por NCSTPR | 08/10/25 | Ultimas Notícias
A mais recente atualização da lista suja do trabalho escravo, publicada semestralmente pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aponta para um aumento de 20% sobre a relação anterior no número de autuados. Ao todo, 1.530 trabalhadores foram resgatados dessa forma de exploração, a maioria no ramo agropecuário.
A lista foi divulgada nesta segunda-feira (6) e traz casos registrados entre 2020 e 2025. O documento é composto por 159 empregadores, sendo 101 pessoas físicas e 58 pessoas jurídicas. Entre as atividades econômicas, destacam-se a criação de bovinos para corte (20 casos), os serviços domésticos (15), o cultivo de café (9), extração e britamento de pedras (9), construção civil (8) e produção de carvão vegetal em florestas plantadas (7).
Do total, 16% das inclusões estão relacionadas a atividades econômicas do meio urbano. Os estados com maior número de inclusões foram Minas Gerais (33), São Paulo (19), Mato Grosso do Sul (13) e Bahia (12).
A lista resulta da fiscalização feita pela Inspeção do Trabalho, que atua em todo o país e envolve a Auditoria Fiscal do Trabalho (AFT), Polícia Federal (PF), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU) e, eventualmente, outras forças policiais.
Durante as ações de inspeção em que são encontradas pessoas submetidas a condições análogas à escravidão, são lavrados autos de infração para cada irregularidade trabalhista identificada, além de auto de infração específico que caracteriza a submissão de trabalhadores a essas condições.
De acordo com o MTE, a inclusão no cadastro só ocorre após a conclusão de processos administrativos, nos quais são assegurados aos autuados o direito ao contraditório e à ampla defesa. Os nomes permanecem publicados por dois anos. Nesta atualização, além das novas inclusões, foram excluídos 184 empregadores que já haviam completado esse período.
A lista suja foi criada em 2003, na primeira gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como forma de combater o trabalho escravo expondo aqueles que o utilizam.
A publicação da lista sofreu percalços nos últimos anos e chegou a ser suspensa até decisão judicial sobre sua constitucionalidade, reconhecida em 2020 pelo Supremo Tribunal Federal.
Em 2024, o governo federal realizou 1.035 ações de fiscalização de combate a esse tipo de exploração, que resultaram em mais de dois mil resgates. No ano anterior, mais de 3,1 mil trabalhadores foram retirados dessas condições, maior número em 14 anos, segundo dados oficiais.
Desde a criação do Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM), há 30 anos, mais de 68 mil trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão e mais de R$ 156 milhões foram pagos em verbas salariais e rescisórias diretamente às vítimas durante as operações.
VERMELHO
https://vermelho.org.br/2025/10/06/lista-suja-do-trabalho-escravo-tem-159-empregadores-maioria-da-area-rural/
							
 por NCSTPR | 08/10/25 | Ultimas Notícias
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a JBS S/A a indenizar a viúva e o filho de um motorista carreteiro que faleceu por covid-19 após ter contraído o vírus em uma viagem pela empresa. Para o colegiado, ficou evidente o risco acentuado de contaminação, em razão do tráfego em vias públicas e do contato com diversas pessoas.
Contaminação coincidiu com viagem
Com base no interior de São Paulo, o motorista transportava carga viva e viajou a trabalho entre 19 e 23 de maio de 2021. Os sintomas da doença surgiram no último dia de viagem, e o teste positivo para covid-19 foi feito em 25 de maio. Ele foi internado em 1º de junho diretamente na UTI, onde faleceu oito dias depois.
Na ação trabalhista, a viúva e o filho do trabalhador alegaram que, como a atividade era considerada essencial, a JBS não suspendeu suas operações durante todo o período de emergência da pandemia. A viagem ocorreu numa fase crítica, em que ainda estava no início o processo de vacinação e ocorriam muitas mortes. Uma das fotos anexadas ao processo mostra uma operação de carga de bois em que apenas o motorista usava máscara.
Para instâncias anteriores, covid-19 não é doença ocupacional
O pedido de indenização foi rejeitado no primeiro grau e no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP). Para o TRT, a atividade do motorista não é de risco para a doença, e a contaminação pelo coronavírus não se enquadra como doença ocupacional.
Empresa tem responsabilidade objetiva
Contudo, o relator do recurso de revista da família, ministro Freire Pimenta, afirmou que a atividade era de risco sim, pois se tratava de um serviço essencial mantido durante o isolamento e, logicamente, expunha o empregado a risco maior de contaminação.
Sobre a equiparação à doença ocupacional, o ministro lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional a parte da Medida Provisória 927/2020 que excluía a contaminação pelo coronavírus da lista de doenças ocupacionais. A tese fixada foi a de que, nos casos em que a atividade apresentar exposição habitual a risco especial, a responsabilidade indenizatória do empregador é objetiva, e não é possível transferir ao trabalhador a obrigação de provar a relação entre o trabalho e a doença.
Mortalidade foi elevada em atividades essenciais
Ainda conforme o relator, um relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revelou que, durante a pandemia, as taxas de mortalidade em atividades essenciais (entre elas o transporte de carga) foram bem mais altas que nas não essenciais.
Sob outro ângulo, de acordo com o Ministério da Saúde, o tempo entre a exposição ao vírus e o início dos sintomas varia de um a 10 dias, com uma média de três a quatro dias. Isso leva à conclusão de que o motorista foi contaminado durante a viagem.
Por unanimidade, a Turma condenou a JBS a pagar indenização por danos morais de R$ 100 mil para cada familiar e pensão mensal, no valor de 2/3 da remuneração do motorista na época do falecimento. O valor por danos materiais será dividido entre a viúva e o filho até que este complete 25 anos. A partir daí, a quantia será recebida de forma vitalícia pela viúva.
Acompanhe o andamento atualizado do processo neste link:
Processo: RRAg-11285-87.2022.5.15.0062
TST JUS
https://www.tst.jus.br/en/-/frigorifico-devera-indenizar-mulher-e-filho-de-motorista-que-morreu-de-covid-19
							
 por NCSTPR | 08/10/25 | Ultimas Notícias
O governo Lula se prepara para bancar outra agenda de interesse popular no Congresso Nacional. Depois do Projeto de Lei Nº 1087/25 – o “PL do Imposto de Renda Zero”, que foi aprovado na última quarta-feira (1º/10), por unanimidade, na Câmara dos Deputados –, a prioridade será o fim da escala 6×1.
As duas pautas têm apoio maciço dos brasileiros. Em dezembro de 2024 – quando a proposta de proibir a escala 6×1 ganhou visibilidade nacional –, 64% dos brasileiros já eram favoráveis à mudança, conforme pesquisa Datafolha.
Embora nenhum dos projetos em tramitação na Câmara dos Deputados ou no Senado tenha partido do Executivo, a população associa a medida ao governo federal. Em junho, um levantamento da Quaest mostrou que o fim da 6×1 era o “projeto mais conhecido” do terceiro governo Lula. A popularidade da proposta pesou na hora de Lula “bater o martelo”.
Por ora, os holofotes continuarão sobre a isenção no Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil. É o tempo de o projeto ser votado no Senado, voltar para a Câmara (em caso de alteração no texto pelos senadores) e ser sancionado pelo presidente Lula.
Durante esse período, o governo tentará agilizar a aprovação da Medida Provisória (MP) do Gás do Povo no Senado. Além disso, já há um acordo entre o Planalto e a Câmara para pautar a Lei Orçamentária Anual (LOA) e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública.
Enquanto esses cronogramas são cumpridos, o governo retomará o debate sobre o fim da escala 6×1, a fim de viabilizar sua votação no primeiro semestre de 2026. Segundo a ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, a decisão política está tomada.
“Na pauta do governo”
Na última semana, Gleisi recebeu em seu gabinete parlamentares que apresentaram projetos ligados à questão de trabalho. A primeira foi a deputada Daiana Santos (PCdoB-RS), autora do PL 67/2025, que propõe limitar a carga de trabalho a até 40 horas semanais, com ao menos dois dias de repouso remunerado.
Ministra Gleisi Hoffmann se reuniu com as deputadas Daiana Santos e Erika Hilton
Em caráter simbólico, Daiana entregou uma cópia do projeto à ministra, que elogiou o texto. “Valorizar as trabalhadoras e os trabalhadores é compromisso do governo do presidente Lula. Vamos trabalhar juntas para que esse projeto avance”, assinalou.
Já na quinta-feira (2), Gleisi se reuniu com a deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), autora da PEC 8/2025, que prevê a redução da jornada para 36 horas semanais e o término da escala 6×1. Ela é também presidenta da Subcomissão Especial criada pela Comissão de Trabalho da Câmara “para debater e apresentar sugestões” nessa temática.
Após o encontro, Gleisi divulgou um vídeo para reafirmar a promessa do Planalto. “A gente já tem colocado na pauta do governo a contrariedade com a escala 6×1. O presidente Lula tem se manifestado – e nós temos de mudar o regime de trabalho”, declarou.
O próximo passo, de acordo com a ministra, é realizar uma ação coordenada junto aos parlamentares da base aliada: “Vamos nos organizar, chamar os nossos líderes aqui, nossos deputados e deputadas, nossos senadores e senadoras, para preparar essa pauta no Congresso Nacional e levar mais uma vitória ao povo trabalhador brasileiro”.
Para aprovar uma PEC, como a de Erika Hilton, são necessários três quintos dos votos na Câmara – o equivalente a 308 dos 513 deputados. Já a aprovação de um projeto de lei, como o de Daiana Santos, demanda maioria simples de votos.
Tropeços na Subcomissão
Na visão do governo, o início dos trabalhos da Subcomissão Especial na Câmara – com Erika na presidência e Daiana entre os membros suplentes – pode ser um trunfo para a luta. Contudo, é urgente que deputados favoráveis à mudança na legislação pressionem por avanços concretos. Criada em 25 de abril, mas instalada apenas em 19 de agosto, a Subcomissão tem 90 dias para apresentar um parecer sobre os impactos do fim da escala 6×1.
A escolha do relator – o deputado Luiz Gastão (PSD-CE) – foi frustrante. Integrante da “bancada empresarial”, Gastão é presidente da Fecomércio-CE (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Ceará). Suas posições em pautas sobre o mundo do trabalho são invariavelmente conservadoras. Em entrevista à CNN, Gastão afirmou que seu relatório será finalizado na segunda quinzena de novembro e pode incluir novidades, como a proposta de modelos flexíveis de jornada.
Outro tropeço da Subcomissão foi sua atabalhoada “descida às bases”. O primeiro debate público promovido pelo colegiado ocorreu na terça-feira (30/9), em São Paulo. O movimento sindical reclamou – com razão – que o convite para as entidades chegou “em cima da hora”. Não deu outra: o auditório do Sesc Santana estava vazio.
Para piorar, a Subcomissão fez uma injustificável deferência ao sociólogo e professor José Pastore, histórico aliado – e ideólogo – do empresariado. No debate, ele falou por 25 minutos e foi, de longe, o convidado com mais tempo de exposição. Um de seus argumentos disparatados foi o de que, sem a escala 6×1 e com jornada em 36 horas semanais, haverá retração econômica de 6,2% no País, com aumento de 22,2% no custo por hora de cada trabalhador.
Histórico
A proposta de acabar com a escala 6×1 não fazia parte do programa de governo de Lula, mas ganhou força em 2023, com a ascensão do Movimento VAT (Vida Além do Trabalho). Uma petição pública lançada naquele ano pelo grupo – e endereçado ao Congresso Nacional – recebeu quase 3 milhões de assinaturas. Entre as propostas do abaixo-assinado aos parlamentares, destacava-se a “revisão da escala de trabalho 6×1 e a implementação de alternativas que promovam uma jornada de trabalho mais equilibrada”.
No ano seguinte, Erika Hilton propôs a PEC para reduzir a jornada de trabalho para 36 horas semanais e proibir escalas com seis dias de atividade e apenas um de descanso numa mesma semana. A proposta foi apresentada oficialmente na Câmara em 25 de fevereiro com 234 assinaturas – 63 a mais que o necessário para protocolar uma PEC.
A reivindicação foi incorporada pelos movimentos sindical e social. Em abril deste ano, as Frentes Brasil Popular e Povo sem Medo anunciaram o Plebiscito Popular 2025, com o objetivo de promover uma grande consulta nacional sobre esta e outras propostas. Ao mesmo tempo, as centrais sindicais anunciaram que o fim da escala 6×1 seria uma das pautas do 1º de Maio.
Foi em 30 de abril, na véspera do Dia do Trabalhador, que Lula se comprometeu pela primeira vez com essa causa, num pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV. “Vamos aprofundar o debate sobre a redução da jornada de trabalho vigente no país, em que o trabalhador e a trabalhadora passam seis dias no serviço e têm apenas um dia de descanso”, disse o presidente. “Está na hora do Brasil dar esse passo, ouvindo todos os setores da sociedade, para permitir um equilíbrio entre a vida profissional e o bem-estar de trabalhadores e trabalhadoras.”
VERMELHO
https://vermelho.org.br/2025/10/06/apos-imposto-de-renda-zero-governo-lula-vai-priorizar-o-fim-da-escala-6×1/
							
 por NCSTPR | 07/10/25 | Destaque, Notícias NCST/PR
Foz do Iguaçu (PR), 04 de outubro de 2025
Com forte presença sindical e debates de alto nível, o 6º Congresso Estadual da Nova Central Sindical de Trabalhadores do Paraná (NCST/PR) reuniu, nos dias 3 e 4 de outubro, no Grand Carimã Resort & Convention Center, em Foz do Iguaçu, cerca de 100 congressistas representando mais de 70 sindicatos filiados. O encontro marcou a eleição da nova diretoria da Central, debates estratégicos para o futuro do sindicalismo e a aprovação da “Carta de Foz do Iguaçu 2025”, que define prioridades para os próximos anos.

A eleição da diretoria reconduziu ao cargo o sindicalista Denílson Pestana da Costa, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção do Mobiliário de Londrina, diretor da Fetraconspar e responsável pelos assuntos internacionais da Nova Central Nacional. Pestana foi reeleito com apoio unânime dos 50 delegados aptos a votar e destacou a importância da unidade do movimento sindical:
“As vitórias virão com o empenho de todos”, afirmou.
A mesa apuradora foi presidida por Wilson Pereira, diretor financeiro da Nova Central Nacional e presidente da Contratuh, representando o presidente nacional da Central, Moacyr Auersvald.

Debates sobre conjuntura e desafios
A programação do Congresso contou com palestras que abordaram os principais temas do cenário político, econômico e sindical do país.
O analista político André Luís dos Santos, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), apresentou a palestra “A pauta dos trabalhadores no Congresso Nacional e as eleições 2026”, destacando a importância de eleger parlamentares comprometidos com as pautas trabalhistas:

“Não podemos ter um Presidente com olhar voltado para as questões sociais e para os trabalhadores, se tivermos um Congresso de direita que não está alinhado com ações mais progressistas”, alertou.
Outro destaque foi a apresentação do advogado Sandro Lunardi Nicoladeli, doutor em Direito pela UFPR e especialista em Direito Sindical, que abordou os desafios do financiamento sindical e explicou o impacto do Tema 935 do STF, que trata do direito de oposição às contribuições decorrentes de negociações coletivas:
“A oposição deve ocorrer em assembleia, com prazo razoável após a formalização da convenção coletiva”, explicou Nicoladeli.
Carta de Foz do Iguaçu 2025: agenda estratégica

O Congresso aprovou a Carta de Foz do Iguaçu 2025, que reafirma o compromisso da NCST/PR com a unicidade sindical, a representação por categoria e a negociação coletiva como pilares do sindicalismo brasileiro.
Entre os principais eixos estratégicos, destacam-se:
- Regulamentação do trabalho em plataformas digitais, garantindo direitos previdenciários, jornada justa e proteção social.
 
- Combate à pejotização e à precarização das relações de trabalho.
 
- Defesa da redução da jornada de trabalho sem redução salarial e da recomposição dos pisos regionais.
 
- Fortalecimento da representação sindical, com novas secretarias para categorias emergentes, como motofretistas e trabalhadores de aplicativos.
 
- Promoção da igualdade de gênero, raça e juventude nas estruturas sindicais.
 
- Apoio à transição ecológica com geração de empregos verdes e participação ativa em fóruns internacionais, como a COP30.
 
- Mobilização permanente da base sindical e incentivo a candidaturas de representantes dos trabalhadores nas eleições de 2026 e 2028.
 
- Defesa do transporte público gratuito e de melhores condições para os servidores públicos estaduais e municipais.
 
A Carta também destacou a necessidade de campanhas para valorizar a atuação sindical e demonstrar o impacto econômico dos reajustes conquistados nas negociações coletivas.
Avaliação e perspectivas
Para Denílson Pestana, a reeleição da diretoria representa a continuidade de um trabalho coletivo:
“Nosso compromisso é fortalecer o sindicalismo, enfrentar a precarização do trabalho e garantir que as transformações tecnológicas e ambientais resultem em avanços para a classe trabalhadora”.
O evento reafirmou o papel histórico da NCST/PR desde sua fundação, em 2005, e reforçou a importância de articular as lutas trabalhistas em nível estadual, nacional e internacional, unindo forças por mais direitos, desenvolvimento econômico e justiça social.
Por um Paraná com trabalho decente, direitos garantidos e justiça social plena!
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
							
 por NCSTPR | 25/09/25 | Ultimas Notícias
Entrevista com Ludmila Costhek Abílio
“Quando se chega na discussão da plataformização, deve-se ter em mente que uma plataforma não é o que causa a informalidade. Falamos de empresas, não apenas de meios técnicos. Não é um aplicativo que faz brotar um milhão de motoboys no Brasil.” Esta fala da socióloga Ludmila Costhek Abílio, em entrevista à newsletter da Fundação Tide Setubal, ajuda na compreensão sobre as plataformas de mobilidade urbana e de entregas de alimentos serem um fator incontornável na precarização das condições trabalhistas.
O mercado de trabalho, em particular no que diz respeito aos direitos de pessoas trabalhadoras, é o tema de estudo da pesquisadora. Ludmila é pesquisadora independente, professora colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pesquisadora colaboradora do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (CESIT-Unicamp).
Desse modo, esse aspecto tem conexão direta e se retroalimenta com estrutura trabalhista que possibilita esse cenário. Um ponto inquestionável nesse contexto passa pela Reforma Trabalhista, cuja aprovação ocorreu em 2017. Algumas das suas consequências abrangem, entre outros pontos, o iminente risco de perda de direitos de profissionais contratados sob regime CLT. Idem o aumento da informalidade trabalhista.
Nesse sentido, o trabalho por meio de aplicativos de mobilidade urbana e de entregas destaca-se como um elemento emblemático. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), quase 600 mil pessoas trabalhavam por meio de aplicativos de entregas de alimentos. Ainda, 1,5 milhão de pessoas atuam por meio de aplicativos de mobilidade urbana. Alguns aspectos emblemáticos abrangem, então, os seguintes dados demográficos: o perfil médio é composto por homens, com idades entre 25 e 39 anos, com os ensinos médio ou superior incompletos.
Tais aspectos, assim como a queda da renda líquida e a vulnerabilidade na garantia de direitos, são pontos centrais na entrevista com Ludmila Costhek Abílio. Confira o diálogo.
O que se pode falar sobre a precarização do trabalho antes mesmo da plataformização?
Ludmila Costhek Abílio: Precisamos partir de uma discussão muito difícil, que atravessa a nossa vida, sobre o que é falar de precarização, flexibilização, ou uberização e plataformização, à luz da realidade social. A origem da organização do nosso mundo do trabalho vem do fato de termos sido colônia. A constituição do mundo do trabalho brasileiro passa por escravidão e outras formas de trabalho que coexistiam em um mundo colonial. A formação do mercado de trabalho dá-se na transição para um mercado no qual se compra e vende a força de trabalho. Essa estruturação ocorre em uma enorme desigualdade social, e em um mundo do trabalho regulado por meio da instituição de direitos do trabalho e sociais, mas nunca contemplará e se universalizará de fato.
Há, ainda, outra complicação: mesmo o mundo do trabalho formalizado não sendo sinônimo direto de justiça social, de igualdade e proteção, mais da metade da população trabalhadora é remunerada com um salário mínimo, um salário mínimo e meio. O salário mínimo não é digno, pois é aquém do mínimo para garantir a sobrevivência da pessoa trabalhadora e de sua família. Além do rebaixamento da fonte de trabalho, mulheres negras, seguidas de homens negros, compõem a base da exploração do trabalho no Brasil e estão nas ocupações mais precárias, predominam na informalidade e terão menores salários. Mesmo quando acessam ocupações melhor remuneradas, estarão em desigualdade em relação aos brancos.
Quando se começa a falar em precarização e flexibilização do trabalho, é uma complicação para nós. O mundo nosso do trabalho, de saída, estrutura-se secularmente como precário e flexível no pior sentido da palavra – da desproteção, da ausência de garantias, da altíssima rotatividade.
Mas as relações de trabalho estão se transformando. As inovações tecnológicas possibilitam novos arranjos produtivos globalmente, mas só possibilitam a sua relação com as políticas. Isso compreende como o trabalho será regulado, a liberalização de fluxos financeiros e de investimento. São arranjos globais que estão acontecendo e reproduzem desigualdades também estruturadas em escala global. Quando se chega na discussão da plataformização, deve-se ter em mente que uma plataforma não é o que causa a informalidade. Falamos de empresas, não apenas de meios técnicos. Não é um aplicativo que faz brotar um milhão de motoboys no Brasil. Esse trabalho já acontecia e essas empresas, que operam por meio de plataformas, o subordinarão a essas novas formas.
Como a plataformização apresenta contradições entre o discurso do empreendedorismo e a prática?
Ludmila Costhek Abílio: Precisamos olhar para alguns aspectos muito importantes. O primeiro é algo que eu, Ludmila, direi sobre a importância do emprego formal – ele protege, é uma regulação e garante acesso a direitos. Outra coisa é o que o emprego formal significa na vida do trabalhador. Mesmo garantindo uma série de acesso a direitos e estabilidade, isso não significa que o trabalhador com emprego formal não enfrentou diversas injustiças sociais ou foi altamente explorado e humilhado. Quando o trabalhador não valoriza a CLT da mesma forma como eu, aqui da academia, ou outros atores da sociedade estão teoricamente valorizando, precisamos olhar para o que é o emprego formal no Brasil e o que queremos que seja – são coisas diferentes e como lutamos para ser de outra forma.
Há outro elemento, sobre o qual escrevi um artigo [Uberização: Do empreendedorismo para o autogerenciamento subordinado], que é uma tentativa de escapar da ideia de o trabalhador se ver como um empreendedor. Quando converso com um motoboy que fala sobre não querer ser CLT, ele não fala sobre a moto ser uma empresa ou ele ser dono de uma microempresa que se chama ‘Moto’.
Houve, a partir dos anos 1990, uma série de arranjos produtivos e formas de gerenciamento e controle do trabalho que transferem ao trabalhador uma série de elementos constituintes do processo de trabalho, entre os quais a gestão do tempo. Quando se trabalha em home office, não há mais o relógio de ponto, a sua casa vira seu local de trabalho, agendam-se as coisas de acordo com a forma como organizará o seu tempo. A flexibilização do trabalho veio à tona dentro da compreensão de que somos bons gerentes de nós mesmos. Mas não haver um relógio de ponto, um gerente e um local fixo não significa que a pessoa trabalhará menos. Pelo contrário: pode significar que trabalhará cada vez mais e menos pago pelas horas de trabalho, pois não haverá essa contabilização. Mas essa gestão foi transferida para nós.
A pessoa teme ficar desempregada e há uma série de mecanismos dentro da organização do trabalho que a amarra a metas. Idem a uma série de formas de determinação que lhe garantem ser produtiva, independentemente do turno do expediente – essa é outra discussão. Essas formas de gestão se apropriaram de algo muito importante para nós: a possibilidade de gerenciarmos a nossa própria vida – isso não significa que estamos livres. Precisamos entregar o relatório e bater a meta, e o motoboy precisa fazer tantas entregas para ganhar o mínimo necessário naquele dia. Mas a decisão de trabalhar de manhã, à noite ou até à 1h está na mão dele. Mas por que ele é subordinado? É o autogerenciamento. A pessoa se gerencia sob regras que não são gerenciadas por ela e cada vez tem menos poder de negociação.
Como as redes sociais estão inseridas nesse contexto, seja por meio de marketplaces ou do seu uso para divulgar bens e serviços, no aprofundamento da amadorização  da precarização? E como a regulação pode impactar esse cenário para, por exemplo, frear a precarização?
Ludmila Costhek Abílio: A regulação é urgente e necessária, mas precisamos também discutir o modelo, pois se cai no erro de dizer que se regular, melhora. A reforma trabalhista, por exemplo, é uma regulação – não é uma desregulação do trabalho e o Estado não se retirou. Pelo contrário: ele se fez mais presente na promoção da precarização do trabalho. Leis não são sinônimo de justiça social e isso deve estar muito claro. Elas não materializarão os interesses em disputa em um determinado momento histórico.
Podem-se ver muitos projetos de lei em torno da regulação da uberização que irão promover e legalizar essa forma de exploração. O que está no cerne da uberização do trabalho? É a transformação em trabalhador sob demanda. Ou seja, ele vira um fator de produção, pois recebe apenas enquanto estiver pelo tempo em que de fato trabalhar. Com isso, ele fica com o custo do tempo em que não “trabalha” dentro da jornada dele. Isso o transforma em um fator de produção, pois quando ele é sob demanda, não se garante mais nada, que ele ganhe tal valor pela hora de trabalho. Transfere-se para ele o tempo de não trabalho que corre dentro da jornada de trabalho.
O que é estar sob demanda? A empresa só remunera quando se é efetivamente produtivo. durante o tempo em que esperou pelo trabalho estando na praça, por exemplo, o custo é dele e não mais da empresa. Desresponsabiliza-se a empresa nesse contexto. Essa é a grande realização do capital: o sonho da luta entre capital e trabalho envolverá esse tempo inteiro, historicamente. Quem arca com o tempo no qual a força de trabalho não é produtiva de fato?
Pode-se garantir direito, licença maternidade ou acesso à previdência na regulação do trabalho, por exemplo. Mas se mantiver o que está no cerne da urbanização, legalizam-se a uberização do trabalho e uma nova concepção sobre qual é a responsabilidade do Estado e das empresas sobre o trabalhador. Se ele pode ser reduzido a um fator de produção e arcar com o tempo em que ele não é produtivo, é uma nova concepção histórica sobre o que é emprego formal e responsabilidade das empresas sobre os trabalhadores. Perdem-se as garantias. Não adianta dizer que a pessoa precisa ganhar o equivalente ao valor da hora mínima do salário mínimo. Mas ele ficou lá e produziu mais, mas ainda assim se rebaixa o valor da força de trabalho dele? Devemos, então, estar muito atentos. É muito difícil hoje e há muitas discussões sobre qual regulação protege o trabalhador nessa história toda.
Como a sociedade civil pode pressionar o poder público para atualizar a legislação para proteger direitos trabalhistas e estabelecê-los para profissionais que recorrem a plataformas?
Ludmila Costhek Abílio: Pode-se ver na academia um crescimento exponencial e uma geração de jovens pesquisadores muito engajada em compreender e desvendar o que está acontecendo. Pode-se ver os partidos e pessoas se elegendo. A uberização virou um veículo também de promoção de influências, de uma série de atores sociais que foram surgindo. Pode-se ver os projetos de lei em disputa no mundo. Trata-se de disputa em torno de quais políticas públicas podem ser desdobradas também. A questão da mobilidade urbana está muito ligada a essas questões. Idem sobre desenvolvimento tecnológico: fala-se muito em motoboys, bikeboys e nos motoristas da Uber, mas há um exército de trabalhadores invisíveis globalmente articulados e subordinados produzindo o que chamamos de inteligência artificial. É um trabalho invisível em âmbito social e muito difícil de localizar. Mas também há formas de organização coletiva que se estruturam.
Está tudo em movimento, mas estamos vendo também formas de organização política que se desdobram dessa nova forma de organização do trabalho. Por exemplo, desde o primeiro breque dos apps, em plena pandemia, em 2020, houve no país uma série de paralisações e de organizações dos entregadores. Vemos também esses trabalhadores se organizarem. É uma batalha muito dura, pois um trabalhador sob demanda não tem ganho quando não trabalha – ele não tem nada garantido. Há um exército de trabalhadores disponíveis. Já para o cara que trabalhou naquele dia, a empresa faz uma série de incentivos e ele está ganhando o dobro. Essa mobilização é muito difícil. Ainda não temos dados sobre o último breque, mas há vários indícios de que foi muito grande e paralisou uma série de entregas de restaurantes que não funcionaram. Houve consumidores que aderiram. Essas coisas estão em movimento.
Mas é necessário entender que a uberização é uma apropriação de características estruturantes. Devemos pensar na uberização na sua relação com todas as outras formas de exploração do trabalhador, em como tudo isso está articulado, e enfrentar e pensar nos elementos que estruturam as nossas desigualdades e as várias formas de exploração do trabalho que se articulam. Mas tudo está em movimento.
DM TEM DEBATE
https://www.dmtemdebate.com.br/devemos-pensar-em-como-a-uberizacao-se-relaciona-com-todas-as-outras-formas-de-exploracao-do-trabalhador-entrevista-com-ludmila-costhek-abilio/