NOVA CENTRAL SINDICAL
DE TRABALHADORES
DO ESTADO DO PARANÁ

UNICIDADE
DESENVOLVIMENTO
JUSTIÇA SOCIAL

Operário com hérnia de disco obtém aumento de indenizações

Operário com hérnia de disco obtém aumento de indenizações

Notícias do TST

Resumo:

  • Um conferente de materiais da Volkswagen desenvolveu hérnia de disco que resultou em incapacidade parcial e permanente para tarefas que exigiam esforço físico.
  • A 7ª Turma do TST condenou a montadora a pagar indenização de R$ 80 mil por danos morais e pensão mensal equivalente a 50% do último salário até o trabalhador completar 78 anos de idade, aumentando os valores fixados no TRT.
  • A fixação do montante se baseou em casos semelhantes e nas circunstâncias do caso concreto.

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Volkswagen do Brasil Indústria de Veículos Automotores Ltda., de São Bernardo do Campo (SP), a pagar R$ 80 mil de indenização a um conferente de materiais, além de pensão mensal correspondente a 50% do seu último salário até que ele complete 78 anos de idade. Segundo o colegiado, as tarefas realizadas na montadora contribuíram para o desenvolvimento de hérnia discal na coluna lombar, o que gerou incapacidade parcial e permanente para a atividade.

Lesão na coluna exigiu remanejamento

Na reclamação trabalhista, o empregado disse que trabalhou para a Volkswagen de 1989 a 2013. Seu trabalho era conferir, revisar e transportar peças de uma caçamba para outra, o que exigia movimentos repetitivos como curvatura da coluna e flexão e extensão dos braços. Entre 2007 e 2009, teve de ficar afastado para se submeter a uma cirurgia de coluna. Depois disso, foi remanejado para outra área, em que fazia a conferência visual de peças, porque não tinha mais condição de fazer o trabalho anterior.

Trabalho não foi única causa da doença

O juízo de primeiro grau condenou a montadora a pagar R$ 200 mil de indenização e pensão mensal vitalícia de 100% do salário. Com o deságio em razão do pagamento em parcela única, o montante seria de R$ 884 mil. O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), porém, reduziu a indenização por danos morais para R$ 30 mil e a pensão para a metade, de 12,5% do salário do operador. O percentual corresponde à incapacidade do trabalhador para qualquer atividade, e o desconto se deu porque o trabalho foi apenas uma das causas da lesão. O resultado, com o deságio, daria R$ 25 mil.

No recurso de revista, o operário sustentou que os valores eram irrisórios e desproporcionais em relação à redução de sua capacidade de trabalho e incompatíveis com a capacidade econômica da Volkswagen.

Fixação da indenização leva em conta precedentes e caso concreto

O relator, ministro Agra Belmonte, explicou que a lei não estabelece parâmetros objetivos para quantificar a indenização por danos morais, cabendo ao juiz ficar atento à proporcionalidade e à razoabilidade, levando em conta aspectos como a intensidade da culpa e do dano e as condições econômicas e sociais da vítima e do ofensor. Após a fixação do valor, a intervenção do TST só se dá se a indenização for irrisória ou excessiva.

Segundo Belmonte, para definir o que é irrisório ou excessivo, o TST aplica o chamado método bifásico: na primeira fase, define-se  o valor básico ou inicial da indenização, com base em precedentes em casos semelhantes. Na segunda, ajusta-se o montante às peculiaridades do caso com base nas suas circunstâncias.

O relator utilizou estes critérios para sugerir a elevação da indenização por danos morais para R$ 80 mil.

Pensão mensal corresponde à perda da capacidade para a atividade exercida

Em relação aos danos materiais, o ministro ressaltou que o percentual da indenização deve corresponder ao da diminuição da capacidade de trabalho em relação ao ofício anteriormente exercido, e não para qualquer atividade de trabalho. No caso, o conferente teve de ser realocado em posto compatível, concluindo-se que tinha incapacidade total e definitiva para sua atividade anterior.

Com isso, seria devida a pensão mensal integral, equivalente a 100% da última remuneração, independentemente da readaptação. “No entanto, como houve concausa, a empresa deverá arcar com a indenização na medida de sua responsabilidade, ou seja, 50% do último salário recebido pelo trabalhador”, concluiu.

(Guilherme Santos/CF)

Processo: RRAg-1002339-20.2014.5.02.0461 

Esta matéria é  meramente informativa.
Permitida a reprodução mediante citação da fonte.
Secretaria de Comunicação Social
Tribunal Superior do Trabalho
Tel. (61) 3043-4907
//secom@tst.jus.br/” target=”_blank”>secom@tst.jus.br

TST JUS

https://tst.jus.br/-/oper%C3%A1rio-com-h%C3%A9rnia-de-disco-obt%C3%A9m-aumento-de-indeniza%C3%A7%C3%B5es

Operário com hérnia de disco obtém aumento de indenizações

STF: Incitação ao descumprimento dos direitos sociais

Opinião

Há muito a questão trabalhista deixou de ser um tema jurídico nas manifestações a respeito proferidas por ministros do STF.

Jorge Luiz Souto Maior

FonteA Terra é Redonda

Os posicionamentos adotados pela maioria dos ministros do STF, em matéria trabalhista, são orientados por uma compreensão de cunho econômico de índole neoliberal que é, como se sabe, arredia à efetividade dos direitos sociais e, também, uma afronta ao projeto de Estado Social fixado na Constituição Federal.

Não se encontra um fundamento jurídico sequer em tais decisões. São sempre argumentos fincados em um sentimento pessoal marcado pela aderência aos interesses do poder econômico e por ofensas aos trabalhadores e trabalhadoras, à Justiça do Trabalho e ao Ministério Público do Trabalho.

A fragilidade dos argumentos jurídicos das decisões proferidas pelo Supremo no campo trabalhista tem proporcionado a proliferação de muitas críticas e até preservado uma postura judiciária com reiterados posicionamentos em sentido contrário.

Talvez por isso, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, tentando conferir fundamento para as posições assumidas pelos ministros do STF, resolveram trazer novos elementos argumentativos ao “problema”, mas, com isto, só conseguiram piorar a situação.

Inauguraram a fase da incitação ao descumprimento dos Direitos Sociais.

Em 12 de outubro de 2024, durante o II Fórum Esfera Internacional, em Roma, na Itália, falando a representantes do setor econômico (Eugenio Mattar – Localiza); Daniel Vorcaro – Banco Master; Flavio Cattaneo – ENEL; Roberto Azevêdo – Ambipar; Lucas Kallas – Cedro Participações; Alberto de Paoli – “Diretor de Resto do Mundo na Enel”; José Antônio Batista – Picpay; Fábio Coelho – Google; João Adibe – Cimed; Carlos Sanchez – Grupo NC; Wesley Batista – Grupo J&F; Rubens Menin – MRV, CNN Brasil e  BancoInter; o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luís Roberto Barroso, disse que as dificuldades que os empresários enfrentam no Brasil é resultado de uma “legislação trabalhista complexa e, muitas vezes, desatualizada”.

Sem demonstrar, de forma específica, o que seria a tal complexidade e, também, se esquecendo, sintomaticamente, que a legislação trabalhista sofreu recentemente enormes alterações, todas elas, inclusive, atendendo as demandas do setor empresarial, Luís Roberto Barroso foi além e praticamente justificou o cometimento das ilegalidades por parte dos empregadores, afirmando que a “estrutura legal dificulta o cumprimento das normas”.

Para o ministro, se o empregador não cumpre a lei a culpa é da lei. Então, estaria dado a cada cidadão, a cada cidadã e a cada empresa do país o “direito” de deixarem de cumprir a lei sob a consideração subjetiva de ser ela “complexa”. Mais ainda, estaria possibilitada aos julgadores e julgadoras a prerrogativa de não aplicar uma lei com o argumento da sua “complexidade” ou da sua “desatualização”, como, aliás, vêm fazendo os ministros do STF nas questões relativas aos direitos trabalhistas, cabendo lembrar que, no que se refere ao tema trabalhista, o que estão “afastando” não são apenas leis, mas, sobretudo, normas integradas à Constituição Federal no Título dos Direitos Fundamentais.

E o pior é que preconizam isto em nome da “segurança jurídica”!

Segundo Luís Roberto Barroso, a visão antiquada e atrasada que ainda persiste em relação aos empresários e à livre iniciativa no Brasil é o que prejudica o desenvolvimento econômico e a inovação, criando um ambiente de insegurança jurídica que afasta investimentos e limita o crescimento do país. Sendo assim, basta dizer que se tem em mente uma visão não antiquada e não atrasada para que o agente esteja livre para deixar de aplicar a lei e a Constituição.

Além disso, para atrair investimentos e “promover o desenvolvimento econômico e a inovação”, o ministro oferece, de forma explícita, uma “segurança jurídica” para a quebra do pacto constitucional firmado em torno da dignidade humana; dos valores sociais da livre iniciativa; da prevalência dos Direitos Humanos; da construção de uma sociedade livre, justa e solidária; da erradicação da pobreza e da marginalização; da redução das desigualdades sociais; da promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação; da função social da propriedade; da ordem social baseada no primado do trabalho, tendo como objetivo o bem-estar e a justiça sociais; da ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.

E nesta “missão” Luís Roberto Barroso não estava só. O acompanhavam, dentre outras, as seguintes autoridades: o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG); o presidente do Tribunal de Contas da União, Bruno Dantas; o ministro do STF, Dias Toffoli; o procurador-geral da República, Paulo Gonet; o ministro da Justiça da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski; o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira; o senador Davi Alcolumbre (União-AP); o senador Ciro Nogueira (PP-PI); o deputado federal Dr. Luizinho (PP-RJ); a embaixadora Carla Barroso; o embaixador Renato Mosca; o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues; o diretor comercial da Infraero, Tiago Chagas Faierstein; e o diretor da Agência Nacional de Transportes Terrestres, Lucas Lima.

Oportuno perceber o quanto este fato revela como o poder econômico internacional assume sua índole predatória e exploratória, notadamente, com relação aos países da periferia do capital.

No contexto desse estreitamento de laços entre o capital e as instituições públicas nacionais, o ministro Luís Roberto Barroso, em sua manifestação, mais do que justificar o descumprimento da lei, acabou por incitar o cometimento de ilegalidades no campo das relações de trabalho, atingindo, igualmente, a esfera dos crimes contra a ordem tributária, vez que as fraudes aos direitos sociais representam modalidade de sonegação fiscal, em termos de tributos e contribuições sociais, o que, de certo modo, nos remete ao conteúdo do art. 286 do Código Penal.

E o efeito tributário das ilegalidades trabalhistas é, por certo, de pleno conhecimento dos ministros do STF, como demonstrado, inclusive, na fala do ministro Alexandre de Moraes, expressa na sessão de julgamento do dia 22 de outubro.

Novamente instingando uma confusão entre terceirização e “pejotização”, Alexandre de Moraes, para o delírio da grande mídia ávida por fake news em matéria trabalhista, assim se expressou: “A terceirização: naquele momento todos concordam em assinar, até porque se paga muito menos imposto do que pessoa física. Depois que é rescindido o contrato aí vem a ação trabalhista. Só que, e talvez, se a jurisprudência começasse a exigir isso nós não teríamos tantas reclamações. Aquele que aceitou a terceirização e assinou contrato quando é rescindido o contrato e entra com a reclamação ele deveria também recolher todos os tributos como pessoa física. Aí talvez nós não tivéssemos mais ou o primeiro problema, aceitar a terceirização, ou o segundo, entrar com a reclamação. Porque é algo que não, eu diria, bate no final, porque, na Justiça do Trabalho acaba ganhando a reclamação, só que recolheu todos os tributos lá atrás como pessoa jurídica e depois ele ganha todas as verbas como pessoa física. Ou é pessoa jurídica ou pessoa física. Ou terceirizou, ou não terceirizou…”

Trocando em miúdos, o ministro sabe que a “pejotização”, mal referida por ele como “terceirização”, gera o pagamento de impostos a menor.

Só que isto, primeiro, não é um “benefício” que atinge apenas o trabalhador, como sugerido. A empresa que se vale dos serviços de uma pessoa natural por meio da formalização de um contrato com a pessoa jurídica criada por aquela mesma pessoa, é “beneficiada” de diversas formas, seja pelo não cumprimento das regras de proteção trabalhista, incluindo o FGTS, que possui uma relevante função social; seja pelo recolhimento a menor de vários tributos e contribuições sociais.

Em segundo lugar, não se trata, propriamente, de uma opção que as pessoas natural ou jurídica tenham, a de recolher, ou não, na integralidade, os tributos e as contribuições sociais. A incidência tributária decorre de lei e implica obrigações das quais os atingidos não podem simplesmente fugir, ainda mais buscando estratégias fraudulentas para tanto. De fato, constitui crime a prática de quaisquer formas de se tentar impedir a aplicação das obrigações tributárias.

Nos termos da Lei n. 8.137/90, que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, os atos que visam suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, são definidos como crimes e são identificados, dentre outras, nas seguintes condutas: (i) omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; (ii) fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; (iii) falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo a operação tributável; e (iv) elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato (art. 1º).

Estabelece, ainda, que constitui crime da mesma natureza: (a) fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo; (b) deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos (art. 2º).

Além disso, como expresso por André Gustavo Souza Fróes de Aguilar, no texto “Pejotização: fraude, riscos tributários e criminais para empregados e empregadores”, vários outros são os tipos penais aplicáveis à situação em que se tenta, por meio da “pejotização”, evitar o integral pagamento de tributos e contribuições sociais.

Conforme elucida André Fróes Aguilar, “não cabe aos particulares decidirem quanto à existência ou não de relação empregatícia, assim como não lhes é possível afastar os efeitos tributários decorrentes das relações que estabelecem, conforme o disposto no artigo 123 do Código Tributário Nacional – CTN (Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – publicada no DOU de 27 de outubro de 1966 e retificada no DOU de 31 de outubro de 1966)”, que assim dispõe: “Art. 123. Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes.”

Na “pejotização”, que é, como se sabe, a transformação artificial de uma pessoa natural em uma pessoa jurídica, para gerar a impressão de que não há trabalho executado pelo(a) trabalhadora(a) e sim um serviço prestado por sua empresa individual, o que se promove é uma autêntica tentativa de burlar a incidência tributária, pois as notas fiscais emitidas pela pessoa jurídica constituem, na verdade, recibos remuneratórios.

Além disso, a transformação artificial de uma pessoa natural em pessoa jurídica se encaixa perfeitamente na hipótese fixada no inciso I do art. 1º da Lei n. 4.729/65, constitui crime de sonegação fiscal, “prestar declaração falsa ou omitir, total ou parcialmente, informação que deva ser produzida a agentes das pessoas jurídicas de direito público interno, com a intenção de eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributos, taxas e quaisquer adicionais devidos por lei”.

Da mesma forma, nos artigos 71, 72 e 73 da Lei n. 4.502/64: “Art. 71. Sonegação é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, o conhecimento por parte da autoridade fazendária: (1) da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natureza ou circunstâncias materiais; (2) das condições pessoais de contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tributária principal ou o crédito tributário correspondente”.

“Art. 72. Fraude é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou a excluir ou modificar as suas características essenciais, de modo a reduzir o montante do impôsto devido a evitar ou diferir o seu pagamento.”

“Art. 73. Conluio é o ajuste doloso entre duas ou mais pessoas naturais ou jurídicas, visando qualquer dos efeitos referidos nos artigos. 71 e 72.”

E vale insistir: o trabalhador não impõe à empresa contratante a condição de que só aceita o serviço se for perante o disfarce da pessoa jurídica. É a empresa contratante que, detendo o poder econômico e o império da lei da oferta e da procura, determina qual será a forma de contratação, sendo, portanto, responsabilidade integral sua o cometimento da prática ilícita.

No entanto, Alexandre de Moraes, desconsiderando a realidade; desprezando o conjunto de normas jurídicas aplicáveis à situação concreta em que a “pejotização” se apresenta comprovadamente como uma forma de burlar a aplicação da legislação trabalhista, previdenciária e tributária; e fazendo vistas grossas aos efeitos punitivos, inclusive de ordem criminal, ao ardil praticado, enxerga a situação apenas como uma oportunidade para expressar uma espécie de reprimenda moral pública à conduta do trabalhador, chamando-o, com outras palavras, de falso, desonesto ou hipócrita, para, com isto, tornar legitimas e justificadas todas as ilegalidades cometidas pela empresa contratante.

Na lógica do ministro, uma vez que o trabalhador auferiu o benefício indevido de pagar um imposto a menor, deve ser punido com o não recebimento de direitos trabalhistas. Uma lógica, portanto, que remete ao período da anomia jurídica do “olho por olho” e que implica no efetivo descumprimento do dever funcional de aplicar o direito aos fatos. Alexandre de Moraes afastou a aplicação das normas ao caso sob julgamento e, pior, manteve sem qualquer repercussão punitiva os diversos delitos cometidos pela empresa na fraude intentada contra os direitos trabalhistas, previdenciários e tributários.

A atitude, além disso, reflete um sentimento de punir o trabalhador pelo fato de ter acionado o Poder Judiciário, que, aliás, foi tratado pelo ministro como um “problema”, e isto é muito grave porque fere de morte o preceito básico da cidadania que é o direito constitucional de ação.

A campanha de Luís Roberto Barroso contra o que vem denominando de “conflitualidade excessiva” tem provocado uma autêntica ojeriza de ministros aos trabalhadores e trabalhadoras (reclamantes) em processos trabalhistas, como se fossem eles e elas, pelo simples fato de moverem a máquina judiciária do Estado, criminosos(as) ou, no mínimo, pressupostos(as) litigantes de má-fé, ao mesmo tempo em que se reserva às empresas a qualidade de vítimas inocentes, carregadas de todas as virtudes.

É importante perceber que esse modo de racionalizar as relações de trabalho está estritamente ligado aos argumentos que se utilizavam para justificar a escravização primeiro de indígenas, depois, em concomitantemente, de povo africanos traficados para o Brasil. O rebaixamento moral imposto aos trabalhadores e trabalhadoras está diretamente ligado ao sentimento de que pessoas negras e pobres podem ser exploradas sem qualquer limite e que sequer podem reclamar o respeito a seus Direitos enquanto seres humanos, ainda mais quando “aceitam” as condições que lhe são impostas pelo escravista, ou melhor, contratante.

O racismo, tragicamente, continua dominando as mentes da classe dominante no Brasil, em todas as esferas de atuação institucional e na vida privada em geral.

Para completar o quadro de atemorização relativo ao direito de ação, no dia 22 de outubro, o Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, por unanimidade, a proposta de recomendação apresentada pelo presidente Luís Roberto Barroso, que regula, segundo expresso no documento, a litigância abusiva ou predatória, trazendo, em anexo, uma “lista exemplificativa de condutas processuais potencialmente abusivas”, todas elas (vinte ao todo) relacionadas à petição inicial, ou seja, nada que cuide da postura do demandado.

O Conselho Nacional de Justiça assume que os problemas estruturais do Judiciário (porque esta é uma das preocupações) serão solucionados com a inibição do acesso à justiça, deixando sem qualquer avaliação os devedores contumazes e agressores reincidentes e assumidos da legislação, notadamente na esfera trabalhista, para com isto, aliás, atender outra preocupação, a de liberar o setor econômico para se guiar sem qualquer limitação trazida na legislação social.

Tudo isto serve ao propósito, não disfarçado, de disseminar entre trabalhadoras e trabalhadores as sensações de impotência e de conformismo, gerando uma espécie de submissão consentida provada pelo desânimo e pelo medo de sofrer consequências ainda maiores caso reclamem.

Ao mesmo tempo, esta situação estimulada e legitimada pela mais alta Corte do Poder Judiciário, que repercute, por certo, nas demais instâncias, promove, entre os empregadores, a certeza de que não precisam mais de “reformas” na legislação para a retirada de direitos trabalhistas e o enfraquecimento dos sindicatos, pois, na prática, a legislação social não mais os constrange.

A ordem jurídica aplicável às relações de trabalho está lá consignada em diversos diplomas e, sobretudo, na Constituição Federal, mas é como se, na prática, não existisse.

Essa nova escalada de agressões aos Direitos Sociais revela ainda mais o sentimento que a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal possui com relação à classe trabalhadora e, por certo, o quanto está aliada aos interesses exploratórios e predatórios do poder econômico.

Ocorre que a instituição, Supremo Tribunal Federal, que está acima de seus integrantes, é a guardiã da Constituição e a este preceito os próprios ministros devem estar submetidos.

O massacre cometido pela maioria dos ministros do STF contra a classe trabalhadora é uma afronta à ordem jurídica e democrática. E se expressando por meio de uma cada vez mais agressiva inversão de valores, já está virando um caso de violência verbal explícita, atingindo, inclusive, a integridade de outras instituições republicanas, constitucionalmente asseguradas.

Parafraseando o próprio Alexandre de Moraes, se os ministros do STF aplicassem as leis e a Constituição Federal talvez não tivéssemos tanta sonegação e tanto desrespeito aos direitos sociais e trabalhistas. E, como ele próprio sugere, não há meio termo: ou se aplica, ou não se aplica!

Jorge Luiz Souto Maior é professor de direito trabalhista na Faculdade de Direito da USP.

DM TEM DEBATE

STF: Incitação ao descumprimento dos direitos sociais

Operário com hérnia de disco obtém aumento de indenizações

Terceirização da atividade fim não impede reconhecimento de vínculo

FRAUDE TRABALHISTA

O Supremo Tribunal Federal entendeu que a terceirização da atividade-fim não impede que seja reconhecida a relação de emprego, quando no caso a prática serviu à dissimulação de quem seria o verdadeiro empregador.

No caso julgado, o STF negou seguimento à reclamação 60.454, movida por uma rede de varejo contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) que reconheceu a relação de emprego entre a companhia e funcionários de uma oficina de costura contratada por uma empresa terceirizada.

O ministro Flávio Dino, relator da ação, afirmou em seu voto que a jurisprudência do STF que permite a terceirização não impede que seja reconhecida a relação de emprego nos casos em que esse tipo de contratação foi utilizado de forma fraudulenta.

“O que houve foi a conclusão de que, no caso concreto, estão presentes a dissimulação de quem seria o verdadeiro empregador e a verificação dos atributos específicos caracterizadores da relação de emprego”, afirmou o ministro em seu voto.

“Pontuo que nenhum dos precedentes vinculantes invocados impede o reconhecimento de relação de emprego em cada caso concreto. O vínculo empregatício não é compulsório, tampouco foi banido da ordem jurídica. Trata-se de análise específica, de lide com contornos próprios, e não de debate abstrato sobre tese jurídica”, sustenta o voto do ministro.

O julgamento na 1ª Turma do STF foi decidido por unanimidade, com os demais quatro ministros da Turma acompanhando o voto do relator.

AGU aponta fraude

A Advocacia-Geral da União atuou no processo e sustentou que houve fraude na terceirização das atividades de costura, o que levou à descaracterização desse tipo de contrato.

Dessa forma, a reclamação da empresa não poderia ser aceita pelo Supremo pois, no caso, não houve afronta à jurisprudência da Corte sobre a possibilidade de terceirização da atividade-fim, segundo defendeu a AGU em manifestação no processo. A reclamação é um tipo de ação apresentada quando decisões de outros tribunais contrariam o entendimento do STF.

Fiscalização do Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo constatou que a empresa terceirizada não possuía capacidade produtiva, como maquinário, capital social e funcionários, e passou a subcontratar oficinas de costura irregulares para confeccionar peças de roupa de linhas próprias da companhia varejista.

Além disso, os fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego averiguaram que as oficinais não estavam registradas em órgãos públicos e utilizavam mão de obra em condição análoga à escravidão, com trabalhadores estrangeiros sem documentação, aliciados em seu país de origem, mantidos em situação de servidão por dívidas e submetidos a condições degradantes de trabalho.

Relação de emprego

A decisão do TRT-2 que reconheceu a relação de emprego relata que a companhia possuía o controle sobre todas as etapas de produção da empresa terceirizada e que, de acordo com relatório de fiscalização, 90% da produção da empresa terceirizada era destinada à rede de varejo.

Com isso a Justiça do Trabalho reconheceu a presença de subordinação e dependência econômica, critérios necessários ao reconhecimento da relação de emprego.

A AGU atuou no processo representando a União na defesa dos atos praticados pelos auditores do trabalho que lavraram auto de infração contra a empresa varejista.

A advogada da União Priscila Piau, coordenadora-geral do Departamento de Controle Difuso da Secretaria-Geral de Contencioso (SGCT), ressalta a importância da decisão.

“Essa decisão representa uma vitória para a União ao garantir os direitos dos trabalhadores, especialmente se considerarmos o cenário jurisprudencial desfavorável que parecia estar se desenhando no âmbito do STF para casos envolvendo reclamações sobre terceirização”, afirma a advogada.

“Conseguimos demonstrar falta de estrita correlação entre a decisão reclamada e a apontada como paradigma nos casos em que caracterizada abuso no uso da terceirização.” Com informações da assessoria de imprensa do Advocacia Geral da União.

Rcl 60.454

CONJUR

Terceirização da atividade fim não impede reconhecimento de vínculo

Operário com hérnia de disco obtém aumento de indenizações

Lavajatismo é ideologia, não morreu e merece atenção, afirma Lenio Streck

MODO DE VIVER PREJUDICIAL

A “lava-jato” morreu, mas o lavajatismo, não. Esse é um alerta feito pelo jurista Lenio Streck durante evento na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo que abordou perspectivas sobre o impacto da força-tarefa de Curitiba na história recente do país, dos pontos de vista jurídico, geopolítico e midiático.

O lavajatismo, ressalta Streck, é uma ideologia. Durante a palestra, ele citou a aliança com a mídia, a colaboração do Judiciário e o papel do Ministério Público como fatores determinantes para o sucesso dessas ideias, além do modo de fazer Direito no Brasil. Juntando tudo isso novamente, há risco de retorno de práticas questionáveis de quem tem o poder de acusar.

Streck foi um dos primeiros a denunciar os abusos e as consequências da “lava-jato”, enfrentando Sergio Moro. O jurista rememorou alguns temas do debate, como o aviso de que o ex-juiz federal, agindo de forma parcial, causaria enormes estragos na democracia brasileira.

O jurista associou a dificuldade de criticar a “lava-jato” à Alegoria da Caverna de Platão. “As sombras são sombras. Tu dizia que ‘lava-jato’ era uma fraude. As famílias brigavam com você porque a ‘lava-jato’ era um modo de ser. Como você vai batalhar quando você tem uma foto com Caetano Veloso, Marcelo Freixo e Randolfe Rodrigues juntos com o Bretas? A gente está fadado a perder. Como a gente vai ganhar no discurso?”

Ele ainda comparou a “lava-jato” ao filme “Os Deuses Devem Estar Loucos”, comédia lançada em 1980 e dirigida por Jamie Uys. Trata-se da história de uma tribo que se envolve em confusões por causa de uma garrafa de refrigerante jogada de um avião. Para controlar a situação, o chefe do grupo determina que o objeto seja “jogado fora do mundo”. O objeto estranho à “lava-jato” foi a Constituição.

“Sergio Moro pegou a Constituição — que é um objeto absolutamente estranho na vida dele —, pegou um moleque, que era o Deltan Dallagnol [ex-coordenador da força-tarefa no Paraná], e disse assim: ‘O mundo é quadrado. Você vai atirar a Constituição para fora’. Ele (Dallagnol) está correndo até hoje.”

Para o jurista, evitar protagonismos é essencial para que ideologias como o lavajatismo não voltem a ter força. “Não podemos ter protagonistas e apostar nisso. A democracia vai mal quando alguém é protagonista. É que nem árbitro de futebol. Se ele apita bem ninguém dá bola. Agora, se ele é o cara, vai dar confusão. Hoje, nós dependemos do protagonismo do Judiciário, do Alexandre de Moraes — que virou um popstar nesse sentido.”

Os prejuízos resultantes da “lava-jato” surpreenderam muita gente, lembrou o jurista. “A mim, não. Fiquemos atentos e aprendamos com a história, que é a melhor professora. Não podemos ser a turma do ‘fundão’ na aula de história recente do Brasil.”

Também participaram do painel os professores Pierpaolo Bottini, da USP, e Jacinto Coutinho, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Clique aqui para assistir a íntegra do debate ou veja abaixo:


Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2023-out-29/lavajatismo-ideologia-nao-morreu-merece-atencao-afirma-streck

Operário com hérnia de disco obtém aumento de indenizações

TST tenta enfrentar descumprimento de precedentes do Supremo

DA PORTA PARA DENTRO

Por Brenno Grillo

O Tribunal Superior do Trabalho não vive seus melhores dias. Há um conflito interno porque parte dos ministros da corte está cada vez mais incomodado com colegas que usam de artifícios para fazer valer sua vontade, ignorando a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal para proteger o trabalhador a qualquer custo.

Um exemplo disso, segundo um ministro do TST, aconteceu em agosto, durante a sessão da SDC, onde se enfrenta dificuldade para fazer valer a jurisprudência definida pelo Supremo sobre “comum acordo” para propor dissídios coletivos. “Placar seria de 5 a 4 na linha do STF, se fosse votado, mas não deixam julgar”, lamentou um ministro do tribunal.

De acordo com outro ministro do TST, há uma espécie de “insubordinação” na cúpula da Justiça do Trabalho. Um dos exemplos é o da terceirização. O STF validou esse tipo de contratação nas atividades meio e fim. Mesmo assim, no TST, não há uniformidade. Quatro turmas do tribunal (1ª, 4ª, 5ª, 8ª) respeitam o precedente; outras quatro dizem que o STF limitou a aplicação da decisão apenas às situações sem subordinação direta.

Há também o caso do RMNR da Petrobras, considerado o maior da história da estatal. Se perdesse a ação, como aconteceu no TST, a empresa energética teria que desembolsar (em valores atualizados) por volta de R$ 46 bilhões em diferenças salariais a 51 mil funcionários, inclusive inativos.

A discussão sobre a Remuneração Mínima por Nível e Região começou com empregados da companhia passando a exigir supostas diferenças salarias sobre o cálculo que quantificava a remuneração extra que cada trabalhador receberia. O TST julgou o caso em junho de 2018, decidindo, por 13 a 12, que os adicionais previstos na Constituição e na legislação trabalhista não podem constar na base de cálculo da RMNR, apenas aqueles previstos em normas coletivas ou contratos individuais de trabalho.

Um ano depois, o ministro Alexandre de Moraes atendeu recurso da Petrobras e barrou o pagamento das supostas diferenças salariais. Moraes concordou que o pagamento do adicional foi feito de boa-fé pela Petrobras. Em fevereiro de 2022, no plenário virtual do STF, defendeu a anulação do acórdão do TST por entender que não houve inconstitucionalidade no pacto entre empresa e empregados pelo RMNR. Após pedido de vista da ministra Rosa Weber, presidente do Supremo, o caso foi retomado este ano, com vitória da companhia, por 3 a 1.

Reversões preocupam
Reversões de decisões como no caso da Petrobras, onde havia um entendimento do pleno do Tribunal Superior do Trabalho, são usadas como exemplos por integrantes da corte sobre os perigos de proteger demais o trabalhador. Mas há outros, como o da qualificação da relação envolvendo representantes comerciais e caminhoneiros autônomos.

O Supremo decidiu que a terceirização é lícita quando não subordinação direta, devendo prevalecer a negociação coletiva. “Antes da Reforma Trabalhista havia grande insegurança. Com a reforma, decidiu-se que o conteúdo é imune (Tema 1.046). Tem que se respeitar o negociado. Mas até hoje ainda vigora o protecionismo no TST”, lamenta outro ministro do tribunal.

O mal estar da desautorização ficou marcado para muitos ministros. “O esvaziamento da competência da Justiça do Trabalho é a reação do Supremo Tribunal Federal a esse cenário de distorção”, disse um deles.

Problema que se alastra
Essas resistências da cúpula têm lastro, podendo ser vistas em diversos casos e instâncias da Justiça trabalhista. No último dia 14, por exemplo, a Uber foi obrigada a registrar todos os seus motoristas ativos, sob pena de multa de R$ 10 mil para cada descumprimento, e a pagar R$ 1 bilhão em danos morais coletivos por não ter adotado o modelo de relação trabalhista desde que chegou ao Brasil.

A decisão foi tomada pela 4ª Vara da Justiça do Trabalho de São Paulo numa ação proposta pelo Ministério Público do Trabalho. Vale lembrar que Alexandre de Moraes já determinou ser competência da Justiça Comum, não da Trabalhista, o examine dessas relações de prestação de serviço. “Mas a Justiça do Trabalho que fazer vigorar sempre o vínculo. O pior é que a própria justiça comum já começou também a impor o vínculo”, lamentou um ministro do TST, sob a condição de anonimato.

Noutra ação proposta pelo MPT, a 3ª Câmara da 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, em julho deste ano, obrigou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica a considerar efeitos trabalhistas em suas decisões. Justificou a medida, que havia sido negada em primeira instância, alegando caber ao Cade considerar em suas análises as “funções sociais da propriedade, da livre iniciativa e do valor social do trabalho, nos termos da Constituição Federal”.

A decisão tratou da fusão das empresas Citrosuco e Citrovita. Diz o Ministério Público do Trabalho que, durante o processo de união das empresas, funcionários dessas companhias estavam sendo demitidos para posterior recontratação com salários menores.

Com esse exemplo como base, a Justiça do Trabalho também determinou que Cade, além da avaliação dos riscos ao mercado de trabalho, informe aos sindicatos o potencial de redução de empregos ou a possibilidade de demissões em massa nos processos sob sua análise. Segundo outro ministro do TST, que também falou sob a condição de anonimato, a decisão do TRT-15 assusta, mas não surpreende, porque o tribunal “é conhecido por ‘exponenciar’ esse viés protetivo sem limites”.

Brenno Grillo é jornalista.

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2023-set-22/tst-tenta-enfrentar-descumprimento-precedentes-supremo

Operário com hérnia de disco obtém aumento de indenizações

Participação nos lucros e resultados e balanced scorecard

DIRETO DO CARF

Por Alexandre Evaristo Pinto

Nesta semana trataremos dos precedentes do Carf acerca da incidência ou não de contribuição previdenciária sobre montantes pagos a título de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) e cujas metas tenham levado em consideração o modelo do “balanced scorecard”.

Nos termos do artigo 28, §9º, e), 9, “j”, da Lei nº 8.212/91, não incide contribuição previdenciária sobre a PLR, quando esta é paga ou creditada de acordo com lei específica.

A PLR é regulada pela Lei nº 10.101/2000, que estabelece que os instrumentos decorrentes de sua negociação contenham regras claras e objetivas quanto à fixação dos direitos substantivos da participação e das regras adjetivas, inclusive mecanismos de aferição das informações pertinentes ao cumprimento do acordado, periodicidade da distribuição, período de vigência e prazos para revisão do acordo, podendo ser considerados, entre outros, os seguintes critérios e condições: 1) índices de produtividade, qualidade ou lucratividade da empresa; ou 2) programas de metas, resultados e prazos, pactuados previamente.

Dessa forma, a previsão de regras claras e objetivas é um dos requisitos para que não haja a incidência da contribuição previdenciária.

A avaliação do desempenho de uma empresa e dos seus trabalhadores não é tarefa fácil, de forma que são diversos os estudos em Contabilidade Gerencial que buscam enfrentar tal desafio.

Ao refletir sobre tal desafio, Reinaldo Guerreiro assinala que as mensurações são necessárias tanto para expressar os objetivos, evidenciando os alvos a serem buscados, quanto para controlar e avaliar os resultados das atividades que foram tomadas para se atingir os alvos [1].

Em complemento a tal raciocínio, Carlos Alberto Pereira pondera que o desempenho assume diversas dimensões no contexto empresarial, uma vez que pode se referir à empresa como um todo, a uma área, a uma função ou até a um indivíduo específico, assim como pode se referir a aspectos operacionais, econômicos ou financeiros [2].

Em 1990, houve a organização e o patrocínio pelo Instituto Nolan Norton de um grupo de estudos envolvendo diversas empresas denominado “Measuring Performance in the Organization of the Future” e cujo objetivo era desenvolver formas mais eficientes de mensuração de desempenho [3].

O referido grupo partia da premissa de que os métodos baseados nos indicadores contábeis e financeiros até então existentes se tornaram obsoletos, de modo que as empresas tinham dificuldades em criar valor econômico para o futuro [4].

Os líderes do referido estudos foram Robert Kaplan e David Norton, sendo que as reuniões do grupo ocorriam em bases bimestrais. Dentre os novos métodos de medição de performance, mereceu destaque uma abordagem de mensuração do índice de progresso em atividades de melhoria contínua desenvolvido pela empresa Analog, que utilizava um “scorecard” corporativo, que incluía as medidas financeiras tradicionais e também outras medidas de desempenho relativas a prazos de entrega ao cliente, qualidade e ciclos de processo de produção, bem como a eficácia no desenvolvimento de novos produtos [5].

O grupo concluiu que a ferramenta mais promissora consistiria em um “scorecard” multidimensional, que recebeu o nome de “balanced scorecard”, que seria organizado em quatro óticas distintas: 1) financeira; 2) do cliente; 3) de inovação; e 4) de inovação e aprendizado [6].

O “balanced scorecard” refletiria objetivos de curto e longo prazo, medidas financeiras e não financeiras, indicadores de tendências e de ocorrências, assim como permitiria perspectivas internas e externas de desempenho [7].

Em outras palavras, o “balanced scorecard” tem o mérito de traduzir a missão e a estratégia da empresa por meio de um conjunto de medidas de desempenho, sendo um sistema relevante de medição e gestão estratégica, sendo utilizado para diversas finalidades, dentre as quais: o estabelecimento de metas individuais e de equipe, remuneração, alocação de recursos, planejamento e orçamento, feedback e aprendizado [8].

Feitas as principais considerações sobre o “balanced scorecard” enquanto ferramenta de controle gerencial, passaremos a analisar os precedentes do Carf em que acordos coletivos prevendo a PLR se baseavam na referida ferramenta.

Nos Acórdãos nº 2202­003.373, 2202­003.374, 2202­003.376 e 2202­003.377 (todos de 10/05/16), a turma deu provimento por unanimidade aos recursos voluntários do contribuinte.

Nessa linha, constou expressamente nos votos da conselheira relatora [9] que diferentemente do que entedia a fiscalização, havia uma regra clara de estipulação das metas de desempenho dos beneficiários da PLR, que pressupunha cinco etapas: 1) “verifica­se o grupo de salários não qual está enquadrado o empregado. A partir dessa classificação, é definido o múltiplo de salário inicial que poderá ser pago a título de PLR (denominado ‘target’)”; 2) “o ‘target’ é multiplicado pelo fator extraído dos indicadores de desempenho;” 3) “o valor obtido é multiplicado pelo fator Lair”; 4) “o valor obtido pelo fator LAIR é, então, multiplicado pelo fator ‘market share'”; e 5) “e, por fim, os valores obtidos das multiplicações acima é multiplicado pelo fator ‘scorecard’ definindo, assim, o valor do PLR a pagar, respeitando o critério de proporcionalidade para os casos pertinentes”.

Como consequência, a conselheira relatora entendeu que os acordos firmados pelo recorrente estariam atrelados a critérios e parâmetros claros e objetivos.

No Acórdão nº 2401­004.795 (de 10/05/17), a turma decidiu, por maioria de votos, por dar provimento ao recurso voluntário.

A autuação fiscal entendeu que não havia no instrumento de negociação a definição das diferentes áreas de negócios nas quais serão os diversos modelos trazidos no acordo de PLR, de forma que inexistiriam regras claras e objetivas pactuadas previamente.

Por sua vez, preponderou o voto do conselheiro relator [10] de que “a exigência de regras claras e objetivas não se destina, precipuamente, à compreensão do Fisco. Embora importante para garantia do interesse público, é nítido o papel secundário exercido pela fiscalização tributária neste processo, a qual não lhe foi concedia a função de avaliação do mérito das regras aprovadas na negociação entre as partes”.

Prossegue ainda o relator que “por essa razão, a interferência na autonomia privada é medida excepcional, exigindo­se a certeza da autoridade fiscal, apoiada em elementos objetivos, quanto à desconformidade do acordado frente aos preceitos legais da Participação nos Lucros ou Resultados. (…) O agente fiscal não participa do dia a dia da vida laboral da empresa e de seus empregados, de maneira que as questões que lhe configuram obscuras podem estar perfeitamente claras para o empresário e os trabalhadores. De maneira análoga, um critério e/ou informação que lhe pareça omisso no instrumento de negociação, podem estar univocamente delimitados pelos atores sociais principais, tendo em conta a proximidade com os fatos”.

Como decorrência, o relator aponta que “as dificuldades de compreensão do agente fiscal não significam, necessariamente, obstáculos à cognição dos segurados empregados e dos sindicatos que os representam, pois podem acompanhar, obter esclarecimentos e questionar as regras e os critérios vinculados à aquisição do direito ao pagamento da participação, bem como os mecanismos de aferição do pactuado”.

Por fim, o relator pondera ainda que o detalhamento pormenorizado das metas pode estar estipulado em documentos apartados ou, até mesmo, em outros canais de comunicação, desde que mantida a harmonia com as regras gerais e sempre com pleno acesso e conhecimento dos trabalhadores.

No mesmo sentido, a mesma turma julgou, por maioria de votos, dar provimento ao recurso voluntário no que tange a este ponto no Acórdão nº 2401­004.987 (de 08/08/17).

A autuação fiscal destacou que o anexo do acordo da PLR não traz claramente as metas a serem alcançadas, mas somente os indicadores que serão utilizados na avaliação, sendo que não há evidenciação dos pesos que compõem o “Scorecard”, nem a determinação de como serão aferidos tais critérios.

O conselheiro relator [11] reafirmou grande parte dos argumentos trazidos no já mencionado Acórdão nº 2401­004.795, no sentido de que não caberia à fiscalização uma análise meramente abstrata dos instrumentos de negociação sob pena “de cometimento de equívocos pelo agente fiscal”.

No Acórdão nº 2202­005.193 (de 08/05/19), a turma decidiu, por maioria de votos, por dar provimento ao recurso voluntário.

A autuação fiscal tinha concluído que a previsão de que o desempenho dos beneficiários da PLR se daria por um “scorecard” seria obscura, uma vez que “em nenhum momento são definidos os scorecards de cada área de atuação dos beneficiários, suas regras, mecanismos de aferição ou critérios de avaliação”, havendo apenas um exemplo no qual se via “a utilização de critérios tais como: retenção de clientes, crescimento da receita de negócios, qualidade da carteira, rentabilidade das contas, custos dos serviços, qualidade dos serviços e incidência de problemas”. Ademais, entendeu a fiscalização que tais metas seriam fixadas fora dos acordos de PLR

Todavia, no julgamento do Carf, preponderou o entendimento do conselheiro relator [12] de que o fato dos detalhes relativos às metas se encontrem em documentos apartados não lhes afastaria a clareza e tampouco sinalizaria que não houve participação sindical nas negociações individuais.

No Acórdão nº 2202-009.717 (de 09/03/23), foi negado provimento ao recurso do contribuinte por maioria de votos.

No caso em tela, a avaliação do “balanced scorecard” do indivíduo levava em consideração: 1) o resultado geral da empresa no país (visto se tratar empresa que é parte de grupo multinacional); 2) o resultado da área na qual ele trabalhava; e 3) o resultado individual.

A autuação fiscal considerou que os critérios relativos às metas não eram cristalinos, bem como os indicadores de desempenho das áreas e seus pesos eram determinados em documentos em separado (cartilhas “scorecard” PPR).

Além disso, tais critérios poderiam ser alterados unilateralmente e “a posteriori” pela empresa, sem que houvesse a existência de uma negociação com os empregados com a participação de um representante sindical.

A recorrente afirma que o “balanced scorecard” não um método linear, mas sim matricial, que leva em conta simultaneamente diversos fatores do funcionário e da área ao qual pertence, sendo que os objetivos individuais são fixados “pelos empregados em conjunto com seus gestores”, de forma que não haveria que se falar em fixação unilateral das metas.

Em seu voto, a conselheira relatora [13] pontuou que não haveria imposição na lei de que a PLR seja integralmente disciplinada no instrumento de negociação coletiva, podendo o detalhamento constar em documentos apartados, mas tais documentos devem estar em harmonia com as regras gerais e serem acessíveis ao trabalhador no momento da celebração dos acordos e convenções.

Todavia, ao analisar a documentação trazida aos autos, a conselheira concluiu que nem os instrumentos de negociação e tampouco os anexos juntados dispuseram de forma objetiva sobre o direito substantivo ou adjetivo à concessão do PLR, de forma que não haveriam regras claras e objetivas que permitam verificação da harmonia com as regras gerais e que pudessem ser acessíveis aos trabalhadores no momento da celebração dos acordos e convenções.

A conselheira relatora refuta a documentação exemplificativa trazida pela recorrente com relação a um beneficiário da PLR, uma vez que tais informações não se revestem da condição de provas, na medida em que não estão datadas ou assinadas (parte da informação está em inglês).

A descrição do entendimento que não foi vitorioso no presente caso foi objeto de declaração de voto [14], no qual o conselheiro assinalou que, a seu ver, as regras do acordo de PLR seriam claras e objetivas, uma vez que estão desenhados no plano de PLR os objetivos, as premissas, as ideias, as linhas gerais e especiais da PLR, assim como seria possível que o plano caminhasse por um acompanhamento interno quanto ao detalhamento das metas para os diferentes empregados, setores, departamentos, gerências, áreas e cargos, ainda mais quando o modelo adotado envolve parâmetros e avaliações de desempenho individual.

Diante do exposto, nota-se que há tanto acórdãos que validaram o uso do “balanced scorecard” como método para mensuração de desempenho em acordos de PLR, ainda que o detalhamento dos critérios não constasse nos instrumentos de negociação do plano, mas em documentos apartados, quanto há acórdão em que preponderou o entendimento de que não havia uma regra clara e objetiva de metas em situação na qual a contribuinte se utilizava do “balanced scorecard”.

*Este texto não reflete a posição institucional do Carf, mas, sim, uma análise dos seus precedentes publicados no site do órgão, em estudo descritivo, de caráter informativo, promovido pelos seus colunistas.


[1] GUERREIRO, Reinaldo. Modelo Conceitual de sistema de informação de gestão econômica: uma contribuição à teoria da comunicação da contabilidade. Tese de doutorado. São Paulo: FEA/USP, 1989. p. 78.

[2] PEREIRA, Carlos Alberto. Avaliação de Resultados e Desempenhos. In: CATELLI, Armando (coord.). Controladoria – uma abordagem da gestão econômica GECON. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 197.

[3] KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. A Estratégia em Ação – Balanced Scorecard. Rio de Janeiro: Campus, 1997. p. VII-X.

[4] KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. Op. cit. p. VII-X.

[5] KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. Op. cit. p. VII-X.

[6] KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. Op. cit. p. VII-X.

[7] KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. Op. cit. p. VII-X.

[8] KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. Op. cit. p. 2-6.

[9] Conselheira Junia Roberta Gouveia Sampaio.

[10] Conselheiro Cleberson Alex Friess.

[11] Conselheiro Carlos Alexandre Tortato.

[12] Conselheiro Leonam Rocha de Medeiros.

[13] Conselheira Sonia de Queiroz Accioly.

[14] Conselheiro Leonam Rocha de Medeiros.


 é conselheiro titular da Câmara Superior de Recursos Fiscais da 1ª Seção do Carf, ex-conselheiro titular da 2ª Seção do Carf, doutorando em controladoria e contabilidade pela Universidade de São Paulo (USP), doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP, mestre em Direito Comercial pela USP, professor do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT), da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Financeiras e Atuariais (Fipecafi), do Insper e do Ibmec, ex-presidente da Associação dos Conselheiros Representantes dos Contribuintes no Carf (Aconcarf), pesquisador concursado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e pesquisador do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas (NEF/FGV).

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2023-set-20/direto-carf-participacao-lucros-resultados-balanced-scorecard