico seja sustentável e, sobretudo, justo.
Haddad criticou duramente as reações da elite econômica às políticas de redistribuição de renda promovidas pelo governo. Em tom incisivo, ele questionou a narrativa de polarização disseminada por esse grupo nas redes sociais: “Como é razoável que 1% da população faça esse inferno na internet dizendo que nós estamos colocando ‘nós contra eles’? Nós quem? 99% contra 1%? Como assim?”, questionou.
O ministro também apontou a injustiça do sistema tributário brasileiro, destacando que essa minoria privilegiada contribui proporcionalmente menos que a maioria da população: “Esse 1% não quer pagar nem o que os outros 99% pagam.”
Para Haddad, a desigualdade é o principal freio ao desenvolvimento contínuo do país. Ele associou o fenômeno do “voo de galinha” — expressão usada para descrever ciclos curtos de crescimento econômico — à baixa renda da população. Para ele, o Brasil não consegue decolar porque as pessoas não têm renda.
Brasil ainda está entre as piores economias do mundo do ponto de vista da igualdade social, disse Haddad
Durante a entrevista, o ministro compartilhou dados de um estudo recente que revelam a gravidade da situação brasileira no contexto global: apenas sete entre 54 países africanos analisados possuem níveis de desigualdade superiores aos do Brasil. Ele ainda lembrou que a América Latina é considerada a região mais desigual do planeta — e o Brasil contribui fortemente para esse cenário.
Mesmo com o retorno do país ao grupo das dez maiores economias do mundo, Haddad fez um alerta: o bom desempenho macroeconômico não se traduz automaticamente em justiça social. “Nós devemos comemorar o fato de que, de novo, nós estamos entre as dez maiores economias do mundo, de novo com o governo Lula, mas nós continuamos entre as dez piores economias do mundo do ponto de vista da igualdade social, da distribuição de renda”, declarou.
Encerrando sua fala, o ministro fez um apelo para que o país enfrente suas raízes coloniais de desigualdade: “Olha, ou a gente começa a colocar o dedo nas feridas históricas do Brasil, eu estou falando de feridas de 500 anos.”
Somos 99%
O fundador do Instituto Conhecimento Liberta (ICL), Eduardo Moreira, lançou, no ICL Notícias — 1ª edição desta segunda-feira (7), um manifesto contra privilégios de 1% da população que concentra 63% da riqueza do Brasil e de abusos de políticos fisiológicos, servidores que recebem supersalários. O movimento foi intitulado de “Somos 99 por cento”, e quem quiser aderir ao abaixo-assinado deve acessar o site 99porcento.com.br.
A campanha luta pelo fim dos supersalários; o fim da farra das emendas secretas; a diminuição dos impostos dos trabalhadores e o pagamento de uma parcela justa por parte do 1%; o fim da impunidade dos deputados e senadores; uma campanha nacional de divulgação do Portal da Transparência; punições severas para políticos, juízes, banqueiros, militares e empresários que agirem fora da lei; o pagamento das dívidas dos grandes donos de terras e das grandes empresas; o fim dos subsídios fiscais bilionários para as grandes empresas; e a proibição de eventos ‘vergonhosos’ e ‘sem transparência’.
“O Brasil precisa de coragem para romper com os privilégios, enfrentar os abusos e devolver o Estado ao povo. Não aceitaremos mais um país em que poucos concentram riquezas e benefícios, enquanto a maioria paga a conta”, diz o manifesto da campanha.
“Chegou a hora de moralizar o Judiciário, o Legislativo e o Executivo. De construir um Estado ético, justo e transparente… Este manifesto é um chamado: para quem não aceita mais a desigualdade, para quem não aguenta mais privilégios e corrupção, para quem acredita que o Estado deve servir ao povo — e não o contrário”, completa.
No site, é possível baixar vídeos da campanha para serem compartilhados. Além disso, a campanha pede que o manifesto seja divulgado nas redes sociais com o uso da hashtag #somos99.